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Madeleine Lacsko

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Debate econômico foi capturado pela polarização irracional

12.jan.2023 - Ministro da Fazenda, Fernando Haddad, ao lado do presidente Lula durante uma reunião no Palácio do Planalto em Brasília - 12.jan.2023 - Adriano Machado/Reuters
12.jan.2023 - Ministro da Fazenda, Fernando Haddad, ao lado do presidente Lula durante uma reunião no Palácio do Planalto em Brasília Imagem: 12.jan.2023 - Adriano Machado/Reuters

Colunista do UOL

20/03/2023 18h56

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Óbvio que a ideologia política é parte importante dos posicionamentos nos debates econômicos. O que vivemos agora é algo para além disso, um cenário em que não se debate mais economia.

A diferença é que se usa apenas a terminologia econômica, deixando de lado a ciência econômica, o raciocínio econômico ou a vinculação de propostas com a realidade objetiva. Não é algo que ocorre só na economia.

Na era digital, vivemos uma simplificação intelectual de todo o debate público. A única base argumentativa passa a ser a moralização de quinta categoria. Ideias ou palavras passam a ser signos de que alguém é bom ou mau. Se for bom, tudo o que faz é apoiado. Se for mau, tudo o que faz é interpretado da pior forma possível. As pessoas se dividem em grupos, sendo que o bom é aquele ao qual elas pertencem e o outro é mau, precisa ser aniquilado.

Nesse cenário, é difícil encontrar soluções econômicas satisfatórias para um país. Mas, uma vez sequestrado para a polarização, o debate econômico passa a ser unicamente instrumento de disputa política.

Fernando Haddad passa por uma fritura preparada por aqueles que defenderam sua candidatura em 2018 e afiançaram seu nome para o Ministério da Fazenda, mesmo diante de questionamentos sobre a habilidade para a pasta.

Ele tem diante de si uma tarefa hercúlea. O sucesso dele será determinante para o governo Lula em algo que vai muito além da briga de manchetes ou de redes sociais.

O Brasil real está debatendo preço de picanha e empréstimos consignados. É nessa realidade, a das necessidades urgentes e imediatas, que as pessoas tentam encaixar termos como taxa de juros, teto de gastos ou política fiscal.

Hábeis, os políticos usam essa terminologia para jogar para a plateia, apenas circundando os temas e aproveitando para demonizar seus adversários. Basta chamar de neoliberal ou comunista para interromper o debate e passar à moralização.

O país está em crise econômica, Lula criou na campanha um imaginário de que as coisas voltariam a ser como em seus primeiro mandatos. Ocorre que agora ele recebeu uma herança maldita de verdade, muito diferente da tal "herança maldita" que era apenas discurso político contra FHC. O cenário internacional também é profundamente diferente, no pós-pandemia - a maior catástrofe da nossa geração - e com a invasão russa da Ucrânia.

Mesmo que o governo tenha acertos incontestáveis na área econômica, é muito improvável que consiga dar às pessoas, sobretudo as mais necessitadas, o alívio econômico que elas esperam.

Economia, na visão das pessoas, está sempre na conta do presidente da República. Não importa se é ou não responsabilidade dele. O acerto ou erro irão para a conta dele na opinião pública.

O presidente Lula sabe que o eleitorado antibolsonarista embarcou em sua candidatura mas não é seu público. O eleitorado dele é composto pelas pessoas cujas famílias tiveram avanços sociais e econômicos em seus mandatos. É para essas pessoas - e só para elas - que o presidente tem falado.

É essa a raiz dos discursos sobre todas as questões econômicas. No lançamento do Mais Médicos, o presidente volta a falar na língua do povo, afirmando que sempre dizem que investimento em saúde e educação é gasto. Ninguém nem falou isso agora, mas não importa, é um pensamento que realmente existe por aí.

Fernando Haddad não pode ir por esse caminho, ele vai precisar tomar medidas que colidem com o discurso populista e terão impacto na vida real. Aloisio Mercadante e Gleisi Hoffmann já deram declarações que deixam implícito que a fritura pública do ministro continua.

É favorável para o presidente Lula, que consolidará seu público cativo com uma ideia de que é capaz até de "cortar na própria carne". No entanto, implode a ideia de que Fernando Haddad seria o nome do PT para 2026. Polarizar com ele passa a ser um mecanismo para consolidar o eleitorado petista.