Há 30 anos, era impossível ver político jogando Street Fighter. Hoje, mudou
Não sei quantas pessoas cabiam naquelas arenas, mas duvido que Bill Clinton ou George H. Bush, os candidatos a presidente dos EUA em 1992, conseguissem levar tantos aficcionados em suas convenções como fazia Nintendo nas inúmeras competições de games no começo dos anos 1990.
Olha lá que oportunidade desperdiçada, pensei, ao assistir ao documentário "High Score", da Netflix, com meu filho e meu faro para os negócios e estratégias políticas. Como não sou empreendedor nem candidato, só pude pensar no faturamento da perua kombi de pamonha que passasse por aquela multidão na hora do almoço. Era sucesso garantido.
Em 2020, alguém teve uma ideia parecida ao ver que, passados 30 anos, os jovens e futuros eleitores ainda são os mesmos e vivem como seus pais quarentões. E que pouca coisa mobiliza mais corações e mentes de um adolescente do que games —seja em arenas lotadas ou em transmissões online que reúnem milhões (sim, milhões) de fãs.
Imagine soltar alguma declaração bem calibrada a esse povo todo, como falamos na minha terra. Dá para vender muita pamonha, não dá?
Sim. E dá para divulgar muita propaganda política também.
O vídeo da transmissão passou de 5,4 milhões de visualizações. Uma multidão que, em sua maioria, ainda precisa ser convencida a sair de casa, e das telas, para votar no futuro presidente dos EUA daqui a poucos dias.
Foi o que percebeu a deputada norte-americana Alexandria Ocasio-Cortez, que dias atrás se tornou a responsável por uma das lives mais assistidas da história da Twitch jogando Among Us, uma febre no mundo todo — e também um canal imenso para dialogar com diversas camadas da população, especialmente as mais jovens, como explicou o colunista do UOL Leo Bianchi.
Era para isso que ela estava lá.
Por aqui, dois candidatos a prefeito da maior cidade do país entraram no jogo. Literalmente.
Um deles foi o candidato do Patriota Arthur do Val, que tenta associar sua plataforma política ao seu canal no YouTube, Mamãe Falei, para deslanchar. No dia 25 de outubro, ele se juntou a outras personalidades, entre eles o apresentador Danilo Gentili, em uma maratona de mais de duas horas de Among Us. O vídeo chegou a 416 mil visualizações —uma média de 100 mil espectadores a mais do que os vídeos sobre política no canal, que tem 2,7 milhões de inscritos.
Na outra ponta do espectro político, Guilherme Boulos, do PSOL, já havia mandado um ao vivaço de Among Us com o canal Normose e convidados. A transmissão teve pouco mais de 52 mil visualizações, mas já é um começo.
Como o manejo das redes, a presença em plataformas do tipo não garante, claro, a conversão do engajamento em voto. Mas este voto está em disputa.
O presidente Jair Bolsonaro (sem partido) já manda piscadela a esse eleitorado quando anuncia corte de impostos para o setor e se apoia no filho mais jovem, Renan, para dialogar com este público.
Pois é. Não é só entretenimento. O aceno dá a chance de vender o peixe, ou a pamonha, com slogan eleitoral a um público que geralmente só começa a quebrar a letargia em relação à política na vida adulta. Talvez porque, quando jovem, ninguém fale com este futuro eleitor em sua linguagem.
No começo dos anos 1990, quando a febre eram as competições promovidas pela Nintendo em cidades de mercados estratégicos, tinha candidato a prefeito por aqui fazendo cosplay de clip da MTV usando a estrofe "do Sting o futuro prefeito é amigão". Tudo para supostamente atingir o público jovem, rebelde e descolado. O Serginho Mallandro com o boné para trás fazendo glu-glu era mais convincente.
A história política recente talvez fosse outra se algum candidato mostrasse em sua propaganda de TV que era capaz de dar Shoryuken sem olhar para o teclado. Para um jovem dos anos 1990, nada chamaria mais a atenção.
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