Haddad promete incentivo a clubes de futebol e apoio a calendário unificado
Esta reportagem faz parte da série UOL Confere Promessas de Campanha, que vai verificar promessas feitas pelos presidenciáveis para checar a sua viabilidade. A cada semana serão descritas e avaliadas uma promessa de cada um dos cinco presidenciáveis mais bem colocados na mais recente pesquisa Datafolha. Saiba mais sobre esta série.
Nesta sexta, será abordada uma proposta de Fernando Haddad (PT): incentivos aos clubes de futebol e a um calendário unificado para o esporte.
O que o candidato prometeu
Em seu programa de governo, o candidato do PT à Presidência, Fernando Haddad, afirma que o "futebol expressa a própria identidade nacional" e que o esporte será foco de políticas públicas em seu governo. "Por meio do BNDES, o governo implementará o Programa de Modernização da Gestão do Futebol, além de apoiar a construção de um calendário unificado, que garanta atividade anual permanente para todas as séries e campeonatos", diz o documento.
Qual é o contexto
Os 27 maiores times de futebol brasileiros arrecadaram R$ 4,9 bilhões em 2017. Segundo análise econômica dos clubes feita pelo Itaú BBA, a receita cresceu 13,3% em relação ao ano anterior, já descontada a inflação. A maior parte da arrecadação (42%) é obtida com os direitos de transmissão dos jogos pagos pelas emissoras de TV. O restante vem de ganhos com publicidade e patrocínio, venda de atletas, lucro de bilheteria e valores pagos por sócios-torcedores.
As receitas bilionárias não cobrem o endividamento dos clubes que, segundo o estudo, chegou a R$ 6,6 bilhões no ano passado. A maior parte desta dívida é referente a impostos. São R$ 3,7 bilhões de tributos devidos.
Em 2015, o Congresso aprovou a Lei 13.155/2015, enviada pela então presidente Dilma Rousseff (PT), que instituiu o Profut (Programa de Modernização da Gestão e de Responsabilidade Fiscal do Futebol Brasileiro). A ideia era promover a gestão transparente e democrática e o equilíbrio financeiro dos clubes de futebol profissional. A proposta permitia o parcelamento de dívidas tributárias dos clubes com a União em troca da adoção de boas práticas de gestão de receitas e do cumprimento de compromissos fiscais e trabalhistas.
Naquele ano, 111 times aderiram ao refinanciamento das dívidas. De acordo com a Receita Federal, essas entidades tinham dívidas estimadas em R$ 3,8 bilhões com o Fisco e a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional. Levantamento do blog do jornalista Rodrigo Mattos mostrou que os 14 maiores times conseguiram renegociar R$ 579 milhões em débitos com o governo em 2015 com reparcelamento em 20 anos.
A nova legislação estabeleceu uma condição para os clubes que aderiram ao programa e renegociaram seus débitos: manter obrigações trabalhistas e tributárias federais em dia, prevendo punições esportivas aos times que continuassem a desrespeitar acordos financeiros com a União. Um recurso ao STF (Supremo Tribunal Federal), no entanto, suspendeu a regra que condicionava a participação de times em campeonatos à comprovação de regularidade fiscal e trabalhista. Em decisão do ministro Alexandre de Moraes, em setembro de 2017, a liminar restabeleceu os resultados dentro de campo como método único de qualificar clubes a disputar campeonatos.
As obrigações determinadas pelo Profut, no entanto, continuam sendo exigidas para que os clubes continuem pagando a dívida com a União de forma parcelada, observa o advogado Roberto de Palma Barracco, especialista em direito desportivo. Entre elas, mandato de, no máximo, quatro anos para presidentes das agremiações, com uma única recondução ao cargo, e comprovação da autonomia de seu conselho fiscal, responsável por elaborar o balanço financeiro anual.
Quem fiscaliza o cumprimento do programa é a Apfut (Autoridade Pública de Governança do Futebol), composta por representantes do governo, dos clubes, dos atletas e de entidade de fomento ao desenvolvimento do futebol.
No Brasil, o calendário do futebol é definido pela CBF (Confederação Brasileira de Futebol) de forma autônoma, sem influência do governo federal. Atualmente, funciona de janeiro a dezembro, com um mês de pré-temporada, incluindo jogos amistosos e treinamento, dez meses de competição e cerca de um mês de férias ao final do ano.
Como o candidato vai cumprir a promessa
A campanha do candidato Fernando Haddad não respondeu aos questionamentos da reportagem até o fechamento da edição.
O que dá pra fazer
O candidato promete, por meio do BNDES, implementar o Programa de Modernização da Gestão do Futebol. Não fica claro, no entanto, qual seria a atuação do banco na implementação das medidas estabelecidas pelo Profut, uma vez que a renegociação dos débitos dos times com a União já está condicionada ao cumprimento delas. Em 2015, as condições de refinanciamento das dívidas já eram vantajosas para os clubes: a dívida foi parcelada em 240 meses, com descontos de 70% das multas e de 40% sobre os juros.
Em maio deste ano, a Apfut iniciou a fiscalização de balanços dos times e, em julho, abriu processos administrativos contra dez deles por descumprimento das regras. Os procedimentos podem levar à exclusão dos clubes do programa e levar à cobrança das dívidas de uma só vez. Mas o trâmite deve ser longo até chegar a isso, afirma o jornalista Rodrigo Mattos em seu blog. Os processos estão correndo e ainda não houve punição.
Na avaliação de Amir Somoggi, especialista em gestão esportiva, enquanto não houver uma punição efetiva para os times, inclusive nas competições, não será possível obrigá-los a cumprir exigências de transparência e gestão financeira, e a permanecer em dia com suas responsabilidades tributárias e trabalhistas. Em reportagem publicada em maio, o jornalista Rodrigo Capelo, da revista Época, revelou que as dívidas trabalhistas dos 24 maiores times de futebol do país até aumentaram em 2017, em R$ 103 milhões, e agora correspondem a 21% do total devido.
Nesse sentido, diz Somoggi, um financiamento do BNDES não teria efetividade e seria mais um benefício dado aos times com dinheiro público. Além da renegociação do Profut, "esses clubes ainda ganham patrocínio estatal da Caixa e incentivo fiscal para vender jogador ao exterior", lembra. O BNDES diz que, atualmente, não possui financiamentos ativos com times de futebol, e que também não há uma linha de crédito voltada para os clubes. Procurada pela reportagem, a Caixa não se pronunciou.
O advogado Roberto de Palma Barracco afirma que a avaliação da efetividade da proposta do candidato depende de maior detalhamento. "A palavra escrita, a lei, pode dizer qualquer coisa. Se isso, na prática, vai mudar alguma coisa ou não, não passa só pelo governo, ou só pela lei, passa pela própria sociedade. Se todo mundo que está envolvido no futebol não concordar, isso não necessariamente vai ser cumprido. É para isso que temos o Poder Judiciário", afirma.
Quanto ao calendário, o professor universitário Luis Filipe Chateaubriand, ex-componente do movimento Bom Senso F.C, afirma que o presidente poderia, por meio do Ministério do Esporte, pressionar os times e a CBF para uma reformulação no calendário. Mas não teria o poder de resolver isso "com uma canetada", reconhece. Para o especialista Somoggi, nem cabe ao governo influenciar essas decisões.
Chateaubriand acrescenta que a definição das datas pela CBF passa por fatores que dificilmente o governo poderia influenciar: a decisão da Conmebol (Confederação Sul-Americana de Futebol) sobre datas da Libertadores e da Copa Sul-Americana, e a influência das emissoras de televisão, responsáveis por uma parte considerável das receitas da CBF e de boa parte da receita dos próprios times.
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