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Madeleine Lacsko

OPINIÃO

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Michelle Bolsonaro pode virar rainha do xadrez político evangélico

Primeira-dama Michelle Bolsonaro - Isac Nóbrega/PR
Primeira-dama Michelle Bolsonaro Imagem: Isac Nóbrega/PR

Colunista do UOL

16/02/2023 18h30

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Existem dois universos evangélicos diferentes no Brasil. O primeiro é o mundo real, em que falamos de um público crescente e diverso. O outro é o evangélico que existe apenas no imaginário da elite cultural, um bloco monolítico representado pela parte mais ávida pelo poder político.

A rigor, esse bloco não existe, já que não é monolítico. Mas existe uma parte do movimento evangélico ávida por poder político, que tem enfrentado diversos escândalos nos últimos tempos. Michelle Bolsonaro, agora à frente do PL Mulher, pode ser uma peça que mude completamente o xadrez deste grupo.

Uma entidade que aprendemos a conhecer nos últimos tempos é a Bancada Evangélica, presente não apenas no Congresso Nacional, mas em praticamente todas as casas legislativas do país.

Para quem não tem familiaridade com o universo evangélico, fica a impressão de que todos os parlamentares ligados a essa religião estão organizados em uma bancada única. É algo que não ocorre com outras religiões. Na verdade, estamos diante de um fenômeno mais complexo.

Um caso anedótico ilustra perfeitamente essa complexidade. Na 17a legislatura da Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo foram eleitos dois pastores evangélicos, Carlos Bezerra Jr. (PSDB) e Carlos Cezar (PSB), que formalmente não faziam parte da Bancada Evangélica da casa. Na época, o Coronel Telhada (PSDB) era parte dessa bancada.

Uma década depois, o número de evangélicos na política cresce e a tentativa de conhecer esse público também. Em muitos casos, ele se mesclou com o bolsonarismo, um fenômeno diferente da religião e que beira a idolatria, pecado para os evangélicos.

A eleição da Bancada Evangélica na Câmara Federal este ano seria cômica se não fosse trágica. Houve acusação de fraude. O deputado Otoni de Paula (MDB-RJ) resumiu a contradição em uma declaração registrada pela Folha de S. Paulo em 2 de fevereiro: ""Está sendo fraudada a eleição pelo grupo do Silas Câmara [...] A gente não fala que é crente, a palmatória do mundo? Corrige gays, corrige todo mundo, e faz essa sacanagem aqui dentro?", declarou.

Acusado de rachadinha e pendurado no STF, Silas Câmara acabou eleito líder da Bancada Evangélica. Os irmãos dele são líderes proeminentes da Assembleia de Deus no Amazonas e Pará.

Pode parecer que a denominação concorda com a participação política de seus religiosos e endossa a linha de atuação. Também é mais complicado. No documentário "Púlpito e Parlamento", de 2015, disponível no YouTube, fica claro que este não é o cenário.

A denominação cogitou formar um partido político, à semelhança do que fez a Igreja Universal do Reino de Deus. Os fiéis e lideranças foram contrários. No documentário, fica clara a aversão de muitos dos fiéis à mistura entre espiritualidade e política. Para adicionar uma pitada a mais de complexidade, a Assembleia de Deus é a igreja frequentada por Marina Silva e muitos fiéis que pensam e agem como ela.

Michelle Bolsonaro surge nesse xadrez com jogadas diferentes. Desmobilizou a política tradicional no Distrito Federal. O clã Arruda, que aderiu ao Bolsonarismo, lançaria a ministra Flávia, casada com o ex-governador José Roberto, era a escolha de Jair Bolsonaro. A ex-primeira-dama jogou água no chopp.

Jair Bolsonaro foi convencido a desfazer os acordos políticos tradicionais e apoiar a candidata indicada pela mulher, a ministra Damares Alves, eleita para o senado. Michelle provou que sabe jogar nesse tabuleiro.

Segundo a coluna de Thaís Oyama, ela assume a liderança do PL mulher impondo condições que soam muito palatáveis ao público feminino. Disse que ser mãe é sua prioridade. A filha Laura tem sofrido com a violência do universo político e ela diz que pretende se ocupar disso mais que da vida de política profissional.

Ao mesmo tempo em que assume uma posição tradicional da política, Michelle a renega. Apela diretamente às mulheres que querem ter uma vida profissional significativa sem ter de sacrificar a maternidade.

Isso ocorre exatamente no momento em que as lideranças políticas evangélicas enfrentam uma crise por investir demais na figura de Jair Bolsonaro, mais até do que a mulher dele investiu. Michelle vai rodar pelo país patrocinada por um dos partidos mais poderosos do país. É uma oportunidade de se colocar como rainha do jogo de xadrez evangélico. Resta saber como pretende jogar.