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Para analistas, Dilma fez 'pacto com ela mesma' e gerou 'estranhamento' com Legislativo

Guilherme Balza

Do UOL, em São Paulo

25/06/2013 23h22

Os cinco pactos anunciados pela presidente Dilma Rousseff em reunião com prefeitos e governadores, após a onda de protestos que se espalhou pelo país, expuseram um estilo “centralizador” que provocou ruídos entre o Executivo e o Legislativo, conforme avaliação de analistas políticos entrevistados pelo UOL.

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Os pactos foram sugeridos por Dilma na segunda-feira (24) e incluem uma série de medidas nas áreas de saúde, educação, mobilidade urbana, responsabilidade fiscal, além da proposta de se convocar um plebiscito sobre a reforma política.

Todas as ações dependem do Congresso Nacional, cujos líderes não foram consultados antes do anúncio de segunda, por isso, nesta terça-feira (25), o ministro da Educação, Aloizio Mercadante, afirmou, em entrevista coletiva, que o governo federal desistiu da proposta de instituir, por meio de plebiscito, uma assembleia constituinte exclusiva para tratar da reforma política. Mercadante disse que a proposta de plebiscito está mantida, mas a consulta popular tratará do conteúdo da reforma política, e não a criação de um processo constituinte. O ministro disse que a presidente enviará mensagem à Câmara e ao Senado propondo a realização do plebiscito.

“Ela quis ser proativa, mas foi tão proativa que beirou a inconstitucionalidade”, afirma o cientista político Ricardo Caldas, professor da UnB (Universidade de Brasília), em referência à proposta de constituinte para a reforma política, considerada inconstitucional por juristas e pelo vice-presidente Michel Temer (PMDB). “Ela quis fazer um pacto político a partir dela mesma. Dilma dialoga só a partir do momento que se adere à tese dela”, opina Caldas.

Governo desiste de constituinte

Após ouvir líderes do Senado e da Câmara, ministros do STF (Supremo Tribunal Federal) e a OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), o governo federal desistiu, nesta terça-feira (25), da constituinte exclusiva para tratar da reforma política, mas manteve o plebiscito, que agora tratará do conteúdo da reforma. "A convergência possível é o plebiscito", disse Aloizio Mercadante, ministro da Educação. “Não temos tempo hábil para realizar uma Constituinte”, acrescentou.

Tanto Ricardo Caldas, quanto o cientista político David Fleischer, também professor da UnB, avaliam que o recuo denota que a presidente está sendo “mal assessorada”. “Ela nem conversou com o Michel Temer, que já tinha publicado um artigo muito forte contra a constituinte exclusiva”, afirma Fleischer.

O anúncio dos pactos de Dilma, que abriu o encontro com governadores e prefeitos de capitais, com direito a cobrança aos chefes dos Executivos, foi exibido pela NBR, emissora oficial do governo federal. Após o pronunciamento da presidente, o encontro deixou de ser transmitido.


Defesa contida de Renan

Os pactos pautaram as sessões do Senado e da Câmara. O presidente do Congresso Nacional, senador Renan Calheiros (PMDB-AL), abriu a sessão de hoje da Casa manifestando, de forma discreta, apoio às propostas de Dilma, sem, contudo, explicitar quais projetos citados pela presidente seriam priorizados.

Calheiros incluiu ainda mais dois pactos, um federativo e outro pela segurança, além de defender a gratuidade no transporte público a estudantes. O presidente do Congresso admitiu que não houve diálogo do Executivo com o Legislativo, antes do anúncio dos pactos de Dilma, em razão da urgência em dar uma resposta aos protestos.

O senador deu ainda um recado ao Executivo ao manifestar que o Congresso é favorável a qualquer decisão "no sentido de reduzir o número de ministérios" para que os recursos economizados sejam direcionados à saúde, educação, transporte e segurança pública.

Como esperado, a oposição criticou os pactos propostos por Dilma e apresentou um plano alternativo, que inclui dezenas de medidas lidas em plenário pelo senador Aécio Neves (PSDB-MG), que acusou a presidente de “transferir suas responsabilidades para o Congresso.”

Após reunião com Renan Calheiros, lideranças dos principais partidos no Senado disseram apoiar, em unanimidade, a reforma política defendida pela presidente, mas defendem que o processo seja feito através de uma PEC (Proposta de Emenda Constitucional).

Encontro com Barbosa

Hoje Dilma também se reuniu com o presidente do Supremo, ministro Joaquim Barbosa. Depois do encontro, o magistrado afirmou que há uma “crise de legitimidade” da classe política e defendeu a realização de um plebiscito para tratar da reforma política. "Num momento de crise como o atual, a propositura de reformas via emenda constitucional seria viável? Nós temos uma crise de legitimidade. Precisamos de medidas que mitiguem e suprimam essa crise de legitimidade.”

Para Fleischer, embora não se possa falar em crise, “há um estranhamento” entre os poderes. O cientista político avalia que, por outro lado, os pactos de Dilma pode ser uma estratégia para dividir a responsabilidade dos problemas do país e forçar o Congresso a votar temas que estão parados nas casas. “Agora que o Congresso está pressionado pode ser que se vote alguma coisa. Já se fala até em suspender o recesso de julho.”