Aceno de Lula à permanência estudantil poderia ser marca da gestão
Lula não é propriamente um político com ideias novas sobre educação. Suas declarações sobre o tema não costumam fugir de lugares comuns do tipo "educação é a base de tudo" e "é preciso valorizar o professor". A descrição de ações concretas tende a ser mais rara e, quando ocorre, privilegia o acesso ao ensino. Na entrevista a Carla Araujo e Leonardo Sakamoto no UOL, o presidente manteve a tradição, por um lado, e trouxe uma renovação do discurso, em outro.
Jogando na zona de conforto, enfileirou nomes das cidades paulistanas onde vai inaugurar novos Institutos Federais. Ainda que a expansão da rede federal de ensino superior seja um legado dos mandatos do PT, são justas as críticas quanto à qualidade e à velocidade do processo, incapaz de reverter a tendência de um ensino superior amplamente dominado por instituições particulares. Processo, aliás, incentivado pelo PT com políticas como Fies e ProUni.
Outros sinais são mais animadores. Não deixa de ser interessante constatar que o presidente tenha utilizado o pouco tempo dedicado à educação na entrevista para falar de duas políticas de permanência estudantil: o programa Pé de Meia e as escolas em tempo integral. São importantes para manter estudantes no Ensino Médio e para o acesso à etapa seguinte, o ensino universitário.
Lula celebrou o fato de ter encontrado uma USP mais diversa em termos étnico-raciais e de classes. A imagem, semelhante à da rede federal, é fruto da implantação do sistema de cotas. Há muito o que avançar, mas o fato é que as universidades públicas têm hoje um pouco mais a cara do Brasil.
Conforme esse processo avança, vão ficando evidentes as dificuldades de manter o "colorido" exaltado pelo presidente. Abrir portas do ensino superior a populações historicamente vulnerabilizadas (e é preciso e possível abri-las ainda mais) é só o primeiro passo.
Sua chegada traz demandas em termos de transporte, alimentação, moradia, recursos para aquisição de material didático e a vida no dia a dia. Ao binômio acesso e qualidade, adiciona-se um terceiro elemento: a permanência estudantil.
A ideia é combater o abandono e sua vertente da desistência por falta de recursos. A necessidade de trabalhar para se manter, ajudar ou mesmo sustentar a família é a tônica dos novos grupos. Isso exige políticas públicas, do oferecimento de bolsas de permanência à alimentação e moradia estudantil, para que a necessidade financeira não resulte em abandono escolar.
Mais: é importante que esses novos alunos não se sintam "estudantes de 2ª classe". Ao chegar ao ensino superior com formação fragilizada e precisando trabalhar, é comum que vivenciem uma experiência universitária empobrecida em relação a seus colegas de classes sociais mais abastadas. Investir em esporte, cuidados de saúde mental, fomentar a participação em associações acadêmicas e coletivos estudantis ajuda a tornar esse desencaixe menos evidente.
A bem-vinda presença de um alunado mais diverso modifica as prioridades da escola e da universidade. Já não basta mais apenas pensar no tripé ensino, pesquisa e extensão. Criar condições para que os estudantes possam seguir na escolarização e participar dela de forma plena indicam que a tarefa da educação se tornou mais complexa — o que, em termos de políticas públicas, precisa equivaler a mais investimentos.
A sinalização de Lula, ainda que tímida, aponta uma possível marca para a gestão que, até aqui, está devendo na educação.
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