Texto baseado no relato de acontecimentos, mas contextualizado a partir do conhecimento do jornalista sobre o tema; pode incluir interpretações do jornalista sobre os fatos.
Bolsonaro discursa na defensiva e exige dinheiro em troca de "colaboração"
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Isolado depois de perder a companhia de Donald Trump, a única que lhe restava no clube dos negacionistas ambientais, Jair Bolsonaro surgiu na defensiva na Cúpula do Clima.
Escorou-se em feitos passados, da época em que o Brasil era uma potência ambiental ("Contamos com uma das matrizes energéticas mais limpas, com renovados investimentos em energia solar, eólica, hidráulica e biomassa. Somos pioneiros na difusão de biocombustíveis renováveis, como o etanol etc.); jactou-se de façanhas inexistentes ("O Brasil está na linha de frente do enfrentamento ao aquecimento global"); e prometeu coisas nas quais ninguém acredita ("Destaco o compromisso de eliminar o desmatamento ilegal até 2030. Com isso reduziremos em quase 50% nossas emissões até essa data").
Mas para não perder a pose, exigiu: "Da mesma forma, é preciso haver justa remuneração pelos serviços ambientais prestados por nossos biomas ao planeta, como forma de reconhecer o caráter econômico das atividades de conservação".
Como faz a dinastia Kim, na Coreia do Norte, Bolsonaro exige dinheiro dos ricos para não explodir o planeta.
Repete, de forma mais sutil, a falácia proclamada pelo ministro Ricardo Salles a cada vez que é cobrado por resultados que sua pasta não apresenta: o Brasil está fazendo a lição de casa e ainda assim não viu a cor do dinheiro "devido" pelos países desenvolvidos como contrapartida pelo esforço, mais especificamente os 100 bilhões de dólares que lhe teriam sido "prometidos" pelo Acordo de Paris.
Salles volta e meia repete esse argumento sabendo tratar-se de uma enganação.
O Acordo de Paris, que entrou em vigor em 2016, busca limitar o aquecimento global por meio da redução de emissões de gases de efeito estufa. Quando foi ratificado, em 2016, ele previa que a partir de 2020 os países ricos criariam um fundo de 100 bilhões de dólares por ano para ajudar os mais pobres a atingir as metas estabelecidas.
Ocorre que, perto de 2020, ficou claro que os países estavam deixando muito a desejar, incluindo o Brasil. Em 2020, a taxa oficial de desmatamento da Amazônia foi 70% maior que a média da década anterior (11 088 km² contra 6 500 km²). O desmatamento e as queimadas na floresta são as principais fontes de emissão de gases de efeito estufa, que aumentaram 9,6% naquele ano, segundo o Observatório do Clima.
O Brasil, portanto, não "cumpriu a sua parte", ao contrário do que diz Salles.
E não foi o único país a falhar. Segundo dados do programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente, desde a assinatura do acordo, as emissões de carbono no mundo, em vez de diminuir, cresceram - foram 55 bilhões de toneladas de CO2 em 2019, contra 50 bilhões em 2015.
Do ponto de vista político, o Acordo de Paris ainda sofreu com o abalo da saída dos Estados Unidos, o segundo maior emissor de carbono no mundo. A retirada americana foi anunciada pelo ex-presidente Donald Trump em 2017 e formalizada em 2020 (a retomada do acordo foi uma das primeiras ações de seu sucessor, Joe Biden).
Para completar, o adiamento da Conferência do Clima de Glasgow, por causa da pandemia, prejudicou o calendário de negociações do acordo, incluindo a implementação do fundo de 100 bilhões de dólares de que tanto fala o ministro Salles - e que, de resto, seria destinado a TODOS os países em desenvolvimento signatários do pacto, e não apenas o Brasil, como falseia o ministro.
Bolsonaro, em seu discurso na Cúpula do Clima, repetiu que quer dinheiro para manter a floresta em pé. A isso se dá o nome de extorsão. O líder norte-coreano, com seus modos caricatos e seu cabelo espetado, tem a bomba e um mandato sem hora para terminar. Bolsonaro pode durar só até 2022 e, até lá, tem apenas suas bravatas e sua triste figura a ameaçar o planeta.
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