'O tráfico não vai acabar', diz comerciante da Maré (RJ) após ocupação
Manhã deste sábado (5). Enquanto militares e blindados das Forças Armadas passavam ao lado da loja de seu Luiz (nome fictício), na Vila do João, uma das 15 comunidades que compõem o Complexo da Maré, na zona norte do Rio de Janeiro, o comerciante fala à reportagem do UOL: “Muitos deles [dos traficantes] aproveitam que mototaxista agora tem que usar capacete e se vestem como eles para andar por aqui. O tráfico não vai acabar. No máximo, vai ficar mais discreto", palpitou.
Para o comerciante, que não é morador do local, mas trabalha há 20 anos na Maré, a maioria das pessoas ligadas ao crime que atuava na região continua na área, mesmo após 15 dias de operações da Polícia Militar nas dependências do complexo. "Depois da Copa [do Mundo] vai todo mundo embora e volta tudo ao patamar inicial", disse.
Agora a um cliente, ele continuava a contar suas impressões sobre a ocupação: "Boa essa segurança toda, né? Seria bom se isso não fosse só por cinco minutos".
Por volta das 6h20, militares em blindados do Exército e da Marinha deram início à operação "São Francisco", de ocupação das 15 favelas que compõem o Complexo da Maré. A ação dá suporte e antecede a implantação de uma UPP (Unidade de Polícia Pacificadora) no local --a 39º do Estado. Cento e trinta mil pessoas vivem no local.
De acordo com o CML (Comando Militar do Leste), 2.700 homens do Exército, da Marinha e das polícias Civil e Militar do Rio de Janeiro farão o patrulhamento permanente do complexo até o dia 31 de julho .
16 mortes em 15 dias
Ontem à noite, a Seseg (Secretaria de Estado de Segurança) divulgou um balanço total da operação: em 15 dias, a PM matou 16 pessoas no local. Outras oito ficaram feridas. Um montante de 101 armas foi apreendido, além de 2.252 munições e de grande quantidade de drogas.
O relatório não fornece detalhes nem as circunstâncias específicas de cada uma das mortes, apenas adianta que houve 36 confrontos entre policiais militares e suspeitos, resultando na morte de 16 deles.
A operação contou com um efetivo de 1.500 homens, sendo 1.180 policiais militares e 130 policiais civis, com apoio de policiais federais, policiais rodoviários e de 250 fuzileiros navais.
"Isso aí é um pavão. Estão colorindo para aparecer bonito na TV. Por mim o Exército podia continuar aqui por décadas e décadas. Eles amedrontam, inibem mais [o tráfico]", opinou. "O que era ruim aqui era a ostentação, eles passavam com fuzil na mão pra cima e pra baixo", opina.
Noites tensas
O comerciante relata ainda que desde a ocupação do complexo pela PM do Rio, houve noites tensas nas favelas da região.
"Uns meninos que foram criados aqui e tinha ido para o Caju [outra comunidade da zona norte do Rio] vieram aqui tentar tomar o lugar das facções que saíram. Teve muito tiro", contou.
Ele disse ainda que, esta semana, apesar da presença do Batalhão de Choque e do Bope, tropa de elite da PM do Rio, houve muitos assaltos e arrombamentos de casas e apartamentos no complexo
Moradora relata 'abandono'
"Pra mim, agora tá ótimo, tudo às mil maravilhas. Isso aqui era um inferno". O depoimento é de uma moradora da favela Nova Holanda, uma das 15 que compõem o Complexo da Maré.
Ela pediu para ter a identidade mantida em sigilo por ter medo de represálias de criminosos que atuavam no local. Nova Holanda era dominada pelo Comando Vermelho e considerada uma das comunidades mais perigosas do complexo.
"A essa hora [o relógio marcava 10h10], isso aqui estaria cheio de gente passando com fuzil na mão em cima de moto. A Maré estava abandonada", afirmou a mulher, enquanto homens do Exército revistavam moradores em carros e motocicletas. Para ela, o tratamento dado pelos PMs que ocuparam o complexo desde o último domingo (30) --e agora, pelos militares-- à população é "ótimo". "Tem que revistar todo mundo mesmo, tá certo", disse.
Ela disse desconhecer a ocorrência de mortes resultantes de confrontos entre policiais e criminosos divulgadas ontem à noite pela secretaria.
A moradora também elogiou a limpeza urbana após a ocupação. "Agora a Comlurb (Companhia Municipal de Limpeza Urbana) consegue entrar aqui pra fazer a limpeza das ruas. Antes era uma sujeirada só", disse.
Para ela, o comportamento dos criminosos justificou a ação das forças de segurança. "A culpa foi deles. Se eles vendessem a porcaria deles e ficassem quietinhas, não teriam ocupado. Mas eles quiseram ficar trocando tiro no meio da noite, deu nisso."
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