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PMs cercados em batalhão traficavam droga e adulteraram cenas de homicídios

Corregedoria investiga PMs por "mensalão do tráfico" e morte em São Paulo - Reprodução/TV Globo
Corregedoria investiga PMs por "mensalão do tráfico" e morte em São Paulo Imagem: Reprodução/TV Globo

Flávio Costa, Alex Tajra e Josmar Jozino

Do UOL, em São Paulo, e Colaboração para o UOL

26/06/2020 13h35Atualizada em 26/06/2020 19h32

Policiais militares da Força Tática do 5º Batalhão, na Vila Gustavo, zona norte da capital paulista, traficavam drogas apreendidas, matavam moradores de rua e adulteravam as cenas dos crimes para despistar a investigação das autoridades.

Mensagens trocadas pelos policiais militares em um grupo criado no aplicativo WhatsApp indicam também que os PMs extorquiam dinheiro de traficantes de drogas ligados à facção criminosa PCC (Primeiro Comando da Capital) e comemoravam o recebimento da propina com churrascos realizados dentro da unidade da corporação (veja algumas dessas mensagens no decorrer dessa reportagem).

A Corregedoria da Polícia Militar de São Paulo realizou ontem uma operação que cercou a sede do 5º Batalhão, na Vila Gustavo, zona norte da capital paulista, para apurar denúncias contra policiais da unidade.

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Policiais militares conversam sobre valores de propinas pagas por traficantes
Imagem: Reprodução

Ninguém foi preso durante o cerco promovido pela Corregedoria. Foram vasculhados armários utilizados pelos investigados, em busca de prova das ações irregulares. A investigação segue em sigilo.

O caso foi revelado por reportagem publicada no dia 31 de janeiro pelo site Ponte Jornalismo.

O UOL teve acesso a essas mensagens. O site Ponte Jornalismo entregou em janeiro essas mesmas mensagens à Corregedoria da PM paulista.

Em uma delas, um PM investigado propõe vender quatro dos seis tijolos de maconha que estão guardados dentro do próprio batalhão.

Denúncias

Na véspera do Natal do ano passado, a Corregedoria da PM recebeu denúncias informando que PMs da Força Tática do 5º Batalhão cobravam uma espécie de "mensalão" de traficantes de drogas do Jardim Brasil.

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PMs reclamam do valor da propina paga por traficantes da zona norte de São Paulo
Imagem: Reprodução

O autor da denúncia chegou a divulgar mensagens de WhatsApp de PMs da Força Tática negociando com um traficante o valor da propina em R$ 7.500,00 mensais.

Na troca de mensagens, os policiais militares demonstram insatisfação com o valor cobrado e ameaçam exigir uma mesada de R$ 10 mil para não coibir a venda de drogas no bairro.

Segundo o denunciante, o ponto da venda de entorpecentes funcionava na rua Tenente Sotomano e a propina era cobrada sempre por um tenente e ao menos quatro cabos da Força Tática.

Em uma das mensagens de WhatsApp, um cabo comenta com um traficante que a "biqueira" (ponto de venda de drogas) da rua Tenente Sotomano era uma mina de ouro e chegava a faturar R$ 30 mil por semana com a comercialização de cocaína.

O denunciante também informou à Corregedoria que PMs da Força Tática abordaram, no ano passado, um integrante do PCC (Primeiro Comando da Capital) e tentaram extorqui-lo, pedindo R$ 100 mil para não prendê-lo. Como o criminoso não tinha o dinheiro, os PMs roubaram um fuzil dele.

Ainda segundo a denúncia, os PMs corruptos realizavam churrascos regados a bebidas e drogas com parte do dinheiro obtido com a extorsão contra os traficantes da região.

Mortes de moradores de rua

A Corregedoria da Polícia Militar abriu dois inquéritos para apurar as denúncias contra os PMs da Força Tática do 5º Batalhão.

A morte de pelo menos dois moradores de rua é um dos pontos centrais da investigação. As mensagens indicam que os policiais militares cometeram os homicídios, retiraram os corpos dos locais, e colocaram um fuzil no novo local para indicar, falsamente, que houve um tiroteio. Há indícios de que a fraude foi flagrada por câmeras de rua.

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Policiais militares conversam sobre traficar drogas apreendidas
Imagem: Reprodução

Os policiais integrantes da Força Tática foram chamados a prestar depoimentos sobre esses casos, em dezembro do ano passado.

Após a tomada de depoimentos, um dos suspeitos xinga uma tenente da Corregedoria da PM e comenta sobre como poderia acobertar os crimes cometidos.

Na tarde desta quinta-feira, a sede da unidade militar foi cercada por oito viaturas do órgão fiscalizador, além de outros três veículos (descaracterizados). Foram vasculhados armários usados pelos policiais militares da Força Tática do 5º Batalhão.

Resposta da PM

A Polícia Militar informa que "nesta quinta-feira (25), após recebimento de denúncia anônima informando irregularidades supostamente cometidas por policiais militares do 5º BPM/M, a Corregedoria da PM desencadeou Operação na sede daquela unidade".

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PMs da Força Tática do 5º Batalhão conversam sobre investigação da Corregedoria
Imagem: Roprodução

A nota continua: "em razão dos fatos contidos na denúncia, a investigação prossegue e é conduzida de forma sigilosa, uma vez que a divulgação precoce do seu teor pode comprometer as ações da Corregedoria".

Por fim, a Polícia Militar afirma "que é uma instituição legalista e que, conforme amplamente divulgado ontem (25), vai a fundo nas investigações".

O governador de São Paulo, João Doria (PSDB), afirmou hoje que não vai tolerar abusos cometidos por policiais militares.

"Quero deixar claro aos que aqui estão. Volto a repetir: não vamos tolerar abuso de violência ou de qualquer tipo de disfunção naquilo que representa um policial militar ou civil no cumprimento das suas tarefas".