Wálter Maierovitch

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Opinião

Dino será juiz, político ou despachante de Lula no STF? Façam suas apostas

Atenção para a sábia frase do saudoso jurista Piero Calamandrei. Lá vai ela, numa tradução livre do italiano:

Não importa nem a cultura nem a inteligência do juiz, mas se existirem essas virtudes serão benvindas. O que realmente importa na figura do juiz [magistrado], na sua formação de homem, de operador [do Direito], de modelo, é a sua imparcialidade.

As histórias judiciárias e políticas do Brasil são pontilhadas por casos de presidentes de turno a indicar para o STF —tanto nas ditaduras passadas como na República— magistrados para servirem como fantoches e ventríloquos. Prontos para servir como longa manus, comprometidos com a parcialidade e a transmitir, nos julgamentos, o desejo do chefe do poder Executivo.

Muitas vezes, no entanto, o tiro saiu pela culatra e o novel ministro tornou-se imparcial, independente e livre. Aí, alguns receberam o inevitável carimbo de traidores, por mentes autoritárias e antidemocráticas.

Como regra, o ministro do STF imparcial, independente e livre, é aquele que chega ao cargo e à função por méritos irrefutáveis.

Na ditadura militar, foi escolhido para uma cadeira no STM (Superior Tribunal Militar) o almirante Júlio de Sá Bierrembach. Nesse tempo, tratava-se de um tribunal superior de muito poder de mando. Hoje, é apenas uma Corte com passado sombrio e nenhum futuro.

Para surpresa dos ditadores de plantão, Júlio Bierrembach sentiu o peso de julgador e abraçou a imparcialidade. Logo no discurso de posse, condenou a tortura e falou em investigações sem violência e com uso da inteligência. Não engoliu a montada história da bomba do Riocentro. Manifestou-se, na presidência do STM, por eleições diretas e livres.

No STF tivemos Ayres Brito, indicado pelo então presidente Lula. Ele foi um ministro sensível, lúcido e independente. Como tinha currículo para chegar à Corte, cumpriu o papel constitucional da imparcialidade.

Muitos juristas europeus definem o magistrado, quer seja de Corte constitucional, quer da jurisdição comum, como "a consciência crítica da sociedade". Ayres Brito vestiu esse figurino à perfeição, como alguns outros.

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O sistema de seleção brasileira é péssimo. Quando D. Pedro 2º quis livrar-se do Poder Moderador, previsto na Constituição imperial, sonhou com a Suprema Corte norte-americana.

D. Pedro 2º até mandou uma comissão aos Estados Unidos da América para observar e ofertar um parecer sobre a adequação do modelo ao Brasil. Não deu tempo para deliberar, veio a República e o modelo norte-americano restou escolhido, implantado e está aí até hoje.

O indicado sem mérito e sem independência fica duplamente devedor, ou seja, do presidente e do Senado, aprovador por maioria dos seus 81 componentes.

Então, o escolhido e aprovado toma posse e passa a ter competência para julgar o presidente da República e os senadores, por deterem foro privilegiado, tecnicamente chamado de foro por prerrogativa de função.

A isso chama-se sistema de freios e contrapesos, que no Brasil apresenta-se viciado e enferrujado.

O sistema brasileiro para o STF foi esculhambado de vez pelo então presidente Jair Bolsonaro. Bolsonaro, quando teve oportunidade de indicar dois juízes para o STF (Supremo Tribunal Federal), revelou publicamente o seu critério: tomar tubaína com os escolhidos e conversar como deveriam julgar (votar).

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À época, o Senado fingiu não ter ouvido o declarado por Bolsonaro e aprovou apenas com base no critério objetivo previsto na Constituição: saber jurídico e reputação ilibada.

Basta atentar às decisões e ler informações jornalísticas a respeito da atuação no STF e no TSE (Tribunal Superior Eleitoral) dos dois indicados por Bolsonaro, ministros Kassio Nunes Marques e André Mendonça, para se perguntar a respeito da imparcialidade de ambos.

Com efeito. Flávio Dino, indicado por Lula é o seu ministro da Justiça e da Segurança Pública. Dino foi juiz concursado e teve destacada posição de imparcialidade e independência em função jurisdicional.

Dino renunciou à magistratura federal e a trocou pela política partidária. Isso sem nunca ter sido um aproveitador de situações como foi Sergio Moro.

Dino, por duas vezes, logrou eleições para o governo do Estado do Maranhão. Conseguiu derrotar o coronelismo representado por José Sarney e os seus filhos. Deu vida democrática ao Maranhão e honrou os dois mandatos. Passou pela assembleia legislativa e conta com mandato de senador da República.

Gostem ou não, Dino é um progressista e, como ministro, ou seja, como agente da autoridade do presidente Lula, enfrentou comissões parlamentares e todos os embates políticos. Dino é um democrata e soube se opor ao golpismo bolsonarista.

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Como foi juiz e depois político, preocupa saber da opção de Dino diante de um STF que deixou, faz tempo, de ser uma corte técnica e se transformou em política.

A sociedade brasileira ainda está polarizada e o STF virou a "bola da vez" das críticas da extrema direita, golpista e bolsonarista.

Espera-se de Dino imparcialidade e independência. Que não forme panelinha a transformar o STF em Poder maior que os demais. A desiquilibrar o princípio constitucional da harmonia e a independência entre os Poderes.

Pano rápido. Não temos bola de cristal para descobrir com qual 'DNA', de magistrado ou de político, Dino se apresentará.

Mas, dá para leitor desta coluna, que quer um ministro imparcial, lembrar da passagem da Divina Comédia quando Dante se aproximou da barca de Caronte, no ingresso do inferno: " Oh tu che vieni al doloroso ospizio . . ., guarda com´entri e di cui tu ti fide, non t´inganni l´ampiezza de l´entrate" ( "Ó você que vem ao doloroso asilo...., atente como entra e em quem você confia e não engana-se com a amplidão da entrada").

Opinião

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL.

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