Testemunhas do Carrefour apontam Beto como criador de confusões frequentes
Testemunhas que prestaram depoimento esta semana descreveram o cliente João Alberto Silveira Freitas, 40, como alguém que costumava criar confusões e aparentar embriaguez nos corredores do supermercado Carrefour da zona norte de Porto Alegre. Ele teria importunado um grupo de clientes e andado descalço pela unidade, além de provocar seguranças com frases aparentemente sem sentido, segundo relatos. Advogados da família e da companheira de Beto criticam os depoimentos, que seriam colocados como forma de justificativa para o homicídio ocorrido na semana passada.
Quatro pessoas prestaram depoimento — um cliente e três funcionários da rede de mercados — entre terça-feira (24) e quarta-feira (25) e relataram o comportamento de Beto e a importunação a outras pessoas. Esse episódio anterior à morte dele já era comentado nos corredores da unidade do Carrefour, a tal ponto de duas funcionárias relatarem à polícia terem "ouvido falar" disso por colegas, sem, de fato, presenciar.
Beto, como era conhecida a vítima, foi morto após ser espancado por dois seguranças — Magno Braz Borges, 30, e o policial militar temporário Giovane Gaspar da Silva, 24, na última quinta-feira (19) no estacionamento da unidade. Na última terça-feira (24), a polícia prendeu mais uma pessoa pelo crime, a agente de fiscalização do Carrefour Adriana Alves Dutra, 51 anos.
Após saber da morte de Beto, o cliente importunado por ele procurou a polícia — o nome dele será preservado pela reportagem — e prestou depoimento na última quarta-feira (25). O homem contou que foi ao hipermercado comprar um celular para si e um presente à neta, acompanhado por familiares.
O cliente foi abordado por João Alberto, que "se aproximou por trás e, sem que fosse percebido, envolveu seu pescoço em um dos braços", conforme trecho do depoimento. Beto teria falado alguma coisa que o cliente não entendeu direito, que "acredita que tenha sido 'vende um celular para esse cara que ele é um dos nossos'", complementou a testemunha.
Na sequência, Beto teria colocado a mão no bolso traseiro do cliente, no qual estava a carteira dele. "Motivo pelo qual reagiu desferindo um empurrão em João Alberto, pedindo que se afastasse", segundo depoimento. Logo após, Beto tentou mexer nos óculos de grau do genro do cliente que "reagiu cerrando e erguendo os punhos, alertando João Alberto que se desse continuidade ao seu ato o agrediria".
O advogado do pai de Beto, Rafael Peter Fernandes, observa que já teve acesso a "informações de questões anteriores", que ainda estão sendo apuradas pela polícia. Sobre as confusões relatadas em depoimentos, afirma que isso "não tem nada a ver com o fato que aconteceu [a morte de Beto após espancamento] — desavenças ou qualquer desentendimento, mesmo que seja comercial em relação a ele e a empresa, não altera a questão da responsabilização civil e criminal".
Testemunhas narram incômodos e provocações
O cliente disse que Beto havia "passado dos limites" e pediu que fosse embora. Para a polícia, o homem frisou que acreditava que "João Alberto estivesse alcoolizado ou sob efeito de alguma droga". A filha do cliente procurou os vigilantes, que passaram a acompanhá-lo. Inicialmente acreditaram que Beto estivesse com eles e, por isso, acabaram não intervindo.
No mesmo dia em que o cliente procurou a polícia, um segurança também foi ouvido na condição de testemunha na delegacia — a identificação dele também será preservada pela reportagem. Ele estava no Carrefour em 17 de novembro e relatou que ouviu pelo rádio da central de segurança que havia um cliente "causando certo distúrbio dentro da loja" e que, logo após, foi em direção à seção de eletrônicos.
No espaço reservado aos televisores, o segurança foi abordado por Beto que "começou a falar coisas totalmente sem nexo" como "então tu gosta de matar pessoas" e que Beto teria jogado as mãos para trás e virado seu corpo, dizendo "me leva...me leva". Em seguida, Beto afirmou que era uma brincadeira e estendeu a mão para cumprimentá-lo.
Logo após, percebeu quando João Alberto se aproximou de um cliente e disse para que ele " pagasse pelas suas compras".
Olhar perdido e frases sem sentido
O segurança se aproximou e percebeu que Beto "estava com os olhos bem estalados e que, quando a vítima tirou a máscara para falar com o depoente, ele viu uma crosta de pó branco fixado em uma das narinas; que dadas as evidências, confirmou que o mesmo estaria sob efeito de cocaína e álcool (possivelmente)", segundo trecho de depoimento. Não há menção em outros depoimentos sobre a aparência do nariz da vítima ou o suposto uso de cocaína.
O advogado Fernandes negou histórico de dependência química de Beto. "O que eu vejo, é que agora, considerando vazamento das informações, os seguranças estão prestando depoimentos para desqualificar a vítima, estão tentando justificar o injustificável, estão fazendo uma compensação que qualquer atitude pretérita mereceu a agressão como a forma que foi."
O segurança pediu para Beto se afastar dali, pois estava invadindo o espaço das pessoas e importunando outros clientes. "João Alberto ficou olhando-o com olhar perdido e falou mais um monte de coisas sem sentido", contou o segurança. Beto estava acompanhado da enteada e da esposa, Milena Borges Alves, 43 anos, ao qual o segurança pediu para retirá-lo do mercado.
Procurada pelo UOL, a advogada da esposa de Beto disse que não iria comentar sobre essas situações. "Para nós isso não é relevante, o que o Beto fez e deixou de fazer não nos interessa. Eles (os seguranças) estão no direito deles de defesa deles", complementou.
Dias antes de morte, novo incidente
Quatro dias antes de Beto ser morto, houve outro incidente. Apenas um fiscal de loja relatou a situação — é o homem que aparece em gravações falando para João Alberto "não faz cena" e que "a gente te avisou da outra vez", enquanto estava sendo imobilizado.
O funcionário relatou que em 15 de novembro Beto "esteve no supermercado bastante alterado, especificando estar supostamente embriagado. Recorda-se que a vítima chegou a andar descalço no estabelecimento. Além disso, ele fazia gestos de arma de fogo com a mão, forçando o abraço em outros clientes", conforme depoimento.
A partir daí, um segurança do mercado passou a acompanhar Beto, que foi em direção à esteira rolante e foi embora.
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