Bolsonaro vende ilusão de que é homem simples que prefere padoca a joias
Falando com a boca cheia de pão e tomando café com leite em uma padaria simples de Abadiânia (GO), Bolsonaro topou dar uma entrevista em vídeo ao jornal O Estado de S.Paulo, nesta sexta (18), para falar do esquema de venda de joias de luxo que foram surrupiadas do patrimônio do Brasil por ele e seus aliados.
A tática é manjada de tão recorrente na carreira política de Jair. Dar uma entrevista nessa condição, em um vídeo que claramente teria grande repercussão na imprensa, busca passar a imagem de um homem de hábitos humildes. E alguém assim não iria querer milhões em joias caras, não é mesmo?
Contra o mesmo homem pesam denúncias de compra de 51 imóveis usando dinheiro vivo com suspeitas de lavagem de recursos públicos, uso ilegal do cartão corporativo para seu benefício e o de sua família, entre outros BOs, incluindo a venda nos Estados Unidos de presentes dados ao Brasil por governos árabes.
O mesmo homem simples, aliás, teria recebido R$ 17,1 milhões em doações para pagar suas multas eleitorais e judiciais, muito além do que o necessário, e não repassou o que sobrou à caridade. Pelo contrário, colocou tudo em um fundo de renda fixa.
Pesquisa Genial/Quaest aponta que há, hoje, um empate técnico entre os que defendem que o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) seja preso por conta do escândalo das caso das joias: 41% acham que ele deveria ir em cana enquanto 43% afirmam que não. A margem de erro é de dois pontos percentuais.
Claro que o bolsonarismo-raiz vai sempre estar ao seu lado, mesmo que ele torture em público filhotes de gato ou defenda em público que a saudosa vovó Palmirinha cozinhava mal.
Mas esse tipo de caso influencia o eleitor pendular, aquele disputado a tapa na eleição passada, que poderia tanto votar em Lula (pela perspectiva de melhoria no bem-estar material) quanto em Jair (pelo discurso moral). Com isso, esse grupo pode caminhar mais facilmente para o colo do petista em 2024 e 2026. Ainda mais se a renda e o emprego continuarem crescendo.
O esquema para desviar joias que pertencem ao patrimônio do Brasil e vender para pessoas ricas ou em lojinhas do tipo "Compro Ouro" nos EUA, embolsando a grana ao final, tem mais potencial de ferir a imagem de Bolsonaro junto a esse pessoal do que o seu negacionismo na pandemia ou seu golpismo eleitoral. Por isso, a necessidade de reforçar o discurso.
Bolsonaro sempre se vendeu como um "homem comum" que representaria os interesses do povo mais do que os políticos profissionais. Claro que era uma construção, uma vez que ele, um político profissional, especializou-se em ficar rico dando à luz funcionários fantasmas nos gabinetes da família e ficando com parte de seu salário.
Mas esse personagem convenceu muita gente. Afinal, ele aparecia em vídeos oferecendo pão com leite condensado ao representante do governo dos Estados Unidos, deixando cair a farofa do frango sobre sua roupa, fazendo lives improvisadas com bandeiras coladas à parede com fita crepe, cometendo erros de português frequentes entre o povão para gerar empatia ao ser ridicularizado pela elite intelectual - que sempre cai em suas armadilhas.
Agora, esse personagem foi pego em um esquema que envolveu almirantes, sargentos, tenentes, coronéis e até um general para importar ilegalmente joias dadas de presente ao Brasil, depois usar todo o peso do governo fim de pressionar auditores da Receita Federal a liberarem a carga, daí mandar para fora e vendê-la.
Segundo a Polícia Federal e o ministro do Supremo Tribunal Federal Alexandre de Moraes, era Jair quem determinava os rumos criminosos da operação. E quem se beneficiava dos dólares obtidos.
Como o homem feliz com um pãozinho com café e leite na padoca poderia surrupiar joias de luxo que pertenciam ao governo brasileiro, vender para os ricos e ficar com o dinheiro? Praticando ilusionismo.