Moradores da Rocinha negam guerra e criticam cerco militar: 'cassaram nosso direito de ir e vir'
Há 31 anos na Rocinha, a mototaxista Cilene, 43, diz que já passou por o que chamou de "cinco guerras" na favela, mas, segundo ela, nada se compara à situação atual. Desde a última sexta-feira (22), 950 militares das Forças Armadas e policiais ocupam a comunidade de cerca de 80 mil moradores, palco de um confronto entre traficantes da facção Amigos dos Amigos que deixou ao menos sete mortos --quatro na Rocinha e três em confrontos no Alto da Boa Vista e Tijuca relacionados à crise na favela da zona sul carioca.
"Por que a estrada da Gávea está fechada? Por que estou sendo revistada a cada quadra? Você vê algum tiroteio, alguma guerra? Cassaram nosso direito de ir e vir", protestou Cilene, que preferiu não dar o sobrenome. Ao lado de cerca de cem moradores, ela participou na tarde desta terça-feira (26) de uma reunião convocada pela associação comunitária para debater a presença das Forças Armadas. Estiveram no encontro representantes das vans escolares, mototaxistas e comerciantes, entre outros.
Para moradores, a presença do Exército nas principais ruas, bloqueando em especial parte do trânsito na estrada da Gávea, não se justifica. Com os tanques, ônibus e vans não conseguem manobrar na via; há ainda um bloqueio próximo à passarela, obrigando os moradores a darem uma volta maior para acessarem a favela.
Desde a semana passada, ônibus e transporte escolar não passam por dentro da comunidade. Os militares patrulham os acessos à comunidade em apoio às polícias fluminenses. Postos de saúde e escolas na região --nesta terça, mais de 3.300 alunos ficaram sem aula-- também seguem fechados.
Presidente da associação de moradores, Carlos Eduardo lembrou a possível instauração de uma medida judicial para inspecionar casas coletivamente. Para ele, a autorização da Justiça não se faz necessária, porque casas já foram invadidas. Moradores denunciaram no fim de semana que policiais em busca de traficantes arrombaram suas casas.
"Recebemos relatos de comerciantes que tiveram mercadorias roubadas, de moradores com as casas invadidas... A Rocinha não está em guerra, esse cerco, o que estão fazendo com a gente é covardia."
Durante o fim de semana, o secretário de Segurança, Roberto Sá, disse que um mandado de busca coletivo estava em elaboração e seria apresentado no momento oportuno.
Muitos moradores criticam a cobertura da imprensa da crise na Rocinha. "A imprensa só mostra coisas ruins, só se interessa com a rua fechada para quem vai para a Barra [da Tijuca], quem ia pro Rock in Rio", disse uma moradora que trabalha com transporte escolar. A Rocinha se localiza à margem da autoestrada Lagoa-Barra, uma das principais ligações entre as zonas sul e oeste, esta última, onde aconteceu o festival de música.
Segundo a associação de moradores, a UPA (Unidade de Pronto Atendimento), escolas e transporte público não estão funcionando na comunidade. "A gente não pode ficar sem estudar, sem trabalhar, sem direitos básicos", disse o presidente da associação de moradores ao criticar a presença do Exército na favela por tempo indeterminado.
O comandante da UPP (Unidade de Polícia Pacificadora) da Rocinha, o major Cunha Neves defendeu a ação da polícia e dos militares e disse que é preciso levar em conta que há dois grupos de traficantes em guerra. "Não cobro que tomem partido contra o tráfico, sei que é difícil para quem mora aqui. Mas não venham defendê-los. Esses que queimam pessoas em pneus não são os bonzinhos."
Durante a reunião, a diarista Maria Rodrigues, 50, também relatou que o filho, Anderson, 17, esta desaparecido desde a quinta-feira (21). "Já fui à delegacia, ao IML [Instituto Médico Legal] duas vezes. Falaram que teve tiroteio lá perto de casa, não sei mais o que fazer."
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