Marco temporal, aborto e mais: Como Zanin pode votar em pautas importantes?
Eloísa Machado, professora de direito da FGV-SP, afirmou durante entrevista ao programa Análise da Notícia que o ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Cristiano Zanin decepcionou o setor mais progressista da sociedade com seus primeiros votos na Corte, mas que as próximas votações em temas como o marco temporal e aborto serão decisivas para traçar perspectivas sobre o posicionamento do novo ministro. Em muitos casos, sobretudo de direitos humanos, Zanin acabará sendo o fiel da balança dentro do STF.
Zanin tem voto de minerva em questões de direitos humanos fundamentais. Eloísa Machado
Risco de levar ao STF alguém cujas posições eram uma grande incógnita. Quando o nome de Zanin começou a circular como possível membro do STF a sociedade não conhecia suas posições sobre temas como segurança pública, questões de gênero e direitos dos povos indígenas. Não se pode dizer que é uma surpresa os votos de algo até então desconhecido, mas até o momento há uma decepção com os votos do novo ministro.
Afastamento de concepção política-ideológica que orienta o governo federal. A decepção com Zanin vem em grande parte de um afastamento de uma concepção político-ideológica que orienta o governo federal. É esperado que o presidente indique ao STF um ministro que esteja afinado com sua percepção de mundo e a decepção vem do fato de uma pessoa indicada por Lula votar contra a defesa do princípio de direitos humanos. Os votos de Zanin que mais causaram desconforto foram nas questões da descriminalização do porte de maconha para usuários, da homotransfobia ser equiparada ao crime de injúria racial e também na questão da possibilidade de uma análise técnica sobre uma ação proposta pela Articulação dos Povos Indígenas do Brasil em relação a um caso que relata violência sistêmica contra povos indígenas do MT e MS.
Supremo é o contraponto de defesa dos direitos das minorias frente a um Congresso conservador. Temas como redução da maioridade penal, descriminalização do aborto, violação dos direitos reprodutivos das mulheres, liberdade religiosa, marco temporal e discussões de gênero nas escolas estão na agenda do STF para votação. Há muitos anos o Supremo apresenta uma configuração que faz o contraponto de defesa dos direitos de minorias frente a um Congresso que segue uma lógica majoritariamente conservadora, uma vez que não há avanços vindos do Legislativo nessa agenda de direitos. Uma guinada mais conservadora dentro do STF poderá apresentar um cenário bastante preocupante para grupos minoritários.
Se coloca de maneira muito evidente a possibilidade de não só de não avançar, como retroceder em muitas conquistas que foram feitas ao longo dos anos. O cenário é particularmente preocupante se a gente considerar que agora sai Rosa Weber, que tem um perfil muito afinado com os direitos humanos, e possa entrar alguém com perfil semelhante ao Zanin. De fato traria uma infinidade de retrocessos nesses direitos nos próximos anos. Eloísa Machado
Importância da votação do marco temporal. O marco temporal coloca em jogo a sobrevivência dos povos indígenas, a garantia de seu território e, mais do que isso, a noção que temos de Brasil enquanto um país plural, diverso e que valoriza a diferença. É considerado um grande caso e, nessas circunstâncias, ministros costumam votar fora de sua zona de conforto. Diante dessa possibilidade, os votos já proferidos por Zanin se tornam mais significativos para se pensar suas posições futuras, mas sua posição nessa votação também pode ser bastante relevante para começar a entender como o novo ministro irá se posicionar em diversos outros temas que estão em julgamento no Supremo.
Zanin pode ser o voto de minerva. Apesar de o STF apresentar uma configuração recente de maioria em termos de defesa dos direitos humanos e de políticas identitárias, há uma grande divisão dentro da corte em outros temas. O que se projeta na votação do marco temporal e da descriminalização do aborto, por exemplo, são votações apertadas em que hoje, sem o voto de Zanin, estaria empatada em 5x5. Pode estar nas mãos do novo ministro definir sobre a descriminalização ou não do aborto, e Zanin já anunciou em diversas conversas com parlamentares que esse tema é de responsabilidade do Legislativo, indicando um voto conservador.
Há chances de termos retrocessos e reversão de casos relevantes no STF e isso pode acontecer no Brasil se as próximas indicações ao STF não atenderem a obviedade de um governo com orientação de diversidade, pluralidade, direitos dos trabalhadores e combate à desigualdade. Se indicar alguém que pense de outro jeito, pode haver retrocessos. Eloísa Machado
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