Wálter Maierovitch

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Opinião

Zelensky teme que vitória de Trump feche torneira da resistência ucraniana

O presidente ucraniano Volodymyr Zelensky começou a se posicionar de modo a buscar um acordo de paz, antes de Trump chegar. E, para usar uma expressão popular, pretende entregar os anéis para não perder os dedos.

Zelensky, até o atentado contra Donald Trump, invocava o direito internacional público, também conhecido por direito das gentes. E invocava o direito internacional para sustentar que o governo russo de Vladimir Putin violou a soberania da Ucrânia e atentou contra a carta constitutiva da ONU. Frisava só ser possível um futuro acordo de paz com o imediato cessar-fogo russo e a retirada das tropas.

De olho na sucessão presidencial norte-americana e sabedor das posições de Trump em desfavor da Ucrânia, o presidente Zelensky está mudando de postura e de discurso. No palco cênico internacional, Zelensky já se apresenta em panos novos, com coloração conciliatória.

Com Trump, a fonte que sustenta a resistência ucraniana -- dinheiro e armas -- poderá secar. E o candidato republicano, antes da convenção que confirmou sua escolha, deu puxão de orelhas nos estados membros da Otan por não pagamento das cotas participativas, com os EUA a sustentar economicamente o pacto do Atlântico, algo que Trump ressaltou precisar mudar. Mais ainda, Trump, nas suas manifestações, não é um entusiasta da Otan.

No último encontro relativo aos 75 anos da Otan, apesar do anunciado, o plano de blindagem a Trump, de modo a impedir mudanças no apoio à Ucrânia, pode não ter passado de retórica.

Antes e depois

Zelensky, até a data do atentado sofrido por Trump, insistia na posição de jogar a responsabilidade no invasor, queria a Criméia de volta e indenizações para reconstruir o país. E sempre emocionou a sua reivindicação das crianças sequestradas pelos russos: tal desumanidade gerou a imposição, pelo Tribunal Penal Internacional, da prisão cautelar, preventiva, de Putin.

O presidente ucraniano, que mandou mensagem a Trump condenando o atentado e desejando pronta e total recuperação, propõe um segundo encontro para tratar do fim da guerra, agora com a presença de Putin.

O primeiro e inútil encontro ocorrido em Lucerna, na Suíça, não contou, pasmem, com a presença russa. Não houve convite.

Ao encontro de Lucerna, Putin deu a resposta rápida. No sentido de não considerar Zelensky legitimado a celebrar acordo de paz, pois o tempo do seu mandato havia expirado: as eleições presidenciais ucranianas foram adiadas em razão da guerra.

Um segundo encontro de paz foi proposto pelo premiê húngaro Viktor Orbán, na condição de presidente de turno da União Europeia. Zelensky concordou e Orbán já visitou Putin. Como Orbán é carne e unha com Putin, o encontro de paz poderá acontecer, em breve, e Orbán atuará em favor de vantagens para a Rússia.

Zelensky, na nova postura, deverá abrir mão de parte da região de Donbass, em locais com população majoritariamente russa. E poderá ficar definitivamente reconhecida como russa a Criméia.

O temor de Putin

Putin está ganhando a guerra e tem o apoio velado da China. Tem conseguido driblar os embargos de maneira a não fazer pesá-los no bolso dos russos. A maioria da população está ao lado de Putin e não desconfia do tolo argumento de nazistas estarem a atuar em regiões da Ucrânia e a massacrar os cidadãos russos e de língua russa. Putin chegou a chamar Zelensky de nazista, esquecendo ter ele origem hebraica e ser praticante da região judaica.

O temor de Putin chama-se Otan, em expansão e que está estudando formas de reconhecer a Ucrânia como membro.

Como se sabe, apenas estados-nacionais que não estão em guerra podem ser aceitos na Otan. A Ucrânia já estava em guerra com a Rússia quando feita a proposta de ingresso na Otan.

Agora, juristas debruçam-se no exame da tese de que a Ucrânia não teria provocado a guerra. Ao contrário, restou invadida, com violação à carta constitucional da ONU. Trata-se de tese juridicamente forçada, mas em discussão.

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A proibição da Otan seria para evitar engodos -- um estado entrar em guerra e buscar ingresso na Otan. A peculiaridade seria a Ucrania não ter tido a iniciativa da guerra. Estaria atuando em defesa e, portanto, na condição de vítima.

Putin, além de temer a expansão da Otan, vislumbra a Europa com o chamado "pé atrás". E se une contra o imperialismo expansionista russo -- exemplo é a Alemanha se armando.

Segundo especialistas em geopolítica e geoestratégia, Putin teria interesse num acordo de paz. E com base em reconhecimentos para, num próximo passo e em futuro não distante, buscar domínio de enclaves russos na Moldávia.

Putin, poderá, no acordo, exigir que a Ucrânia não ingresse na Otan, reconsiderado o pedido que está em curso.

Enfim, Trump causa preocupações e medos justos.

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Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL.

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