Josias de Souza

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Opinião

Bolsonaro repete em comício toda a toada golpista de 2022

Cercado pela Polícia Federal, Bolsonaro transformou um comício de Alexandre Ramagem, seu candidato à Prefeitura do Rio de Janeiro, num ato de desafio à lógica, ao sistema eleitoral e às instituições. Fantasiado com um figurino de perseguido político, repetiu toda a cantilena golpista que produziu o 8 de janeiro e compôs o pano de fundo contra o qual o Tribunal Superior Eleitoral decretou sua inelegibilidade por oito anos.

Voltou a sustentar a lenda segundo a qual Lula subiu a rampa do Planalto pela terceira vez graças a uma fraude: "O que aconteceu no final de 2022, um dia, nós recuperando a liberdade de expressão, vocês tomarão conhecimento". Recorreu a uma analogia futebolística. "Já vimos um time de futebol ser campeão sem torcida. Mas um presidente da República eleito sem povo é a primeira vez na história."

Ao justificar sua fuga para a Flórida às vésperas da posse de Lula, o capitão bateu abaixo da linha da cintura. "Não passo faixa para ladrão." Num instante em que a banda bolsonarista do Congresso articula uma anistia capaz reabilitá-lo politicamente, Bolsonaro insinuou que sua carta voltará ao baralho na próxima sucessão: "Quando se fala em 2026, nós temos que passar por 2024."

Depositou seu futuro nas mãos de sua milícia parlamentar. "Temos certeza que em 2026 muita coisa vai mudar. O Parlamento vai de fato nos garantir a lisura das eleições, e temos certeza que atingiremos o objetivo que é de todos nós."

Menos de 24 horas depois do depoimento de Ramagem à Polícia Federal no inquérito sobre a Abin paralela, Bolsonaro incluiu o cúmplice no enredo ficcional do complô. "O Ramagem, delegado da Polícia Federal que eu conheci na transição de 2018, já começa a pagar um preço alto pela sua ousadia de querer pensar, sonhar e administrar uma cidade com respeito, com honradez e com orgulho."

Na política, como na vida, todo mundo deve raciocinar com hipóteses. Das mais amplas às mais específicas. Levando-se o raciocínio de Bolsonaro às últimas consequências, a melhor das hipóteses para ele é a de que tornou-se mesmo vítima de um complô da Polícia Federal, do delator Mauro Cid, dos chefes militares que refugaram a minuta do golpe e do Supremo para fazer de um ex-presidente limpinho um criminoso contumaz.

A pior das hipóteses é que, alheio à evidência de que tudo o que está na cara não pode ser uma conspiração da lei das probabilidades contra um inocente, Bolsonaro demora a se dar conta de que o cerco criminal está prestes a convertê-lo de investigado a réu e, no limite, a condenado prestes a passar uma temporada na cadeia.

Diante de tais hipóteses, Bolsonaro tem duas alternativas: ou continua trafegando no universo da Terra plana, ou percebe que um palanque não é o lugar mais adequado para que um delinquente obtenha argumentos sólidos capazes de retirá-lo da condição de um condenado esperando na fila para acontecer.

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Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL.

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