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Madeleine Lacsko

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Os 20 mandamentos para se tornar um zumbi político nas redes sociais

Call of Duty Vanguard, modo Zumbi - Divulgação/Blizzard Activision
Call of Duty Vanguard, modo Zumbi Imagem: Divulgação/Blizzard Activision

Colunista do UOL

07/01/2023 11h32

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Muito difícil compreender o bolsonarismo de beirada de quartel feito de forma voluntária. Aqui e acolá vemos relatos de gente financiada para engrossar o movimento e até para converter acampamentos numa espécie de célula terrorista. É deplorável, mas não é um mistério para a humanidade esse tipo de decisão oportunista.

O mistério é outro, entender como pessoas aparentemente normais toparam fazer esse papelão sem receber um único centavo, realmente acreditando que estão ali para salvar seu país e o futuro da própria família. Eu conheço gente assim e você provavelmente deve conhecer também.

É um fenômeno que causa perplexidade e se assemelha muito a algo que conhecemos bem em outra área, a da espiritualidade, as seitas. Nos anos 1970 e 1980, as pessoas costumavam dizer que membros de seitas passavam por uma "lavagem cerebral". Talvez não exista expressão melhor para definir.

A pessoa passa a acreditar piamente no líder como salvador da humanidade e o grupo em torno dele passa a ser o centro da afetividade. A socialização e o consumo de informações é todo mediado pelo grupo, o que provoca um afastamento progressivo da família e amigos até que descamba para um tipo de comportamento completamente diferente das normas da sociedade em geral.

Um dos maiores experts em seitas destrutivas do mundo, Steven Hassan, passou a se dedicar a esses cultos políticos surgidos após a massificação das redes sociais. A dinâmica da vida social em rede faz com que não seja necessário o afastamento físico do grupo social para que o comportamento de seita se instaure.

Ele escreveu recentemente "The Cult of Trump: A Leading Cult Expert Explains How the President Uses Mind Control", numa tradução livre "A Seita de Trump: um grande expert em seitas explica como o presidente usa o controle mental".

O que muda com as redes sociais? Tudo. Estamos na era do capitalismo de vigilância em que nos expomos voluntariamente a todo tipo de controle mental. O livro "O inimigo conhece o sistema", da jornalista espanhola Marta Peirano, relata de forma primorosa como as Big Techs chegaram a esse modelo econômico em que nós somos o produto e ficamos felizes porque isso libera dopamina.

A primeira grande armadilha para virar um zumbi político é acreditar que isso jamais aconteceria com você. Tem pensamento mágico sobre blindagem psicológica? Está na área vip da zumbilândia. Pode acontecer com você, comigo, com qualquer um.

Não falamos aqui de racionalidade, mas de emoções e controle mental. A melhor blindagem contra isso é ter a consciência da nossa vulnerabilidade e prestar atenção nos pequenos deslizes que vamos cometer pensando que estamos debatendo política.

Em 2019, fiz uma série independente chamada "A Arte da Seita Política", alertando os bolsonaristas sobre os mecanismos e atitudes que os transformariam em zumbis políticos. Não adiantou nada. Este ano fiz um fio no Twitter para os luloafetivos e resolvi trazer aqui, espero que funcione.

Os 20 mandamentos para se tornar um zumbi político nas redes sociais:

1. Você realmente acredita que isso é impossível porque sua ideologia é contra o bolsonarismo, ou seja, você alimenta um pensamento mágico sobre blindagem psicológica.

2. Você acredita que o movimento luloafetivo é 100% bom, não tem defeitos e fica nervoso se alguém critica.

3. Você começou a consumir assessoria de imprensa e influencers simpáticos ao movimento luloafetivo e tenta se convencer de que isso é noticiário.

4. Você atormenta as pessoas que criticam Lula até tomar block. Daí, relaciona a rejeição que sofreu por ser muito puxa-saco de político com "liberdade de expressão". Confundir propositalmente block com liberdade de expressão é um sintoma típico de fanático.

5. Você exibe com orgulho os blocks que toma.

6. Você responde a postagens dos outros de forma agressiva para se sentir valente.

7. Você passa mais tempo respondendo postagens dos outros sem ser chamado do que fazendo seus próprios posts.

8. Você interage basicamente com postagens que têm emoções excitantes e palavras hiperbólicas.

9. Você começa a defender como "novo jornalismo" os manjados influencers amigos que mimetizam jornalismo de fofoca ou programa do Ratinho.

10. Você virou PhD em "limites do humor".

11. Você fica feliz com tudo de mal que aconteça a um bolsomínion e tenta justificar mesmo que seja imoral ou antidemocrático.

12. Você entende que esmagar bolsomínions é mais importante do que ter um plano de futuro.

13. Você imagina que há uma agenda fascista ou até nazista oculta por parte de quem critica ou questiona Lula.

14. Você acha normal adultos tratarem os outros com apelidinhos desumanizantes que são corruptelas dos nomes deles, à semelhança do que Olavo de Carvalho fazia.

15. Você chama de "treta" quando uma pessoa, do nada, resolve atacar outra de forma implacável e chamar um grupo para atacar em enxame.

16. Você acredita que "os dois devem fazer as pazes" quando só um ataca de forma implacável e para defender político.

17. Você passa pano sistematicamente para qualquer patacoada que o Lula ou algum ministro dele faça, acreditando que é por um bem maior.

18. Você realmente acredita que um ser humano - no caso, Lula - pode ser garantia de democracia, mesmo sabendo que isso é o avesso da ideia de democracia.

19. Diante de uma ameaça a um crítico de Lula ou à família dele, como já estamos recebendo por mensagens abertas e fechadas nas redes, sua primeira reação é dizer que o Lula não tem nada com isso, esse pessoal agiu sozinho e é uma exceção.

20. Você começa a perguntar "tá com saudades do Bozo?" para quem criticar o Lula.

Não coloquei na lista a mania de gritar "falsa simetria" porque já virou piada.