Leonardo Sakamoto

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Opinião

Bolsonaro dá uma ajuda a Boulos ao trazer sua rejeição para perto de Nunes

À frente nas pesquisas de intenção de voto, tudo o que Ricardo Nunes não precisava neste momento era aparecer em fotos e vídeos ao lado de Jair "700 mil mortos" Bolsonaro - que carrega o fardo de ser o político mais rejeitado pelos paulistanos. Pagou o pedágio de estar coligado ao PL, engolindo a seco o mito em uma churrascada com empresários nesta terça (22).

Quando os bolsonaristas-raiz migravam de Nunes para Pablo Marçal, no primeiro turno, o mito preferiu esconder-se embaixo das cobertas a bater de frente com o seu rebanho quando a maioria preferia o berrante do coach. Jair, que cavalgou a extrema direita durante anos, dando a ela sentido e organização, temia que seus seguidores o largassem caso abraçasse o candidato menos estridente.

Tarcísio de Freitas não largou Nunes. Não pelos belos olhos do prefeito, mas porque a sua reeleição é condição básica para ele tentar pleitear a Presidência da República em 2026, caso a economia sob Lula não esteja bem (sim, o poder de compra e a sensação de melhora na qualidade de vida vão reeleger ou derrotar o petista, e só isso).

Não importa a razão, o prefeito tem com Tarcísio uma dívida de gratidão. E deixou isso claro na churrascada.

Na política, a traição é o pior dos pecados. Tanto que um bom político é aquele que cumpre acordos, independentemente do quanto isso lhe custe. Bolsonaro é visto como traidor de aliados próximos inclusive por eles mesmos, basta ver a quantidade de pessoas que abandonou no meio da estrada. Nunes, no primeiro turno, foi apenas mais um de uma imensa lista que incluiu de Gustavo Bebianno ao general Santos Cruz.

Ironicamente, a nêmesis de Bolsonaro, Lula, é visto como cumpridor de acordos e que não joga aliados no sal, visão compartilhada inclusive por adversários. O ex-presidente segue com aliados não por sua virtude política, mas sua capacidade de mobilizar multidões.

Mesmo condenado e tornado inelegível por oito anos, Bolsonaro disse ontem que será o candidato da (extrema) direita. Ele sabe que isso não vai rolar, mas precisa repetir a mentira para forçar a aprovação de uma anistia a golpistas no Congresso Nacional. Menos por conta da eleição de 2026 e mais pelo risco-Papuda que está logo ali com uma provável condenação por tentativa de derrubar o Estado democrático de direito.

No último Datafolha que mediu a rejeição a candidatos na capital paulista dos dois grandes nomes da política brasileira, Bolsonaro marcava 63% e Lula, 48%. Tendo passado a campanha inteira desaparecido, o ex-presidente ressurge agora, não para apoiar o candidato do MDB, mas para surfar na sua possível reeleição.

Afinal, os votos antipetistas e anti-esquerda já estão com o prefeito, o que mais Bolsonaro poderia agregar? Talvez sua capacidade de gestão na pandemia, como defende o próprio Nunes (contem doses obscenas de ironia).

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Ou seja, reaparece e senta na janelinha não pelo prefeito, mas por si mesmo. Quer vender a ideia de que foi seu empurrão que deu a ele a vitória, sequestrando o trabalho dos verdadeiros alicerces da campanha: a base de vereadores e a rede de lideranças comunitárias que tirou do PSOL/PT parte da periferia que sempre votou com eles.

Boulos já está explorando a rejeição ao ex-presidente. Talvez não dê tempo de surtir efeito, uma vez que a votação é no próximo domingo. Mas nem o deputado contava com essa ajuda de peso na reta final de sua campanha.

Lula, ferido, não pode vir a São Paulo ajudá-lo, Bolsonaro veio em seu lugar.

Opinião

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL