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Doria indica vice para tentar driblar reunião sobre violência da polícia

Alex Tajra

Do UOL, em São Paulo

30/07/2020 12h59

Depois de ignorar por 11 dias um pedido de audiência para discutir a violência policial com artistas, intelectuais e integrantes de movimentos sociais, o governador João Doria (PSDB) indicou que o grupo fosse recebido pelo vice-governador Rodrigo Garcia e por secretários. Em documento enviado ontem (29) ao governo, as 29 instituições que assinam o pedido agradeceram o retorno, mas afirmaram que a participação de Doria é "imprescindível".

"É importante esclarecer que a assessoria do governador demorou quase um mês para nos responder e, quando o fez, propôs que a reunião fosse feita pelo vice-governador e secretários de segurança, justiça, desenvolvimento social e ouvidor das polícias, sem a presença do governador", diz o documento ao qual a reportagem teve acesso.

Há duas semanas, o UOL mostrou que o departamento jurídico da Polícia Militar fez uma interpretação na lei federal do pacote anticrime em que determinava a suspensão das investigações de PMs que matam caso eles não nomeassem um advogado em até quatro dias. O MP (Ministério Público) orientou, baseado na reportagem, que as investigações devem prosseguir.

Campanha nas redes sociais

As 29 instituições que esperam uma reunião com o governador divulgaram nesta semana um vídeo que mostra parte das recentes denúncias de violência policial com a frase: "Não há cidadãos plenos se uma cidadania democrática não é praticada e não é incentivada pelo Estado". A gravação também diz que "enquanto houver racismo não haverá democracia". Nas redes sociais, movimentos lançaram a campanha #RecebeDoria.

Entre as 29 instituições que assinaram o documento estão: Mães de Maio, Rede de Proteção e Resistência contra o Genocídio, IDDD (Instituto de Defesa do Direito de Defesa), Comissão Arns, Fórum Brasileiro de Segurança Pública, Iniciativa Negra por uma Nova Política de Drogas, UneAfro, entre outras.

O ator Antônio Fagundes, o músico Emicida, a filósofa Djamila Ribeiro, o cineasta Fernando Meirelles, o ex-ministro da Justiça José Carlos Dias, a atriz Zezé Motta, o padre Júlio Lancelloti também somam-se à lista dos assinantes do documento. A pauta já e antiga, e os movimentos pedem ações efetivas para para conter a violência e a letalidade policial.

Em nota enviada na última terça, o governo afirmou que "João Doria convocou o vice-governador e quatro secretários para atender as entidades, pois a sua agenda está dedicada ao combate à pandemia do coronavírus Contudo, elas se recusaram a tratar o assunto com os membros do primeiro escalão do governo".

Ontem, no entanto, o grupo rebateu, afirmando que não se recusou a discutir os assuntos relativos à segurança pública do estado com os secretários e outras autoridades. "Pelo contrário, nos propomos a fazê-lo e consideramos imprescindível, para tanto, a presença do governador nessa ocasião."

A reportagem voltou a procurar o governo estadual ontem. Hoje, a assessoria de imprensa afirmou que a situação permanece a mesma.

Letalidade policial bate recorde

A polícia de São Paulo bateu recorde de assassinatos durante o primeiro semestre deste ano. Neste mesmo período, o número de vítimas de homicídios dolosos (quando há intenção) e o número de policiais mortos também subiu.

De acordo com dados divulgados pela SSP (Secretaria da Segurança Pública), as polícias Civil e Militar mataram, juntas, 514 pessoas em supostos tiroteios, durante o serviço e também durante a folga, de janeiro a junho. É o maior número da série histórica do governo paulista, que iniciou em 2001.

No mesmo período, 28 policiais foram assassinados, mesmo índice registrado em 2018. O número de vítimas de homicídios dolosos também aumentou: foram 1.522 assassinatos no primeiro semestre deste ano contra 1.465 no mesmo período de 2019.