Policiais receberam R$ 800 mil de traficante 'Dom Corleone' em 3 vezes

Em três "suaves" parcelas, os policiais civis Valdenir Paulo de Almeida, 57, o Xixo, e Valmir Pinheiro, 55, o Bolsonaro, receberam R$ 800 mil de um dos maiores exportadores de cocaína para a Europa para interromper uma investigação sobre tráfico internacional de drogas.
A propina foi paga pelo narcotraficante João Carlos Camisa Nova Júnior, 39, o Dom Corleone, em 25 de novembro de 2020, por meio de uma empresa de fachada. Investigações da Polícia Federal mostram que ele fez dois depósitos de R$ 300 mil e um de R$ 200 mil na conta de "laranja" dos policiais.
O pagamento foi intermediado pelo também narcotraficante André Roberto da Silva, 34, o Urso, comparsa de "Dom Corleone", e dois advogados acusados de envolvimento no esquema e também investigados pela Polícia Federal e MP-SP (Ministério Público do Estado de São Paulo).

Camisa Nova e André foram acusados de tentar exportar 2,7 toneladas de cocaína para a Europa em 2020. A droga foi apreendida. O primeiro acabou condenado a 32 anos, um mês e 11 dias. O segundo recebeu uma pena de 27 anos e 10 dias de reclusão.
Valdenir e Valmir trabalhavam à época no Denarc (Departamento Estadual de Investigações sobre Entorpecentes). Segundo a PF, ambos receberam a propina em troca de não levar adiante a Operação Alfaiate, que investigava a quadrilha de narcotraficantes.
André havia sido preso no final de 2021. Agentes federais apreenderam o telefone celular dele. O aparelho foi periciado e as análises mostram detalhadamente as trocas de mensagens e áudios entre o criminoso e os policiais civis negociando o pagamento da propina.
No dia 19 de novembro de 2020, André envia um áudio para o agente policial Valdenir e combina um encontro com ele. A reunião não acontece, e o narcotraficante manda mensagem para um de seus advogados, explicando porque não pôde ir.
Os interlocutores trocam mensagens nos dias 20,21 e 22. No dia 23, André comunica que o grupo estava com falta de papel [dinheiro]. No dia 24, um advogado passa para André os números das contas bancárias vinculadas aos policiais. Valdenir reclama que só havia recebido R$ 300 mil.
Em 26 de novembro, em um áudio enviado para o advogado, André reclama de Valdenir, xinga ele e diz que iria mandar os R$ 500 mil restantes. No mesmo dia, em novas trocas de mensagens, as partes envolvidas confirmam ter recebido os valores que faltavam.

MP denuncia policiais e narcotraficantes
Na tarde de ontem, o MP-SP denunciou Valdenir e Valmir à Justiça pelos crimes de corrupção passiva, organização criminosa e lavagem de dinheiro. Camisa Nova, André e os dois advogados deles foram denunciados por corrupção ativa. Outras 14 pessoas, a maioria laranja dos policiais e dos narcotraficantes, também estão na mira das autoridades e acabaram denunciadas por lavagem de dinheiro.
Conforme divulgou ontem esta coluna, Valdenir recebia da Polícia Civil de São Paulo um salário líquido de R$ 5.165,10, mas movimentou R$ 16.199.112,03 em suas seis contas bancárias entre 1º de setembro de 2017 a 23 de agosto de 2023.
O investigador Valmir ganhava R$ 7 mil líquidos por mês e registrou em cinco contas bancárias transações financeiras no valor de R$ 13.582.438,62.
O juiz Paulo Fernando Deroma de Mello, da 1ª Vara de Crimes Tributários, Organização Criminosa e Lavagem de Bens e Valores da Capital decretou a prisão preventiva dos dois policiais civis.
O agente e o investigador foram alvo da Operação Face Off, deflagrada no último dia 3 mês pela PF e o Gaeco. Ambos foram presos.
Os policiais civis tiveram os sigilos bancário, telefônico e telemático quebrados por ordem judicial. A PF apurou que em apenas uma conta no Santander, Valmir movimentou R$ 10.679.899,70. Valdenir movimentou R$ 9.625.838,94 só em uma conta no Banco do Brasil. Os bens de todos eles foram bloqueados no limite de até R$ 15 milhões por determinação judicial.
A reportagem não conseguiu contato com os advogados de Valdenir, Valmir, Camisa Nova e André. O espaço continua aberto para manifestações dos defensores de todos eles. O texto será atualizado se houver um posicionamento.
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