Jamil Chade

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Reportagem

Nem Kamala, nem Trump: os brasileiros que votam por socialista nos EUA

Nem Kamala Harris e nem Donald Trump. Uma das candidatas para a eleição americana é Claudia de la Cruz, do movimento socialista americano. Educadora, teóloga e líder comunitária, a candidata nasceu no Bronx, filha de pais da República Dominicana. Sua eleição sequer é considera pela imprensa americana e observadores. Mas a reportagem do UOL conversou com brasileiros que optaram por votar pela socialista.

Aos treze anos, ela começou seu ativismo política em sua igreja, a Episcopal Santa Maria, onde teve contato com a teologia da libertação. Em sua campanha, defende o fim do embargo americano à Cuba e um combate contra a pobreza nos EUA. Ela concorre pelo Partido pelo Socialismo e Libertação.

Ela tem uma tarefa das mais difíceis: convencer os americanos a fazer a transição para uma economia socialista.

De la Cruz, 43 anos, insiste que muitos dos programas sociais existentes nos EUA hoje "hoje são resultado de pessoas que se engajaram em lutas organizadas, muitas das quais tinham uma visão socialista." Outro ponto de seu projeto é ainda mais ousado: cortar o orçamento militar em 90%.

Entre os brasileiros, o argumento para votar por ela está relacionado com o comportamento dos democratas em Gaza, com os imigrantes e no combate à pobreza.

'Não é um voto de protesto'

Sou Miguel Silveira, cineasta e professor do Departamento De Comunicação da Universidade de Loyola em Chicago. Sou natural do Rio de Janeiro, nascido em Santa Teresa, criado em Niterói.

A grande discussão e um dos pontos principais da campanha democrata esse ano - e nos últimos ciclos presidências - é a defesa do processo democrático. Justamente por concordar com a importância de defender a democracia nos Estados Unidos, eu acredito que outros partidos, outras visões de mundo, outros desejos, tem que ser representados.

Infelizmente, o capital bilionário impede que milhões de americanos tenham a possibilidade de votar em candidatas que representem suas posições políticas, seus desejos de felicidade e visões de mundo. É praticamente impossível para qualquer partido emplacar uma candidatura presidencial fora do eixo Democrata-Republicano. Qualquer discussão sobre democracia nos Estados Unidos é pura hipocrisia se não inclui essa crítica.

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Esse ano a candidata do PSL, Claudia De La Cruz, corresponde ao meu desejo pela paz, a minha crença ferrenha na possibilidade de instauração de um processo eleitoral realmente democrático nos Estados Unidos, e na minha rejeição total e absoluta ao genocídio televisionado contra o povo Palestino. Não é um voto de protesto, é um voto que representa a minha posição política - um voto que eu tive que escrever por extenso pois o nome da Claudia não constava na minha cédula eleitoral aqui em Illinois.


'Democratas me decepcionaram'

Meu nome é Thiago, sou brasileiro e americano. Nasci em Nova York, cresci em Sao Paulo e moro em Nova York há mais de 30 anos. Na última eleição, votei por Joe Biden para tirar Trump do poder e para garantir uma melhor solução para o problema da pandemia que assolava o mundo. Neste ano, preferi votar em uma candidata de um outro partido.

Minha decepção com o governo Biden começou com seu uso das vacinas contra o Covid como mais uma das armas usadas em disputas geopolíticas. Minha reprovação cresceu com as guerras na Ucrânia e que começou contra a Palestina e se expandiu no Oriente Médio, que poderiam ter sido evitadas ou contidas.

No cenário doméstico, a politica e o tratamento voltado aos imigrantes indocumentados não diferiu muito das do tempo de Trump, e os gastos sociais, que haviam se ampliado durante a pandemia, logo retrocederam. Por fim, o processo de escolha de Kamala como a substituta de Biden foi controlado por poucos. Ela é, assim, uma escolha bem pouco democrática.

Tenho consciência de que seria melhor que Kamala vença de Trump no colégio eleitoral, mas ela não teve nem terá o meu voto.

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Pouca diferença entre republicanos e democratas para imigrantes

Sou Natalia de Campos, tenho 51 anos e sou de São Paulo. Moro em Nova York há 26 anos. Votei em Claudia De La Cruz, do Partido pelo Socialismo e Libertação (PSL). Não considero meu voto de "terceira" via, mas de uma única via para um futuro possível. Em 2020 votei para Biden para derrotar Trump, porque seria impossível viver sob um segundo mandato de Trump. No entanto, o partido democrata mais e mais se assemelha aos republicanos a ponto de quase só se diferenciar em politicas de direitos reprodutivos.

Como mulher, é fundamental ter esses direitos, mas a contradição é gritante quando os democratas se alinham aos republicanos em políticas imigratórias e de deportação, politicas externas, inclusive de apoio irrestrito ao genocídio de Israel contra os palestinos- e vendo que até a prometida reconstrução da infraestrutura interna do país não veio.

Milhões de pessoas passam fome nos Estados Unidos ou sofrem com dívidas, e morrem sem politicas de saúde publica universal na maioria dos estados. Isto tudo enquanto trilhões de dólares são enviados em armamentos à Ucrânia, Israel, e diversos outros países- e agora mantêm uma politica de hostilidade contínua contra a Russia e a China, o que nos faz caminhar para uma possível terceira guerra mundial.

Estamos nas ruas há 12 meses contra o genocídio em Gaza, sendo ignorados pelos democratas. Eles tiveram diversas chances de mudar o curso, e estando no poder, de se diferenciarem de Trump. Mas não o fizeram, tomaram diversas medidas antidemocráticas que a mídia não tem noticiado para a maioria. Me uno à juventude, que está pondo sua energia na construção de uma alternativa aos dois partidos dominantes. É preciso reconstruir a democracia nos Estados Unidos, e trabalharmos para se retirar o imperialismo das metas nacionais. O planeta precisa disso pra sobreviver.

"Não posso dar meu apoio ao genocídio em Gaza"

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Sou Myriam Marques, de Belo Horizonte. Sou residente em Brooklyn e cidadã americana desde 2006. Este ano eu votei para a candidata Claudia de la Cruz, do PSL - Party for Sociqlism and Liberation.

O motivo mais forte foi pelo fato de ambos candidatos e seus partidos darem suporte financeiro, tecnológico e logístico ao genocídio em Gaza. Sou enfermeira e não posso votar em quem normaliza o bombardeio de hospitais e escolas matando os trabalhadores da saúde e seus pacientes. Há também milhares de profissionais de saúde presos e sendo torturados pelo governo de Israel. O genocídio da população da Palestina, maioria civis, crianças, mulheres é inaceitável.

Vejo a minha vida, da minha comunidade, dos meus pacientes deteriorar a cada dia. Desigualdade social, pobreza, violência , crises de opioides, suicídios, moradia, climática. As pessoas pagando absurdos de contas de saúde e débitos de educação. Para a classe trabalhadora aqui só piora.

O tema da imigração e do direito ao aborto me interessa muito.Mas vamos lutar nos nossos estados, os imigrantes tem que se organizar

Me interessei pela campanha da Cláudia e entendi a mensagem de que chegou a hora de os movimentos sociais, a classe trabalhadora, a juventude construir uma alternativa no socialismo, numa sociedade justa, igualitária, sem guerras. E fora do bi-partidarismo. O capitalismo e a democracia aqui aqui chegaram ao limite.

Reportagem

Texto que relata acontecimentos, baseado em fatos e dados observados ou verificados diretamente pelo jornalista ou obtidos pelo acesso a fontes jornalísticas reconhecidas e confiáveis.

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