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Ronilso Pacheco

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Ataque ao Capitólio: 4 lições que servem ao Brasil em ano eleitoral

Colunista do UOL

06/01/2022 12h00

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Há um ano, um grupo de manifestantes, filiados ao Partido Republicano em sua maioria, e absolutamente todos apoiadores e simpatizantes de Donald Trump, conseguiram o que parecia impossível: invadir o Capitólio, sede do Congresso dos Estados Unidos, em Washington.

Um ano depois, o episódio, amplamente reconhecido como um terrorismo doméstico e um ataque à democracia, ainda levanta forte debate no país. Considerando a forte ligação política entre os EUA e o Brasil e, como nós não estamos tão distantes de um colapso de nossa própria democracia, compartilho a seguir quatro importantes aprendizados que servem para pensar o Brasil em ano eleitoral.

Não esperem o caos todo de uma única vez

Embora o 6 de janeiro tenha gerado as mais icônicas imagens sobre o terrorismo doméstico ao Capitólio, ele não aconteceu da noite para o dia. Ao longo de todo o 2020, ocorreram demonstrações semelhantes em vários estados americanos.

A mais expressiva delas aconteceu em maio, em Michigan, quando milícias armadas, manifestantes trumpistas, protestavam em frente ao capitólio estadual contra as medidas de restrições propostas para conter a pandemia.

Tudo isso nos diz que ninguém deve esperar uma sabotagem cinematográfica de bolsonaristas contra as eleições ou o devido processo democrático. Cotidianamente, vemos diversos exemplos dessa espécie de preparação de caminho. Desde as lives de Bolsonaro com suas mentiras, até as carreatas, motociatas e 7 de Setembro.

O recuo de Bolsonaro, com a carta redigida por Michel Temer (MDB), como uma forma de se retratar depois das ofensas diretas ao ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Alexandre de Morares e à Corte, levou a uma ridicularização pública do que foi o evento puxado pelo presidente para o Dia da Independência. Mas eventos como esses devem ser vistos como um "teste de fidelidade" do seu séquito.

O ultraconservadorismo evangélico será fundamental

Nos EUA, quanto mais se aprofundava na organização e mobilização do ataque ao Capitólio, mais perto se chegava do papel fundamental das grandes igrejas conservadoras com seus pastores próximos, ou admiradores, de Trump. Evangélicos brancos cristãos nacionalistas forneceram a alma do ataque terrorista.

No Brasil, o campo de liderança fundamentalista, seja batista, pentecostal ou calvinistas, está mergulhado com Bolsonaro até o pescoço e estão dispostos a detonar o país e a democracia, com mentiras e narrativas difamatórias e de pânico moral, para mantê-lo no poder.

A Bíblia ou o Evangelho já não fazem mais diferença para esses líderes —os textos sagrados servem apenas para que mantenham o que consideram ser a melhor garantia de poder para eles.

Tendo em vista o 7 de Setembro e a posse de André Mendonça no STF, eles agirão de forma muito mais agressiva e desonesta para empurrar o seu rebanho para o segundo momento da aventura bolsonarista e sua supremacia crista.

Uma 'terceira via' apenas confundirá o país

Desde os primeiros indícios de que Trump estava animando grupos de milícias e supremacistas brancos, além da extrema-direita religiosa, uma parte mais moderada do Partido Republicano apostou em relevar. Acharam que se ignorassem o radicalismo fomentado por Trump, ele perderia força e um 6 de janeiro jamais aconteceria. Erraram.

O bolsonarismo empurrou o país para uma polarização que definitivamente não se resolverá com um uma "terceira via" que é apenas uma terceira opção. O Brasil foi radicalizado pela ascensão de um estilo de governo violento, desonesto, falacioso, abertamente autoritário, intolerante e que odeia a diversidade.

Para não se confundir com nenhum dos lados dessa radicalização, a terceira via optará por ou relevar a perversidade da extrema-direita ou criticar as propostas da via à esquerda. Tirando os casos em que muitos dos que se identificam com nomes da terceira via não odeiam o governo Bolsonaro, mas apenas o próprio Bolsonaro, ela muito mais confundirá o país do que dará a ele uma alternativa.

Mentiras, dissimulações e difamações serão oficializadas

O ataque de 6 de janeiro só aconteceu porque o seu processo de construção e animação contou com mentiras e difamações que não foram suficientemente desmentidas, e mais, não foram suficientemente interditadas. A ideia de que a vitória de Joe Biden foi roubada é apenas um exemplo disso.

O séquito bolsonarista sabe que mentiras ditas, o espalhamento de fake news, mesmo que não sejam capazes de derrubar adversários, são capazes de lhes tomar bastante tempo para desmenti-las. Então a ideia é fazer com que os adversários sejam o menos propositivos possível. Eles vão precisar gastar muito tempo dizendo que não são, não fizeram, e não farão o que os mentirosos afirmam.

A impossibilidade de coibir uma live presidencial, mesmo quando o presidente deliberadamente mente, ou a dificuldade de tirar um candidato do páreo, quando ele é beneficiado pelas invenções e difamações feitas por terceiros em seu favor (como muitos pastores fazem para defender Bolsonaro), tornará a luta violentamente desigual.