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Kennedy Alencar

OPINIÃO

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Com carta e manifesto, elite dá sonoro não a Bolsonaro e barra golpismo

Fachada da Faculdade de Direito da USP, no largo de São Francisco, onde serão lidos manifestos em defesa da democracia - Folhapress
Fachada da Faculdade de Direito da USP, no largo de São Francisco, onde serão lidos manifestos em defesa da democracia Imagem: Folhapress

Colunista do UOL

11/08/2022 04h00

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A carta em defesa da democracia e o manifesto de 107 entidades enfatizando a soberania do voto popular, documentos lidos nesta quinta-feira (11) em ato na Faculdade de Direito do Largo de São Francisco (Universidade de São Paulo), possuem um significado imenso no ambiente regressivo no qual a eleição de Jair Bolsonaro (PL) jogou o Brasil.

Os dois documentos mandam um sonoro não da elite política e econômica ao golpismo do atual presidente da República. Com poucas exceções, essa mesma elite apoiou o golpe parlamentar que resultou no impeachment de Dilma Rousseff (PT) em 2016, comemorou a prisão que tirou Luiz Inácio Lula da Silva da eleição presidencial de 2018 e apoiou a ascensão ao poder do pior presidente de nossa história.

O ato desta quinta-feira 11 de agosto tem peso porque reúne empresários, políticos, intelectuais, artistas, jornalistas e cidadãos com inclinações políticas diferentes e divergentes, mas com uma concordância: é preciso mudar o rumo que o país seguiu nos últimos anos. Rumo que ameaça a nossa democracia. De certa forma, essa elite faz um mea culpa sobre os erros que cometeu no passado recente e desembarca da canoa bolsonarista.

Hoje, em São Paulo, houve dois atos. O primeiro deles começou às 9h30 no Salão Nobre, onde foi feita a leitura do manifesto capitaneado pela Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo) e endossado por mais de uma dezena de entidades. Intitulado "Em Defesa da Democracia e da Justiça", este documento faz contraponto a todas mentiras e ataques de Bolsonaro à Justiça Eleitoral —e teve adesão de entidades da sociedade civil, organizações empresariais e centrais sindicais.

No ano do bicentenário da Independência, reiteramos nosso compromisso inarredável com a soberania do povo brasileiro expressa pelo voto e exercida em conformidade com a Constituição."
Manifesto da Fiesp

Por volta de 11h30, foi lida a "Carta às Brasileiras e aos Brasileiros em Defesa do Estado Democrático de Direito", documento com quase um milhão de assinaturas e adesão crescente. Essa carta, inspirada num documento de 1977 de enfrentamento da ditadura militar de 1964, é incisiva na defesa das urnas eletrônicas e da Justiça Eleitoral.

"Ao invés de uma festa cívica [as eleições de 2022], estamos passando por momento de imenso perigo para a normalidade democrática, risco às instituições da República e insinuações de desacato ao resultado das eleições", diz a carta.

Há um trecho que responde diretamente a Bolsonaro e seus golpistas:

Ataques infundados e desacompanhados de provas questionam a lisura do processo eleitoral e o estado democrático de direito tão duramente conquistado pela sociedade brasileira. São intoleráveis as ameaças aos demais poderes e setores da sociedade civil e a incitação à violência e à ruptura da ordem constitucional."
Carta às Brasileiras e aos Brasileiros em Defesa do Estado Democrático de Direito

Mescla barata de Donald Trump com ditadores de repúblicas de bananas, Bolsonaro deixa claro todos os dias que não pretende aceitar o resultado da eleição. Ele sabe que já perdeu. E teme ser preso devido aos inúmeros crimes comuns e de responsabilidade que cometeu ao longo do mandato. Seu golpismo é tentativa de fugir da Justiça, que precisará responsabilizá-lo.

Em 2022, não há apoio internacional nem doméstico a um golpe, ingredientes necessários para viabilizar o sonho autoritário do atual presidente. Os Estados Unidos e a comunidade internacional já mandaram recados de que não aceitarão uma ruptura democrática. A elite brasileira tampouco quer dar sobrevida a um governo de destruição da economia e das políticas públicas.

A carta e o manifesto são exemplos de que, finalmente, a atual geração entendeu qual é a sua missão civilizatória: tirar da Presidência da República uma ameaça à existência do Brasil como país livre e democrático. Em resumo, os dois documentos têm significado e peso suficientes para barrar uma tentativa de golpe de Bolsonaro.