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OPINIÃO

Análise: Para atacar Globo, Crivella copia campanha de Lula na TV em 1989

Campanha de Marcelo Crivella: parece novo, mas não é - Reprodução de vídeo
Campanha de Marcelo Crivella: parece novo, mas não é Imagem: Reprodução de vídeo

Matheus Pichonelli

Colunista do UOL

15/10/2020 10h52

Marcelo Crivella é candidato à reeleição no Rio com as bênçãos da Igreja Universal e do presidente Jair Bolsonaro, mas é em Luiz Inácio Lula da Silva que sua campanha parece ter se inspirado na propaganda eleitoral da TV.

Os centennialls podem não saber, mas muitos anos atrás, numa terra não muito distante, o então candidato do PT a presidente nas eleições de 1989 levou ao ar uma série de paródias inspiradas na Rede Globo, declarada inimiga pelo petista desde sempre.

A Rede Povo fez trocadilho com nomes, copiou a identidade visual dos programas e imitou descaradamente uma forma de fazer jornalismo.

Tinha o Povo de Ouro, versão dos musicais que iriam "tomar conta da campanha eleitoral", e tinha o Povo Repórter, que apresentava "um jornalismo do jeito que o povo gosta". "Você vai saber como os banqueiros ganham com a inflação e como o povo perde com a inflação", anunciava um apresentador com voz em off enquanto as câmeras percorriam as ruas para flagrar as dificuldades da população.

Na campanha, Lula fez cosplay até de repórter investigativo. Certa vez, alugou um avião de pequeno porte e foi até o interior do Tocantins mostrar estoques de arroz que o governo deixava apodrecer enquanto o povo passava fome. Até "passagem" —jargão jornalístico de quando o repórter aparece na cena, primeiro à distância, depois com a câmera mais próxima— o futuro presidente aprendeu a fazer.

Nem mesmo a abordagem dos seguranças armados da área escapavam do jornalismo verdade flagrado pelos cinegrafistas.

Mais de 30 anos depois, e em guerra declarada contra a mesma TV, Marcelo Crivella não pode sair às ruas por causa da pandemia, mas levou aos estúdios um cosplay descarado do "Bom Dia Rio" e escalou uma dupla de apresentadores para mostrar "o que essa emissora nunca mostrou".

Como se fosse notícia televisiva, os atores-apresentadores tentam desmentir notícias sobre o caos na saúde e fechamento de hospitais que, segundo eles, sempre funcionou.

Dos estúdios, eles convidam o entrevistado, no caso o próprio candidato, a dar sua versão dos fatos e despejar uma série de números e feitos à frente da prefeitura. "Nunca se fez tanto com tão pouco", diz Crivella na propaganda, como se descrevesse uma bolha praticamente impenetrável para qualquer vírus onde mais de 10 mil pessoas morreram e outras 100 mil pessoas se infectaram.

Isso o Crivella não mostra.

Como dizem por aí, não se pode dizer que o atual prefeito não trouxe para a campanha boas novas. O problema, como costuma repetir a galera do Foro de Teresina, podcast da Revista Piauí, é que as coisas boas não são novas. E as novas não são boas.