Jamil Chade

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Brasil pressiona, UE adia lei ambiental, e pacto com Mercosul fica próximo

Após ser pressionada por Brasil e governos de outros lugares do mundo, a Europa decidiu adiar em doze meses a adoção de suas leis ambientais e que, se implementadas, poderiam afetar as exportações brasileiras. A medida, na avaliação de diplomatas brasileiros e europeus, abre caminho para que um acordo comercial entre Mercosul e UE seja finalmente concluído.

A regra aprovada no Parlamento Europeu apontava que, a partir de 2025, produtos agrícolas que causassem desmatamento teriam uma tarifa extra para entrar no mercado da UE. A medida foi denunciada pelo Brasil que, há um mês, enviou uma carta assinada pelo chanceler Mauro Vieira apontando para uma profunda insatisfação por parte do governo de Luiz Inácio Lula da Silva.

Um dos temores dos exportadores brasileiros era de que a lei, se aplicada, poderia gerar prejuízos de US$ 15 bilhões às vendas nacionais.

O tema voltou ao debate durante a passagem de Lula por Nova York, na semana passada.

"Considerando as respostas recebidas de parceiros internacionais sobre seu estado de preparação, a Comissão Europeia também propõe dar às partes interessadas mais tempo para se prepararem", afirmou a UE nesta quarta-feira.

"Se aprovada pelo Parlamento Europeu e pelo Conselho, a lei passaria a ser aplicável em 30 de dezembro de 2025 para as grandes empresas e em 30 de junho de 2026 para as micro e pequenas empresas. Como todas as ferramentas de implementação estão tecnicamente prontas, os 12 meses extras podem servir como um período de introdução gradual para garantir uma implementação adequada e eficaz", explicou.

"A Comissão reconhece que, três meses antes da data de implementação prevista, vários parceiros globais expressaram repetidamente preocupações sobre seu estado de preparação, mais recentemente durante a semana da Assembleia Geral das Nações Unidas em Nova York", disse a UE.

"Além disso, o estado de preparação das partes interessadas na Europa também é desigual. Enquanto muitos esperam estar prontos a tempo, graças aos preparativos intensivos, outros expressaram preocupação", apontou.

"Dado o caráter inovador da lei, o calendário rápido e a variedade de partes interessadas internacionais envolvidas, a Comissão considera que um período adicional de 12 meses para a introdução gradual do sistema é uma solução equilibrada para ajudar as operadoras de todo o mundo a garantir uma implementação tranquila", disse.

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Acordo com Mercosul mais próximo

Com o adiamento do projeto, a UE espera criar também um espaço político para fechar um acordo comercial com o Mercosul. O temor dos negociadores era de que, se aplicada, a lei retiraria vantagens que o bloco europeu estava dando para as exportações agrícolas do Brasil e Argentina.

Nos últimos meses, o adiamento também foi proposto pela Alemanha, um dos maiores interessados em garantir acesso ao mercado do Brasil e Argentina.

A esperança de ambos os lados é de que um acordo possa ser fechado nas próximas semanas e anunciado durante a cúpula do G20, em novembro no Rio de Janeiro.

O UOL apurou que a proposta do Brasil é de que o debate sobre o desmatamento seja incorporado no futuro tratado, neutralizando e permitindo um tratamento diferenciado para o Mercosul na futura lei europeia.

A preocupação do Itamaraty é de que a lei, ao entrar em vigor, anularia qualquer acesso ao mercado que o Brasil negociou ao longo de anos. E, em troca desse acesso, o governo abriu seu mercado para bens europeus.

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A ideia, portanto, é de que um mecanismo de consultas e compensações seja estabelecido. Na prática, o sistema permitiria que a lei de desmatamento tenha um tratamento dentro de um acordo estratégico e que o Brasil não seja tratado como qualquer outro mercado.

Outra ideia é de que, no caso de uma aplicação de novas barreiras, o Mercosul também teria o direito de calibrar o acesso dado aos produtos europeus.

Na quarta-feira passada, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirmou numa coletiva de imprensa na ONU que o Brasil estava "pronto" para assinar o acordo e que estava otimista que isso poderia ocorrer durante a cúpula do G20 no Rio de Janeiro, em novembro.

Em 2023, o acordo também estava próximo. Mas, por uma questão eleitoral, o presidente da França, Emmanuel Macron, se apressou em tentar bloquear o processo. Seu argumento era de que o acordo permitiria uma invasão de produtos do Mercosul no setor agrícola.

Diplomatas apontam que o argumento do francês sobre o risco para a agricultura sequer condiz com a realidade. Os estudos realizados por ambos os lados do processo apontam que, caso o acordo que já é negociado há 25 anos entre em vigor, o volume extra de exportação brasileira prevista não representaria a dimensão do abalo no mercado europeu como alegam os franceses.

Macron, porém, temia perder o apoio do setor rural, às vésperas da eleição para o Parlamento Europeu e quando a extrema direita avançava para seduzir o voto dessa população.

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