Jamil Chade

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Israel e Hamas cometeram crimes contra a humanidade, diz inquérito da ONU

Uma investigação conduzida pela ONU concluiu que tanto as autoridades de Israel como os grupos armados palestinos são responsáveis por crimes de guerra e crimes contra a humanidade em Gaza. No caso do governo de Benjamin Netanyahu, a acusação é ainda de extermínio e de violência sexual por parte de soldados. Integrantes do Hamas também são acusados de abusos contra mulheres, tortura e assassinatos.

Os informes foram publicados nesta quarta-feira (11) e revelam a dimensão das violações desde o dia 7 de outubro de 2023, quando o Hamas atacou civis israelenses.

Trata-se da conclusão da primeira investigação aprofundada sobre a situação em Gaza, depois de mais de oito meses de conflitos. O trabalho foi feito com base em entrevistas com vítimas, milhares de itens de fonte aberta, imagens de satélite e relatórios médicos forenses. De acordo com a ONU, o governo de Benjamin Netanyahu obstruiu as investigações da Comissão de Inquérito e impediu seu acesso a Israel e ao Território Palestino Ocupado.

"É imperativo que todos aqueles que cometeram crimes sejam responsabilizados", disse Navi Pillay, presidente da Comissão de Inquérito. "A única maneira de interromper os ciclos recorrentes de violência, incluindo agressão e retribuição por ambos os lados, é garantir a adesão estrita ao direito internacional", defendeu.

Pillay ainda fez um apelo para que Israel "interrompa imediatamente suas operações militares e ataques em Gaza, incluindo o ataque a Rafah, que custou a vida de centenas de civis e novamente deslocou centenas de milhares de pessoas para locais inseguros, sem serviços básicos e assistência humanitária". Ela também pediu que o Hamas e os grupos armados palestinos suspendam "imediatamente os ataques com foguetes e libertar todos os reféns".

Quais as conclusões sobre Israel

Em relação às operações militares e aos ataques israelenses em Gaza, a Comissão de Inquérito constatou que as autoridades israelenses são responsáveis pelos crimes de guerra de:

  • Fome como método de guerra
  • Assassinato ou morte intencional
  • Direcionamento intencional de ataques contra civis e objetos civis
  • Transferência forçada
  • Violência sexual
  • Tortura e tratamento desumano ou cruel
  • Detenção arbitrária

A Comissão constatou que também foram cometidos os crimes contra a humanidade, entre eles:

  • Extermínio
  • Perseguição de gênero contra homens e meninos palestinos
  • Assassinato
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"O imenso número de vítimas civis em Gaza e a destruição generalizada de objetos e infraestrutura civis foram o resultado inevitável de uma estratégia empreendida com a intenção de causar o máximo de dano, desconsiderando os princípios de distinção, proporcionalidade e precauções adequadas", disse a Comissão de Inquérito. "O uso intencional de armas pesadas com grande capacidade de destruição em áreas densamente povoadas constitui um ataque intencional e direto à população civil", afirmou.

Declarações de ódio podem levar ao genocídio

O relatório constatou que as declarações feitas por autoridades israelenses - incluindo aquelas que refletem a política de infligir destruição generalizada e matar um grande número de civis - equivalem a incitação e podem constituir outros crimes internacionais graves. A incitação direta e pública ao genocídio é um crime de acordo com a lei internacional sempre que perpetrada, mesmo por pessoas sem autoridade direta para a condução das hostilidades.

"O incitamento à discriminação, hostilidade ou violência é uma violação grave da Lei Internacional de Direitos Humanos e pode constituir um crime internacional", alertou.

Segundo a Comissão, embora Israel tenha emitido centenas de ordens de evacuação para as pessoas no norte de Gaza e em outros locais, ela constatou que, às vezes, essas ordens eram insuficientes, pouco claras e conflitantes, e não davam tempo suficiente para evacuações seguras.

"Além disso, as rotas de evacuação e as áreas designadas como seguras eram constantemente atacadas pelas forças israelenses. Tudo isso, segundo a Comissão, equivaleu a uma transferência forçada", disse.

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A Comissão determinou que Israel impôs um "cerco total" que equivale a punição coletiva contra a população civil. "As autoridades israelenses transformaram o cerco em uma arma e usaram o fornecimento de necessidades vitais, inclusive cortando água, alimentos, eletricidade, combustível e assistência humanitária, para obter ganhos estratégicos e políticos", disse.

Segundo a investigação, o cerco "afetou desproporcionalmente mulheres grávidas e pessoas com deficiência, com sérios danos infligidos a crianças, levando a mortes evitáveis de crianças por inanição, incluindo recém-nascidos".

Violência sexual por parte de soldados israelenses

O relatório constatou que formas específicas de violência sexual e baseada em gênero "fazem parte dos procedimentos operacionais das Forças de Segurança de Israel".

"A constatação foi feita devido à frequência, prevalência e gravidade das violações, que incluem o desnudamento público e a nudez com o objetivo de humilhar a comunidade em geral e acentuar a subordinação de um povo ocupado", explicou.

Na Cisjordânia, a Comissão constatou que as forças israelenses cometeram atos de violência sexual, tortura e tratamento desumano ou cruel e ultrajes à dignidade pessoal, todos eles crimes de guerra. Além disso, a Comissão constatou que o governo de Israel e as forças israelenses permitiram, promoveram e instigaram uma campanha de violência de colonos contra comunidades palestinas na Cisjordânia.

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Quais são os crimes do Hamas

Em relação ao ataque de 7 de outubro em Israel, o relatório concluiu que a ala militar do Hamas e seis outros grupos armados palestinos são responsáveis pelos crimes de guerra de dirigir intencionalmente ataques contra civis, assassinato ou morte intencional, tortura, tratamento desumano ou cruel, destruição ou apreensão da propriedade de um adversário, ultrajes à dignidade pessoal e tomada de reféns, inclusive crianças.

"O disparo indiscriminado de milhares de projéteis contra vilas e cidades israelenses, resultando em mortes e ferimentos de civis, também é uma violação das leis internacionais humanitárias e de direitos humanos", alerta o informe.

A ONU também conclui que membros de grupos armados palestinos, em alguns casos auxiliados por palestinos em trajes civis, deliberadamente mataram, feriram, torturaram, fizeram reféns, inclusive crianças, e cometeram violência sexual e de gênero contra civis e contra membros das forças de segurança israelenses, alguns dos quais estavam fora de combate e não deveriam ter sido alvos.

Hamas cometeu atos de violência sexual

A Comissão identificou padrões indicativos de violência sexual e concluiu que não se tratava de incidentes isolados, mas sim de atos semelhantes praticados em vários locais, principalmente contra mulheres israelenses.

Medidas

O documento pode servir de base para um eventual pedido de prisão por parte do Tribunal Penal Internacional contra os responsáveis e traz ainda recomendações:

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  • O relatório pede que o governo de Israel implemente imediatamente um cessar-fogo, acabe com o cerco a Gaza, garanta a entrega de ajuda humanitária e cesse o ataque a civis e à infraestrutura civil.
  • A Comissão pede que Israel cumpra integralmente suas obrigações legais estabelecidas nas ordens da Corte Internacional de Justiça sobre medidas provisórias emitidas em 26 de janeiro de 2024, 28 de março de 2024 e 24 de maio de 2024 e, em particular, permita que a Comissão tenha acesso a Gaza para realizar investigações.
  • O relatório pede ao governo do Estado da Palestina e ao Hamas que cessem imediatamente todos os ataques com foguetes contra Israel, libertem incondicionalmente todos os reféns, investiguem completa e imparcialmente as violações e processem os responsáveis pelos crimes, inclusive os cometidos em 7 de outubro e desde então por membros de grupos armados palestinos não estatais em Israel.

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Texto que relata acontecimentos, baseado em fatos e dados observados ou verificados diretamente pelo jornalista ou obtidos pelo acesso a fontes jornalísticas reconhecidas e confiáveis.

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