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Protesto de moradores contra mortes em favela no Rio reúne 5.500 pessoas

Comunidade da Maré realiza protesto contra os massacres e a criminalização dos moradores -  Reynaldo Vasconcelos/Futura Press
Comunidade da Maré realiza protesto contra os massacres e a criminalização dos moradores Imagem: Reynaldo Vasconcelos/Futura Press

Julia Affonso

Do UOL, no Rio

02/07/2013 16h55Atualizada em 02/07/2013 18h44

A manifestação de moradores do Complexo da Maré, zona norte do Rio de Janeiro, que ocorreu na tarde desta terça-feira (2) após um ato ecumênico em memória aos dez mortos durante uma operação do Bope (Batalhão de Operações Especiais) nas comunidades no início da última semana, reuniu cerca de 5.500 pessoas e terminou por volta das 18h. A estimativa é de policiais militares que fazem a segurança no local do protesto. A manifestação chegou a fechar a pista da direita da avenida Brasil, sentido zona oeste, na altura da passarela 9.

Veja divulgado pela PM mostra homens armados

O ato contou com a participação do MC Leonardo, que cantou o rap "Eu só quero é ser feliz", de pastores que fizeram uma reza e de um grupo de teatro. O estudante Andrey da Silva, 17, faz parte do grupo do Centro de Artes da Maré, que prestou a homenagem aos mortos na operação do Bope. Dez jovens se deitaram no chão com panos pretos e fizeram um minuto de silêncio. "Os panos pretos representam nosso luto e deitamos no chão para mostrar a morte dessas pessoas", disse. "A Maré não está mais apagada, tem gente com educação, trabalhadora, precisa de respeito."

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A Polícia Militar entrou na comunidade no fim da tarde do dia 24 de junho, em busca de homens que aproveitaram uma manifestação nas proximidades para promover arrastão, roubando mercadorias de lojas e assaltando motoristas que passavam pela avenida Brasil. Entre os mortos, estão um policial do Bope e outros três moradores que não tinham antecedentes criminais.

A ação gerou diversas manifestações de organizações de direitos humanos. O Conselho Universitário da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro) divulgou uma moção criticando a ação do Bope e afirmando acompanhar com indignação as "ações militarizadas truculentas nas regiões mais carentes de recursos da cidade, que evidenciam o tratamento diferenciado que o Estado ainda confere às populações pobres".

Processo

O motorista Cláudio Duarte Rodrigues, 41, um dos feridos na operação do Bope, afirmou que pretende entrar com um processo contra o Estado. Ele participa do ato ecumênico em memória dos mortos que reúne cerca de 400 pessoas na comunidade, segundo a Polícia Militar.

Rodrigues contou que chegava em casa na noite do dia 24 de junho, quando foi atingido. "Era por volta de 23h30, eu estava na van, voltando do trabalho. O caveirão estava logo atrás. Eles (a polícia) começaram a atirar e me atingiram", disse ele, que está andando de muletas. "Vou entrar com um processo contra o Estado e pedir uma indenização."

Morador da Maré há 41 anos, Rodrigues acredita que a manifestação no complexo de favelas pode contribuir para melhorar a entrada da polícia no local. "Esperamos chamar a atenção das autoridades para que a polícia entre com mais cautela na favela. Aqui tem criança, jovem, trabalhador", disse ele, que passou um dia internado no Hospital Geral de Bonsucesso, onde foi submetido a uma cirurgia.

Falta de respeito

"Tudo de ruim acontece aqui dentro, porque a gente se cala. Se botar a boca no mundo, a polícia não vai mais chegar aqui de forma truculenta", diz a ascensorista Maria José Pereira, 41, moradora há 40 anos do Complexo da Maré. Segundo Maria, a polícia não tem respeito por quem mora na favela. "Aqui é na base do tapa na cara, do esculacho. Em abril, a polícia chegou aqui e entrou na minha casa. Eu fui acordada com um fuzil na cara", conta.  "As pessoas têm medo de vir, mas têm que protestar."

Ela contou que as entradas do Bope na Maré têm sido constantes este ano. No dia da operação que terminou com a morte das dez pessoas, ela estava chegando ao complexo. "Fiquei do lado de fora esperando acabar para entrar. Era muito tiro. Bandido tem que prender, e não matar", disse. "Matar é um troféu para eles [policiais]."