24 das 30 maiores cidades do RJ têm média de mortes acima da nacional
A expansão das facções de traficantes e milicianos na última década fez com que o Rio de Janeiro chegasse a um cenário dramático: 24 de suas 30 cidades com mais de 100 mil habitantes têm índices de violência superiores à média brasileira. A informação consta no Anuário Brasileiro de Segurança Pública, publicação organizada pelo FBSP (Fórum Brasileiro de Segurança Pública).
Segundo os dados do estudo, o Brasil teve em 2020 uma taxa de MVI (mortes violentas intencionais) de 23,6 mortos a cada 100 mil habitantes —a categoria abrange homicídios dolosos, latrocínios e lesões corporais seguidas de morte, mas não considera mortes por intervenção policial.
Em seis cidades fluminenses espalhadas por todo o estado essa taxa é superior ao dobro da média nacional: é o caso de Japeri, na Baixada Fluminense, com 60,6 mortos por 100 mil habitantes; Angra dos Reis, famoso destino turístico na Costa Verde, tem 52,2; Macaé, polo petroleiro no Norte Fluminense, tem 50,9; Itaguaí, na Baixada Fluminense, tem 49,7; Cabo Frio, na Região dos Lagos, tem 48,2; e São Pedro da Aldeia, também na Região dos Lagos, 47,1.
A cidade do Rio de Janeiro não figura na lista —segundo dados do ISP (Instituto de Segurança Pública), a taxa de letalidade intencional foi de 14,89 por 100 mil habitantes no ano passado. Já o estado registrou índice de 28,3, com 4.907 mortes violentas intencionais.
Na última década, a capital fluminense passou por dois momentos de quedas nas taxas de homicídios: primeiro com a expansão do programa de UPPs (Unidades de Polícia Pacificadora), entre 2008 e 2014, e novamente a partir de 2018.
Para especialistas ouvidos pelo UOL, o Rio de Janeiro tem um contexto específico que pode explicar esses números. O principal motivo é a existência de diversas facções criminosas em constante confronto por territórios. Também é citado o fato de a polícia fluminense ser uma das mais violentas do país, o que amplifica conflitos; a falência do governo do estado a partir de 2015 e a política das UPPs na capital também são fatores relevantes.
Segundo Daniel Hirata, professor da UFF (Universidade Federal Fluminense) e coordenador do Geni (Grupo de Estudos Novos Ilegalismos), que acompanha a dinâmica dos grupos criminosos no estado, o Rio viveu um processo de expansão dos grupos criminosos para áreas da região metropolitana e do interior que antes não eram ocupadas por quadrilhas. Com isso, vieram a reboque guerras de facções.
Tivemos a expansão dos conflitos faccionais para além da região metropolitana. Mesmo nela, havia vários locais onde isso não era tão comum. Ocorreu um fenômeno de migração de facções e expansão das milícias nesse período, o que acirrou esses conflitos
Daniel Hirata, professor da UFF
Embora as mortes decorrentes de intervenção policial não entrem nessa conta, Hirata afirma que a ação das forças de segurança também provoca indiretamente um maior número de homicídios.
"É bem verdade que houve um problema grave, ainda não solucionado, que tem a ver com a falência do Rio desde 2015, mas também uma série de equívocos na forma de atuação contra os grupos armados. Muito baseada em operações policiais, atividades meramente repressivas, o que não diminui o conflito desses grupos e produz homicídios que poderiam ser evitados também", pondera.
A pesquisadora Samira Bueno, diretora executiva do FBSP e uma das organizadoras do Anuário, defende que a redução de taxas de homicídio no Rio deveria ser uma prioridade não só das autoridades estaduais, mas do governo federal, tendo em vista o grande impacto do estado nos números nacionais de mortes violentas.
Precisa ter focalização nos territórios mais violentos, não tem outra forma de reduzir violência letal. Focar nos jovens, população negra e nos municípios com mais letalidade. Se a gente consegue bons resultados nesses municípios, já é metade do caminho andado
Samira Bueno, diretora executiva do FBSP
Ela afirma contudo que essas medidas devem ser estruturantes —como combate à evasão escolar e políticas de inclusão produtiva para jovens— e não focadas apenas na atuação das forças de segurança para serem efetivas. A aposta meramente no emprego de mais efetivo e gastos diretos nas polícias já se mostrou infrutífera no Rio, lembra Samira.
"A intervenção federal no Rio, em 2018, é exemplo disso: colocaram o Exército para fazer GLO [Garantia da Lei e da Ordem], aumentaram o orçamento das polícias absurdamente. E não tem nenhum indicador que mostre que o aumento dos orçamentos melhorou a elucidação de crimes ou a sensação de segurança da população", completa.
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