Bloqueio do X é consequência de um descumprimento anunciado
O ministro Alexandre de Moraes mandou executar a sanção de bloqueio no Brasil da rede X, do bilionário empresário Elon Musk. Isso pelo desatendimento, no prazo estipulado de 24 horas, de decisão judicial para designação, pela forma exigida, de representante legal a representar a rede X.
Como bem desabafou Moraes, "não estamos em terra sem lei".
Como se sabe, a intimação significa ciência de uma deliberação judicial com prevista sanção pelo seu descumprimento.
Musk não pode alegar desconhecimento, pois contestou a decisão pelas redes, a mostrar que teve pleno conhecimento da intimação. Não há, portanto, nenhuma nulidade que possa ser arguível.
Pelo noticiado, Moraes já comunicou à Anatel e, em breve, 20 mil operadoras realizarão os bloqueios. Moraes impôs às operadoras multa por descumprimento da ordem mandamental, no velho estilo do faroeste.
Queda de braço
O ministro Alexandre Moraes e o bilionário empresário americano Elon Musk promovem uma queda-de-braço com regras jurídicas contestadas e audiência de Big Brother.
Os contendores, Moraes-Musk, puxam recursos, de ataque e defesa, de um saco de gatos. Os miados anunciam a certeza de dias piores.
O gato da censura
O 'X' virou o covil de Musk. Nele, Musk abriga, blinda do alcance da Justiça ao descumprir decisões do Supremo Tribunal Federal (STF), e dá voz a sete perfis tóxicos.
Musk protege suspeitos de crimes graves. Esconde difusores de fake news, investigados pela Justiça. Também dá cobertura aos descumpridores da nossa Constituição democrática e republicana. No campo da eversão delinquencial, são acobertados aniquiladores do estado de Direito, das leis vigorantes, que valem para organizar e disciplinar a sociedade.
Na rede de Musk encontra-se a fina flor do bolsonarismo golpista, os influencers da direita radical e aterrorizante.
Como lembrou o articulista Bruno Boghossian da Folha de S.Paulo, "Musk transformou um ambiente que já era pouco saudável numa pocilga. Estimulou a retórica do ódio, premiou a desinformação e acobertou usuários envolvidos em ações destrutivas".
O inquisidor Moraes, designado em portaria da presidência do STF para essa inconstitucional função, identificou ilicitudes por parte do senador Marcos do Val (Podemos-ES) e de mais seis e intimou, sem sucesso, o X para bloqueá-los.
Aqui, pouco interessa a discussão se a portaria é legitima. Como foi referendada pelos ministros, e o STF tem a última palavra em questões constitucionais, caberia a Musk o cumprimento e não a desobediência.
Para desobedecer, Musk alega a surrada tese da censura. No Brasil, a liberdade de expressão não é absoluta. No caso, Moraes acertou quanto ao abuso dos usuários e a ilegal resistência de Musk.
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OLHAR APURADO
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Quero receberDo saco de gatos, Musk tirou e coloca na boca da direita radical bolsonarista o argumento, "ad terrorem", de que, com a suspensão das atividades no Brasil e em face das alegadas arbitrariedades de Moraes, os brasileiros sofrerão as consequências.
Esse argumento não para em pé sob os prismas éticos e jurídicos. São populistas e demagógicos, em um Brasil em que todos estão sob o império da lei. E a decisão jurisdicional pode ser atacada, derrubada, por recurso, ainda que Moraes entenda o contrário.
Crimes estão sendo cometidos continuadamente. Preservar a democracia, o estado de Direito e não deixar impunes os crimes são valores fundamentais, a prevalecer sobre o utilitarismo da tese da privação das redes pelos brasileiros. E nem todos os brasileiros usam a rede X, antigo Twitter.
Esse utilitarismo, na verdade, é caminho para a anomia, com leis que podem ser deixadas de lado. Ou melhor e como se diz no direito inglês, seria conceder um "bill de indenidade", uma declaração de estar Musk acima das leis.
Saco de gatos Starlink
Em Portugal, as pessoas jurídicas são pela lei chamadas de "pessoas coletivas". Fica, só pelo nome, claro que não podem ser confundidas com as pessoas físicas, naturais.
Moraes decidiu bloquear bens da pessoa jurídica de razão Starlink. A meta seria garantir o pagamento de dívidas decorrentes de multas judiciais impostas à rede X por descumprimento de determinação de tirar do ar perfis tóxicos.
As pessoas jurídicas têm personalidade e patrimônio próprios. A falência de certa empresa, como regra, não engloba a de outra. São pessoas diversas.
Moraes ainda não demostrou a comunicação patrimonial entre a X e a Starlink. Não se sabe se as empresa se fundiram. E também não revelou o ministro tratar-se de holding patrimonial.
Enfim, do saco de gatos Moraes puxou e determinou o bloqueio do patrimônio da Starlink como se tivesse patrimônio comum com a X, caixas únicas e personalidade jurídica em confusão.
O fato de Musk ser sócio da Starlink enseja, apenas, o bloqueio ou penhora da sua participação acionária.
Saco de gatos corporativista
Os jornais informaram ter Moraes participado informalmente aos seus pares as decisões que tomaria no caso Musk.
Não se sabe se os ministros do STF deram aprovação a Moraes, o 'nihil obstat' do direito canônico conferido ao papa.
A mera participação não significa aval, concordância, mas simples ciência do que iria acontecer.
Não há, tecnicamente, vinculação. Não se trata de decisão do órgão colegiado, que são sempre formais.
Saco de gatos jus-estratégico
O presidente do STF, Luís Roberto Barroso, reluta em revogar a portaria da presidência, do tempo de Tóffoli, por já ter cumprido o seu objetivo. O risco do golpe bolsonarista já passou e tudo voltou ao normal.
E Moraes, como redivivo Torquemada, o supremo inquisidor da coroa espanhola e da Igreja, continua na presidência das apurações e abriu espaço para Musk, com objetivos ideológicos e claro partidarismos, "nadar de braçada", como se diz no popular.
Com os boatos de prevalecer no STF o corporativismo, que é cego às leis, o Judiciário é levado, pelo seu órgão de cúpula, ao descrédito. Numa imagem, foi parar no Irajá, como a Greta Gabor da peça teatral de sucesso.
Ao ter saído para a queda de braço com Musk, o ministro Moraes, pela velocidade dada às suas decisões e manifestações fora dos autos, promoveu o empresário ao mesmo patamar.
Não existe as relações diferenciadas por atividades. Moraes não se posiciona como juiz, mas como briguento. Os dois parecem galos em rinha de disputa.
Pano rápido
Com o X fora do ar no Brasil, Musk voltará a atacar Moraes e, como num saco de gatos, colocará Trump, Bolsonaro e Lula no seu interesseiro e interminável blá-blá-blá.
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