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Otávio Rêgo Barros

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Os russos vão enfrentar uma guerra de insurreição

7.mar.2022 - Captura de vídeo tirada de uma filmagem divulgada pelo Ministério da Defesa da Rússia mostra um suposto avanço de uma unidade de tanques russos na região de Kiev, na Ucrânia - Ministério da Defesa da Rússia/AFP
7.mar.2022 - Captura de vídeo tirada de uma filmagem divulgada pelo Ministério da Defesa da Rússia mostra um suposto avanço de uma unidade de tanques russos na região de Kiev, na Ucrânia Imagem: Ministério da Defesa da Rússia/AFP

Colunista do UOL

15/03/2022 00h00

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Os oficiais de estado-maior se agitam no comando conjunto das forças armadas em Moscou. Os russos já preparam os movimentos para a próxima fase da batalha na Ucrânia.

Novas ordens serão expedidas, indicando missões às tropas desdobradas no teatro de operações e a outras que possam reforçar a manobra.

O plano de campanha inicial sofreu reajustes, mas até os militares mais modernos aprendem que dada a largada em uma empreitada dessa magnitude, os planos vão se adaptando ao terreno e ao inimigo. É o princípio de guerra conhecido como flexibilidade.

A defesa inesperada de cada metro do terreno pelo exército da Ucrânia custou muitas vidas e pesadas perdas em material às forças de Putin.

A história nos ensina que não se conquista um país com 600.000 km2, dimensão semelhante ao Estado de Minas Gerais, em apenas duas semanas.

Mesmo assim, os russos já cercaram Kiev e muito provavelmente investirão sobre o núcleo central da cidade nos próximos dias.

Também conquistarão, em breve, as cidades debruçadas sobre o Mar Negro, criando um corredor seguro para aproximar meios e chegar à Odessa, único porto utilizável pelos ucranianos.

É uma manobra clássica, na qual as três direções estratégicas de atuação (Bielo-Rússia - Ucrânia, a Norte, e Rússia - Ucrânia, a Nordeste e a Leste) se fecharão em algum ponto entre Kiev e Odessa, com as tropas desdobradas sobre a margem esquerda do rio Dnieper.

Estará criado uma zona tampão a Leste do curso d'água que protegerá a mãe Rússia contra a OTAN e suas investidas.

Mas, até lá, Putin precisará ter domínio das principais cidades ucranianas na zona de ação. E não custa recordar que o combate urbano traz vantagens para o defensor que conhece becos e atalhos da área de operações.

Exige dos atacantes tropas de infantaria que, mesmo detentoras de tecnologia avançada, terão de expor-se para pegar o touro pela unha.

Grandes potências já sofreram diante de quadro semelhante. Lembremo-nos das escaramuças americanas em Mogadíscio (Somália) e Mossul (Iraque).

Será Kiev a Mogadíscio dos russos? As lições de guerra para o urso inquieto estão muito próximas de sua fronteira Sul.

Concluído o investimento sobre as toneladas de concreto destruído, a queda da capital ucraniana será anunciada por Putin como a conquista do objetivo principal e centro de gravidade da operação.

Os russos já sabem que a partir de então o ritmo e os embates terão outras características.

Os ucranianos, com a debacle do centro político de poder, terão que mudar as estruturas de sustentação do governo Zelensky para Oeste, perdendo as vantagens materiais e psicológicas que animam os seus combatentes.

A guerra de insurreição passará a ser o padrão do conflito. Ela será tão mais violenta quanto mais violento for o tratamento dos soldados russos com a população das cidades.

É admissível que os combatentes ucranianos nesta fase se misturem à população, o que tornaria muito difícil sua detecção pelas forças fardadas de Putin.

A Rússia fatigará soldados e desgastará material para manter os aglomerados urbanos conquistados. Seus combatentes sofrerão emboscadas diárias e só estarão seguros dentro dos pontos fortes.

Os ucranianos, por sua vez, precisarão cada vez mais de apoio externo para prosseguimento da campanha.

A cadeia logística de sustentação será afetada pelos ataques russos, como o ocorrido a semana passada à base ucraniana em Lviv.

Quanto mais próximo da fronteira os mísseis de Putin tiverem que buscar seus alvos, mais próximo ficará a OTAN de entrar no conflito, escalando a crise de regional para mundial.

As conversações em busca da interrupção do conflito ainda podem alongar-se por dias, semanas, meses a depender da evolução da guerra de quarteirão e do entorno político e diplomático que cercará cada encontro.

Mesmo que um cessar-fogo seja aceito, os embates continuarão a ocorrer para manutenção do moral dos combatentes e ganhos táticos de posição.

Nessa fase será essencial a "intromissão" das grandes potências não envolvidas diretamente para a solução do conflito. O espaço para negociação se torna mais exíguo a cada dia.

O resultado desses encontros indicará o caminho que o mundo vai seguir a partir de então. Ingênuos os que acreditarem que nada mudará ou mudará pouco. Já mudou!

A hegemonia estadunidense foi posta à prova. A OTAN, do alto de sua fortaleza de papel, precisará reajustar-se. A Ucrânia peleja entre o passado czarista e o futuro jeffersoniano. A Rússia ruge, mas o velho urso está alquebrado.

A China, onde o relógio das decisões é mais lento, colhe dividendos pelo conflito. Vale-se das idiossincrasias ocidentais, da ansiedade por protagonismo da Rússia e das necessidades econômicas do mundo em geral.

Com o socialismo de mercado e a liberdade política inexistente, o império do meio se fortalece. Vence, pouco a pouco, as imposições da geopolítica e se prepara para o grande embate entre o Ocidente e o Oriente quando e se ele chegar. A conferir.

Paz e bem!