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Leonardo Sakamoto

Mais de mil morrem todo dia enquanto Bolsonaro vai às compras no Congresso

Jair Bolsonaro, presidente do Brasil - Ueslei Marcelino/Reuters
Jair Bolsonaro, presidente do Brasil Imagem: Ueslei Marcelino/Reuters

Colunista do UOL

29/01/2021 20h07

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Um líder nacional estaria virando noites para buscar formas de conter a disseminação da cepa mais contagiosa do coronavírus - mutação que derrubou Manaus e avança pelo resto do país. Como esse posto está vago, o que vemos é Jair Bolsonaro ir às compras de votos de congressistas para eleger seus favoritos na Câmara dos Deputados e no Senado Federal a fim de mantê-lo no cargo e pavimentar sua reeleição.

Nesta sexta (29), o Brasil registrou média móvel acima de mil mortes pelo nono dia seguido. Nos últimos sete dias, houve 1.068 óbitos por covid, em média. A marca não era tão alta desde 27 de julho, quando ficou em 1.069 mortes. Até agora, 222.775 mortos. Oficialmente.

Mas o presidente está entretido com outras coisas. Reportagem de Breno Pires e Patrik Camporez, do jornal O Estado de S.Paulo, revelou, nesta quinta (28), que o governo federal destinou R$ 3 bilhões de verbas extras para 250 deputados e 35 senadores através de obras em seus redutos regionais. Desse total, R$ 1,77 bilhão está concentrado entre dez senadores e 15 deputados.

O problema não é a destinação de emendas, que são um instrumento de atendimento de demandas das bases, mas isso envolver tomaladacá.

Ao mesmo tempo, o presidente da República segue na mesma trincheira que o coronavírus, atacando governadores e prefeitos que defendem o isolamento social, promovendo aglomerações para forçar uma volta impossível à vida normal e negando a extensão do auxílio emergencial aos trabalhadores pobres.

Tendo combatido ferozmente as vacinas contra a covid-19, Bolsonaro semeou o atraso. Agora, vê a imunização em massa ainda verde no pé. O que fará com que a combalida economia, com seus mais de 14 milhões de desempregados, leve mais tempo para se recuperar, uma vez que os trabalhadores não estão imunizados.

O Instituto Lowy, da Austrália, avaliou a resposta de 98 países para a pandemia com base em critérios como mortes confirmadas, casos confirmados, casos por cada milhão de habitantes, mortes por milhão de habitantes, casos em proporção à testagem e testes por cada mil habitantes.

E se a Nova Zelândia, da primeira ministra Jacinda Ardern, ficou em primeiro, o Brasil de Jair Bolsonaro ficou em último.

Para ninguém duvidar que o fundo do poço é nosso lugar por direito, o então presidente Donald Trump, que levou os Estados Unidos ao topo do pódio do número de mortos, nos usou como referência negativa no combate à covid. "Perguntem como estão no Brasil. Ele [Bolsonaro] é um amigo meu, mas não está bom."

Em qualquer democracia, as mortes e as perdas de empregos causadas pelo pacote de negacionismo, irresponsabilidade e incompetência de Bolsonaro levaria à cassação de seu mandato.

Aqui, contudo, ele contou e, muito provavelmente, continuará contando com o apoio da maioria de deputados federais e senadores, agraciados com recursos e cargos.

Escora-se no centrão, como fez Michel Temer, com a diferença de que o ex-presidente chegou a 3% de aprovação e sobreviveu. Enquanto Bolsonaro continua, em média, na casa dos 30% e possui 16% de fãs e fieis seguidores que pulam no penhasco se ele mandar.

Aliás, quanto mais terraplanista e anticiência for o comportamento presidencial, mais o naco bolsonarista-raiz vai apoiá-lo.

Sem falar que ele tem na chefia da Procuradoria-Geral da República alguém que não tem interesse em indiciar por crime comum um presidente que pode indicá-lo à cadeira de ministro do Supremo Tribunal Federal.

Bolsonaro deixou claro que está mais interessado em proteger a si mesmo e sua família do que salvar vidas "Eu lamento todos os mortos, mas é o destino de todo mundo." Sua declaração ecoa até agora em cemitérios por todo o país.

E o ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, está mais preocupado em agradar o chefe para não perder o posto e sair no dia D, na hora H, para voltar à tropa com a tão sonhada quarta estrela de general.

Como já disse aqui, por mais que o Congresso Nacional tenha aprovado medidas importantes, como o auxílio emergencial, obrigando Bolsonaro a subiu o valor do benefício quando ele queria pagar apenas R$ 200, também manteve o presidente livre para brincar com a vida de milhões.

Diante de um governante que não demonstrou interesse em agir em nome da saúde pública, poderia ter votado por seu afastamento.

Preferiu tornar-se linha auxiliar do Poder Executivo quando Jair foi emparedado pelos inquéritos dos atos antidemocráticos e das fake news e pela tentativa de salvar o pescoço do senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ). O primogênito do presidente foi posteriormente denunciado por desvio de recursos públicos, lavagem de dinheiro e organização criminosa no escândalo das "rachadinhas".

O problema é que o país não paga um valor fixo pela compra de deputados e senadores por parte de Bolsonaro. Já passou de 222.775 brasileiros mortos. E vai continuar subindo.