Josias de Souza

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Opinião

Lula precisa harmonizar seu convívio com os escândalos

Lula convive com três tipos de escândalos. Mensalão e petrolão têm raízes fincadas nos seus dois primeiros mandatos. O emendão de Juscelino Filho foi importado da gestão Bolsonaro. O caso do leilão do arroz foi semeado em pleno 2024, uma fase do terceiro mandato que o presidente definiu como "ano da colheita".

Nesta sexta-feira, Lula desfilou por São Luís, no Maranhão, com o ministro das Comunicações a tiracolo. A despeito de Juscelino ter sido indiciado pela Polícia Federal por corrupção passiva, lavagem de dinheiro e organização criminosa, disse que está "feliz" com o trabalho do ministro. Não cogita demiti-lo. "Tenho que aguardar o processo", esquivou-se.

A contemporização com um ministro acusado de desviar R$ 7,5 milhões em emendas orçamentárias para asfaltar estrada que passa defronte de sua fazenda, no município maranhense de Vitorino Freire, destoa do correto rigor adotado por Lula em relação a Neri Geller, o secretário da pasta da Agricultura exonerado na semana passada nas pegadas da fraude do arroz. Lula chamou o caso do leilão de "falcatrua".

Neri Geller foi ejetado da poltrona 24 horas antes da abertura de inquérito na Polícia Federal. No caso das emenas de Juscelino Filho, Lula não viu problema em manter o ministro suspeito nas cercanias do cofre. Na encrenca do arroz, não quis "aguardar o processo".

É como se Lula vivesse a síndrome do que está por vir. Reportagem do UOL revela que uma das empresas descredenciadas para a importação de arroz, uma locadora de carros, já foi contratada para vender sacas de milho ao governo petista da Bahia.

Na véspera da viagem em que circulou ao lado de Juscelino como se a PF não tivesse descoberto nada sobre o ministro das Comunicações, Lula deu posse a Magda Chambriard, a nova presidente da Petrobras, no Rio de Janeiro. Ao discursar, transportou-se para o universo paralelo da negação.

Na campanha de 2022, instado a comentar o petrolão, Lula dissera que não poderia negar uma corrupção reconhecida por réus confessos. Ao entronizar a sucessora de Jean Paul Prates na chefia da maior estatal do país, referiu-se à roubalheira como uma "farsa" fabricada para "desmontar" e privatizar a companhia.

A pilhagem do petrolão foi escriturada no balanço da Petrobras em 2015, sob Dilma Rousseff. Ao divulgar o balanço, Adelmir Bendini, então presidente da estatal, pediu "desculpas em nome dos funcionários." Disse que havia "um sentimento de vergonha".

Na época, os auditores lançaram na coluna do passivo R$ 50,8 bilhões. Desse total, perdas de R$ 6,194 bilhões foram atribuídas ao câncer das propinas. Os outros R$ 44,63 bilhões viraram fumaça por conta da incúria administrativa. Nessa conta, entraram delírios nascidos da megalomania de Lula e do interesse em fazer dinheiro para saciar os apetites de empresas corruptoras e de corruptos do conglomerado partidário que gravitava na órbita do governo.

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O escândalo da Petrobras desceu ao verbete da enciclopédia ornamentado por uma pilhagem confessa, dezenas de prisões e a deposição de Dilma. Sobreveio a atmosfera de descrença que deu na eleição ruinosa de Bolsonaro em 2018.

Poder-se-ia dizer que Lula não aprendeu nada com os flagelos do passado. Mas isso seria pouco para traduzir o que se passa. Tomado pelos gestos e pelas palavras, Lula tem dificuldades para lidar com a corrupção.

Nega a encrenca que produziu anteontem —"É uma farsa"—, negligencia a de ontem, que herdou do antecessor —"Tenho que aguardar o processo"— e perde o nexo na lambança de hoje —"Uma falcatrua". De duas, uma: Ou Lula harmoniza seu convívio com as irregularidades que o assediam ou transformará a corrupção num tema incontornável da campanha de 2026.

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Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL.

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