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Josmar Jozino

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Policial é reintegrado após ficar 461 dias preso injustamente por roubo

Se dependesse da juíza Patrícia Suárez Pae Kim, da 1ª Vara Criminal de Campinas (SP), o policial e fotografo técnico-pericial Rogério Pinheiro Leão, 47, cumpriria uma pena de 15 anos e seis meses de reclusão em regime fechado por roubo.

Rogério deu entrada no Presídio Especial da Polícia Civil, em São Paulo, em 16 de junho de 2021. Estava apenas com a roupa do corpo. Era época de pandemia. Não tinha a carteira de vacinação contra a covid. Ficou 14 dias isolado na solitária. Quis até se matar, mas se apegou a Deus, pensou na família e mudou de ideia.

Na semana passada, Rogério foi reintegrado às fileiras da Polícia Técnico-Científica após ficar 461 dias preso injustamente. Na prisão, o fotógrafo pericial prometeu cumprir dois propósitos: o primeiro era provar a sua inocência à Justiça e à sociedade. O segundo cursar direito para defender as vítimas de injustiça, que acabam presas e humilhadas, assim como aconteceu com ele.

O policial foi acusado de participar com outros cinco assaltantes de um roubo a residência em Campinas, por volta das 4h30 de 9 de junho de 2021. Os ladrões invadiram o imóvel, renderam uma família e roubaram joias, dólares, eletroeletrônicos, bicicleta e garrafas de bebidas alcoólicas.

Cinco ladrões estavam encapuzados. Apenas um ficou com o rosto descoberto. Um dos criminosos esqueceu um revólver Taurus, calibre 38, na cena do crime. A arma não estava com a numeração raspada e a Polícia Civil não demorou a descobrir e a identificar o dono dela.

Os agentes apuraram que o revólver era de Rogério. A situação dele começava a se complicar. E, para piorar, uma testemunha o reconheceu na delegacia por uma foto de 2017, da CNH (Carteira Nacional de Habilitação). A Justiça autorizou o cumprimento de mandado de busca nos endereços dele.

Nada de ilícito foi encontrado na casa de Rogério. A Justiça decidiu decretar a prisão dele. O suspeito alegou inocência. Disse que no dia e horário do crime estava com a família em Ribeirão Preto, a 230 km de distância do local do roubo.

O policial civil insistiu em dizer às autoridades que não poderia estar em dois lugares ao mesmo tempo. Os vizinhos se dispuseram a ajudá-lo, e graças a eles foram anexados no inquérito imagens de câmeras de segurança da rua onde Rogério morava.

Os vídeos mostravam que Rogério estava em casa, em Ribeirão Preto, na véspera do crime e no dia dos fatos. Uma das gravações mostra o policial chegando ao seu endereço, dirigindo um carro, às 21h53 do dia 8 de junho de 2021. Ele voltava com a mulher de uma consulta no terapeuta.

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Já no dia do roubo, em 9 de junho de 2021, Rogério aparece em outra gravação, por volta das 8h53, dessa vez passeando na rua com seus cachorros. O advogado Ivelson Salotto assumiu a defesa do policial e tinha certeza de que não teria dificuldade para provar a inocência do cliente.

O defensor ainda observou nas petições que no local do crime não havia digitais de Rogério. Também argumentou que o revólver encontrado na casa das vítimas havia sido perdido pelo cliente em setembro de 2018, no Terminal Rodoviário do Tietê, zona norte paulistana.

Na ocasião, Rogério retornava para Ribeirão Preto. Ele tinha vindo à capital para prestar concurso na Polícia Federal. Ivelson Salotto também alegou às autoridades que o cliente havia sido reconhecido de maneira irregular por uma das vítimas, com base em foto antiga.

Quando ocorreu o assalto, o policial apontado como suspeito estava bem diferente em relação à imagem da fotografia apresentada à vítima do roubo. O acusado encontrava-se com barba e cabelos compridos. A vítima chegou a dizer à polícia que tinha reconhecido a voz dele também.

Em 2 de junho de 2022, veio a pior notícia para Rogério. A Justiça de Campinas o condenou a 15 anos e seis meses pelo roubo e também decidiu decretar a perda do cargo público. Ele era fotógrafo técnico-pericial da Polícia Técnico-Científica.

Estudante da USP

Policial civil que provou a inocência após ficar 461 dias preso agora é estudante da USP
Policial civil que provou a inocência após ficar 461 dias preso agora é estudante da USP Imagem: Reprodução
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Em 20 de setembro de 2022, após tantas batalhas judiciais travadas pelo advogado Ivelson Salotto, a 12ª Câmara de Direito Criminal do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, em votação unânime, absolveu Rogério das acusações e mandou soltá-lo.

Rogério prestou vestibular em uma das universidades mais concorridas e conceituadas do Brasil. Hoje ele é aluno do segundo semestre de direito da USP (Universidade de São Paulo) de Ribeirão Preto. Seus dois propósitos foram cumpridos.

Reportagem

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