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Vídeo de imposto federal 'devolvido' omite que governo ainda taxa gasolina

20.mai.2022 - Vídeo de imposto federal "devolvido" omite que governo ainda taxa gasolina - Arte/UOL sobre Reprodução/Kwai
20.mai.2022 - Vídeo de imposto federal 'devolvido' omite que governo ainda taxa gasolina Imagem: Arte/UOL sobre Reprodução/Kwai

Letícia Mutchnik

Do UOL, em São Paulo*

20/05/2022 19h16

Um vídeo que circula em redes sociais trata de forma distorcida a cobrança de impostos federais sobre combustíveis para dar a entender que motoristas teriam direito a terem os valores devolvidos em postos. O governo zerou os tributos nacionais sobre o diesel, mas eles ainda continuam sendo cobrados sobre a gasolina — o combustível que, de acordo com uma nota fiscal mostrada na gravação, foi usado no caso em questão.

O UOL Confere recebeu o vídeo de um leitor via email (uolconfere@uol.com.br). A gravação traz a marca d'água do aplicativo Kwai, onde o post tinha quase 130 mil visualizações até o começo da noite de hoje (20).

Na primeira parte da gravação, uma mulher entrega um valor em dinheiro para um homem. Enquanto isso, um segundo homem diz: "Meu pai abasteceu aqui no posto, aí cobraram o imposto federal que foi isento pelo governo. (...) Foi devolvido o dinheiro do imposto federal. Todo mundo, por favor, pede no posto." Na segunda parte, o pai assume a narração e diz: "Acabo de abastecer no posto Ipiranga aqui da Vila Prado. Estão cobrando o imposto federal, 38 reais. Fui lá e falei com ela que isso aí é lei, que o presidente já tinha tirado esse imposto. A moça me devolveu o meu dinheiro. Quem quiser chegar, reclame. Tem direito, é lei."

Em nenhum momento os narradores dizem qual foi o combustível usado. No entanto, a nota fiscal do abastecimento aparece no vídeo, o que permitiu identificar que o combustível em questão era gasolina aditivada — que ainda tem taxação pelo governo federal. A União cobra R$ 0,69 por litro de gasolina comum ou aditivada, correspondente ao pagamento de PIS, Cofins e Cide.

Procurada pelo UOL Confere, a Fecombustíveis (Federação Nacional do Comércio de Combustíveis e de Lubrificantes), que representa donos de postos, enviou nota explicando que "somente os impostos federais (PIS/Cofins) incidentes sobre o óleo diesel foram zerados. Os demais combustíveis, como gasolina, etanol e GNV, continuam sofrendo a incidência desses tributos".

"A Federação esclarece à população que os postos não fazem o recolhimento do PIS/Cofins dos combustíveis. Os postos revendedores são substituídos tributariamente, ou seja, os impostos federais e estaduais dos combustíveis (PIS/Cofins, Cide e ICMS) são recolhidos pelos elos anteriores da cadeia (refinarias, importadores e distribuidoras)", disse a entidade. "Dessa forma, não existe a possibilidade de devolução de imposto no posto de gasolina, uma vez que o estabelecimento não recolheu tais tributos."

Sendo assim, de acordo com a Fecombustíveis, "mesmo na eventualidade de ocorrer falhas nos softwares que registram as atualizações de recolhimento de tributos, isso não altera em nada a forma como o imposto é recolhido". A entidade mantém em seu site dados atualizados de tributação sobre combustíveis.

A nota fiscal do abastecimento também apresentava o endereço do posto onde o caso mostrado no vídeo aconteceu, na cidade de São Carlos (SP), e a data da compra (segunda-feira, 16 de maio). Para confirmar que as imagens foram feitas no mesmo local, o UOL Confere usou o Google Street View. A reportagem telefonou para o estabelecimento em dois números diferentes para saber o que ocorreu no local e qual foi o motivo da devolução do dinheiro, mas ninguém atendeu.

Alta da gasolina afeta inflação

Apesar de o conteúdo enganoso alegar que "o presidente já tinha tirado esse imposto", o fato é que o preço dos combustíveis vem subindo no governo de Jair Bolsonaro (PL). Em abril, o UOL Economia mostrou que a atual gestão teve a maior disparada no preço da gasolina desde 2001: 64,2% em 3 anos e 3 meses. O último aumento anunciado pela Petrobras, em março, elevou o preço médio da gasolina em 18,77%; o do diesel, em 24,9%; e o do gás de cozinha, em 16%. A União é a maior acionista da empresa.

Segundo o dado mais recente da ANP (Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis), o preço médio do litro da gasolina comum no Brasil nesta semana ficou em R$ 7,275, com mínimo de R$ 6,25 e máximo de R$ 8,59.

Desde 2016, a Petrobras tem como política seguir os preços internacionais do petróleo, o que deixa os preços sujeitos também às variações do dólar frente ao real — se a moeda brasileira se desvaloriza, o combustível fica mais caro. A guerra entre Rússia e Ucrânia também provocou alta no petróleo e derivados. A Abicom, associação que reúne importadores de combustíveis, diz que os valores da gasolina estão com defasagem de 20% frente ao mercado internacional.

A gasolina também influenciou a alta de preços no segmento de transportes, o maior vilão da inflação em março e abril. Nos últimos 12 meses, o IPCA (Índice de Preços ao Consumidor Amplo) acumula avanço de 12,13%. O último Datafolha, de março, mostrou que 75% dos brasileiros consideram o governo Bolsonaro como responsável pela inflação. O presidente é pré-candidato à reeleição e tem figurado em segundo lugar nas pesquisas de intenção de voto, atrás do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

Em março, o Congresso aprovou, e Bolsonaro sancionou, uma lei que prevê a adoção de um ICMS único para combustíveis. O tributo estadual é o que tem o maior peso no preço, com alíquotas de 25% a 34%, a depender do estado, mas os governos locais têm feito manobras para driblar a lei e garantir a arrecadação.

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*Colaborou Bernardo Barbosa, do UOL em São Paulo

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