Jesus longe da Palestina e o papa a falar de interesse por trás de conflito
Enquanto os cristãos ortodoxos esperam 7 de janeiro para comemorar o Natal, a Igreja romana relembra hoje santo Stefano, seu primeiro mártir.
Enquanto isso tudo transcorre, o papa Francisco recebeu a informação da quase vazia gruta da Natividade — com fiéis e turistas afastados em razão do conflito no Oriente Médio.
Acusado de blasfêmia contra o sinédrio hebreu, Stefano restou condenado à morte por lapidação. Um histórico sinal da violência presente nas religiões, ou melhor, a presença da violência que o papa Francisco, em momento inspirado e quando da visita como primeiro chefe da Igreja a pisar no Iraque em 2021, definiu como sendo a "traição às religiões".
No Angelus de Santo Stefano, o papa Francisco, como a prolongar o seu discurso da bênção de Natal, voltou a manifestar preocupação com a guerra da Ucrânia e o conflito da Palestina.
Os veículos de mídia nos mostram o que a guerra produz. Assistimos ao acontecido na Síria, estamos a ver Gaza. Pensamos na matança na Ucrânia. Um deserto de mortes. É isso que desejamos?
Efetivamente, não é isso, mas é o que temos no momento — e, em linguagem bíblica, estamos num "vale de lágrimas". Civis mortos, a incluir crianças palestinas atingidas por bombardeios, em situação a caracterizar, à luz do Direito Internacional, excesso de legítima defesa. Pelo Direito Internacional, não se pode colocar em risco a população civil.
Bergoglio repetiu um discurso surrado ao insistir estar por trás dos conflitos e das guerras o interesse da indústria armamentista. Por isso, atacou os aumentos da produção, comercialização e tráfico de armas de fogo.
Mas, e como sabe até um "chirichetto" (coroinha) de sacristia vaticana, a guerra da Ucrânia é de conquista imperialista de Putin. Pura invasão, pelo Direito Internacional, o Direito das Gentes.
Por outro lado, o conflito na Palestina, iniciado por ilegítimo ato terrorista do Hamas, deriva do mesmo interesse geopolítico, conquistados.
Israel, durante anos, procurou impedir a constituição do Estado Palestino, mantendo, na Cisjordânia ocupada, política expansionista de assentamentos e apartheid, com israelenses sujeitos às leis civis e palestinos obrigados à lei marcial, aplicada por tribunais militares. Em Gaza, Israel mantém um bloqueio com tratamento desumano à população civil.
E já tivemos a época de Netanyahu a financiar o Hamas de modo a minar a Autoridade Nacional Palestina, de modo a impedir a implantação do acordo de paz e o Acordo de Oslo.
O papa é o chefe espiritual da Igreja, mas é, também, chefe de Estado, no comando de uma monarquia teocrática. Por vezes, e ocorreu no Natal e hoje, os papas trocam as bolas, ops, os discursos. Bergoglio partiu para o populista. A indústria armamentista, nos dois casos, alimenta a guerra e o conflito. Mas não é causa.
Ao falar das pessoas cansadas a não querer armas, mas o pão cotidiano (alimento) e a paz, Bergoglio mostra espiritualidade, mas foge do verdadeiro motivo que leva à violência — ou seja, os interesses geopolíticos, geoestratégicos e geoeconômicos.
Bergoglio não se deu conta da troca e não foca na realidade. Netanyahu, por exemplo, anuncia aos quatro ventos a intenção de eliminar o Hamas, "de uma vez por todas". Ora, ora, isso gera uma oposição a qualquer ideia de cessar-fogo e assim o seu governo mantém as tropas em permanente ação.
Para Netanyahu, os membros do Hamas só têm duas alternativas: rendição ou morte.
Newsletter
OLHAR APURADO
Uma curadoria diária com as opiniões dos colunistas do UOL sobre os principais assuntos do noticiário.
Quero receberPara os líderes do Hamas, que mantiveram reunião na semana passada na Argélia, segundo os serviços de inteligência e espionagem do Ocidente, a meta continua sendo excluir Israel do mapa do Oriente Médio, manter o controle administrativo em Gaza e com incursões na Cisjordânia para se impor à Autoridade Nacional Palestina, cuja liderança de Mahmoud Habbas não reconhecem.
Em resumo: enquanto lideranças mundiais buscam alcançar uma trégua humanitária de longa duração e a liberação dos reféns, Bergoglio aponta a culpa da indústria armamentista e expõe a sua teoria de uma guerra mundial em curso, agora fatiada e não mais como as duas grande guerras anteriores. Ainda bem que poucos ainda acreditam no dogma da infalibilidade do papa.
Deixe seu comentário
O autor da mensagem, e não o UOL, é o responsável pelo comentário. Leia as Regras de Uso do UOL.