Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.
Jair Bolsonaro é o capitão que não quis ir à guerra
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"Já colapsamos. Socorro. Preciso de ajuda. Algum estado pode auxiliar com vagas de UTI?".
O pedido desesperado feito pelo secretário de Saúde de Mato Grosso a colegas de outros estados, noticiado pela Folha no domingo, não teve resposta.
Goiás, Mato Grosso do Sul e Tocantins, três dos estados vizinhos, estão igualmente sem vagas.
O Amazonas, ao norte, todo mundo sabe, foi o primeiro a sucumbir: com os sistemas de saúde público e privado esgotados desde o final do ano passado, sofreu colapsos no serviço funerário e no suprimento de oxigênio para os hospitais - o que fez com que, em janeiro, o número de valas abertas por dia em Manaus para receber os mortos pela covid-19 superasse os 200, e a falta de cilindros de oxigênio matasse, em dois dias, 31 doentes por asfixia.
Hoje, a exemplo do que ocorreu lá, Santa Catarina, sem leitos, luta para conseguir "exportar" pacientes que agonizam nas filas de espera. Outros estados seguem o mesmo caminho: nesta segunda-feira, São Paulo está com 80% das vagas de UTI de sua capital ocupadas.
É difícil precisar quanto da tragédia que vive o Brasil pode ser debitada à ineficiência do governo federal no combate à pandemia e ao boicote sistemático perpetrado por Jair Bolsonaro contra as medidas para reduzir a disseminação do vírus.
Mas é fácil imaginar como seria o cenário contrário.
Logo no início da pandemia, Jair Bolsonaro, presidente do Brasil e ex-capitão do Exército, convocaria um pronunciamento em cadeia nacional de rádio e televisão no qual, em tom firme e grave, diria: "Brasileiros, estamos em guerra".
Afirmaria que, a partir daquele momento, todos os esforços do seu governo, todo o empenho dos seus ministros e toda a força da Presidência estariam voltados para o combate ao coronavírus.
Valendo-se da mística da ética e eficiência militar, anunciaria que, naquele instante, ordenava o engajamento total e irrestrito das Forças Armadas no extermínio do inimigo, o coronavírus, e contava com o apoio da população para juntar-se aos combatentes na luta.
A partir de então, mensagens sobre a importância do uso de máscaras, lavagem de mãos e distanciamento social estampariam outdoors, seriam veiculadas na TV, nas redes sociais e se fariam ouvir nos alto-falantes dos milhares de carros que percorreriam os rincões do país.
O Exército, a Marinha e a Aeronáutica auxiliariam o Ministério da Saúde na distribuição e aplicação de testes para detecção da doença, monitoramento de contaminados e aquisição, distribuição e aplicação de vacinas.
Caminhoneiros, influenciadores digitais e policiais de todo o país (apenas alguns dos segmentos de alta capilaridade em que o presidente tem apoios) adeririam à campanha e aos esforços para que brasileiros não morressem vitimados pelo vírus ou pela ignorância.
Bolsonaro, como presidente da República e chefe supremo das Forças, tudo supervisionaria e estimularia, um general à frente do campo de batalha.
Mas o ex-capitão não fez nada disso.
Restou ao Brasil contar os mortos da guerra que ele se recusou a lutar.
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