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Juliana Dal Piva

REPORTAGEM

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Voto de Kassio contra Lula foi para mostrar independência interna no STF

Colunista do UOL

23/03/2021 17h36

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O voto do ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Kassio Nunes Marques contra um pedido de habeas corpus da defesa do ex-presidente Lula teve como objetivo mostrar independência interna na Corte.

A avaliação de pessoas próximas ao ministro é que ele quis enfrentar as pressões, sobretudo a do ministro Gilmar Mendes, que fez um duro voto para o reconhecimento da suspeição de Sergio Moro nos processos contra Lula, na sessão anterior de julgamento. Existia uma expectativa no STF de que Kassio seguisse os votos de Mendes e do ministro Ricardo Lewandowski, a favor da parcialidade do ex-juiz.

Os advogados de Lula pediram a suspeição do ex-juiz federal Sergio Moro nos processos julgados em Curitiba por causa de uma série de atos do magistrado, como por exemplo, ter se tornado ministro do presidente Jair Bolsonaro em 2019. Além disso, foram citadas as mensagens de procuradores com Moro obtidas por hackers e divulgadas pelo site "The Intercept Brasil" e outros veículos, como o UOL, desde 2019.

Até o voto de Carmen Lúcia, o julgamento estava 3 a 2 contra a suspeição de Moro na Segunda Turma da Corte.

A ministra, no entanto, mudou de opinião e o placar reverteu para 3 a 2 pela suspeição do ex-juiz. No último dia 9, ela anunciou que daria um novo voto. Naquela data, a Corte voltou ao caso depois de mais de dois anos. Na véspera, o ministro Edson Fachin anulou as condenações de Lula feitas no âmbito da Lava Jato por outro argumento, o de que Moro não era o juiz natural do caso.

Depois que Mendes votou, há 15 dias, o ministro Kassio pediu vista do processo. A postura do novo ministro da Corte irritou Mendes, na ocasião, que tinha grande expectativa de concluir o caso naquele dia. Essa irritação se ampliou nesta terça-feira, como Mendes deixou claro ao criticar o voto de Kassio. Os dois ministros tinham uma relação próxima. Foi um jantar na casa de Mendes que selou a indicação de Kassio para a vaga do decano Celso de Mello, embora Mendes tenha dito a interlocutores que Bolsonaro já tinha feito a escolha sem sua indicação.

Em seu voto contra a suspeição, o ministro Kassio leu uma série de decisões do STF apontando que a suspeição não poderia ser analisada em habeas corpus —impetrado pela defesa de Lula. Ele argumentou ainda que todos os fatos apresentados já foram objeto de análise nas instâncias anteriores e considerou-os "inadmissíveis".

Repercussão em 2022

O voto de Kassio Nunes Marques também é especulado no mundo político já que ele chegou à Corte indicado por Bolsonaro. No entorno bolsonarista e também entre petistas, há uma leitura de que o presidente, nesse momento, prefere enfrentar Sergio Moro na eleição de 2022 do que Lula.

Um episódio na semana passada é citado dos dois lados. Há uma semana, o presidente Jair Bolsonaro afirmou a apoiadores, ao chegar ao Palácio da Alvorada, que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva não ficará elegível para ser candidato a presidente em 2022.

Um simpatizante gritou do cercadinho que gostaria de ver um debate dele com Lula. Tranquilo, o presidente respondeu:"Ele não vai ficar elegível, não. Acho que não".

A decisão do ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal (STF), de anular os atos decisórios dos processos de Lula, anulou as sentenças que o condenavam. Com isso, o ex-presidente poderá voltar a disputar uma eleição. No entanto, a decisão é monocrática. A PGR (Procuradoria-Geral da República) já recorreu e Fachin submeteu o recurso ao plenário da Corte.