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PM diz ter alterado cena em Paraisópolis; analistas citam fraude processual

Tarcísio de Freitas (Republicanos) durante a agenda em Paraisópolis, na zona sul de São Paulo, instantes antes dos tiros - Stella Borges/UOL
Tarcísio de Freitas (Republicanos) durante a agenda em Paraisópolis, na zona sul de São Paulo, instantes antes dos tiros Imagem: Stella Borges/UOL

Do UOL, em São Paulo

26/10/2022 14h40

Um policial militar que participou do tiroteio em Paraisópolis, na zona sul da capital paulista, disse que adulterou a cena do crime alegando temer que objetos fossem retirados do local por outras pessoas. O episódio ocorreu no dia 17 deste mês durante uma agenda de campanha de Tarcísio de Freitas (Republicanos), candidato ao governo de São Paulo. Um suspeito morreu na ação.

Especialistas ouvidos pelo UOL Notícias dizem ver fraude processual no episódio. Questionada sobre o relato, a SSP (Secretaria de Segurança Pública) de São Paulo diz que investiga a possibilidade de alteração da cena do crime.. Em nota, o órgão apenas detalhou o andamento das investigações, que inclui depoimentos, imagens captadas no local e solicitação de perícia (leia mais abaixo).

Ontem, um áudio divulgado pelo jornal Folha de S.Paulo registrou o momento em que um integrante da equipe do ex-ministro da Infraestrutura do governo de Jair Bolsonaro (PL) mandou um cinegrafista da Jovem Pan apagar imagens da ação.

O que disse o policial militar. Em depoimento dado à Polícia Civil, um tenente da PM que teve o fuzil apreendido após participar do confronto em Paraisópolis confirmou ter alterado a cena do crime.

Ele disse ter recolhido cartuchos, estojos, carregador de pistola, coldre, um celular e um relógio do local, "afirmando que seria para que não fossem perdidos ou subtraídos por populares", segundo consta em boletim de ocorrência registrado do caso.

O policial militar disse ainda ter sido um dos primeiros a chegar no local, por volta das 9h45, para determinar o patrulhamento de viatura nas imediações do local onde ocorreria a agenda da campanha de Tarcísio. Em seguida, agentes à paisana ficaram no local.

Uma hora depois, os PMs registraram suspeitos em uma moto filmando a viatura descaracterizada usada por eles. Em seguida, os criminosos retornaram com outros homens armados, dando início ao confronto, de acordo com o depoimento dos policiais militares.

O que dizem os especialistas. Perito criminal aposentado da Polícia Civil do Distrito Federal, Cássio Thyone Almeida de Rosa disse ver fraude processual na ação do PM envolvido na ocorrência e questiona a justificativa dada por ele em depoimento.

"Essa alegação [de retirada de estojos e cartuchos para evitar subtração por parte de moradores] é uma forma de justificar adulteração da cena do crime. Mas, se há esse risco, o policial primeiro precisa justificar por que os seus procedimentos de preservação do local não foram realizados", argumenta o analista, que integra o Fórum Brasileiro de Segurança Pública.

Segundo ele, a ação do policial militar prejudica o trabalho da perícia.

É uma ação que não está nos protocolos e enfraquece o laudo de exame de local, uma vez que não vai ser possível traçar a dinâmica do que aconteceu ali. Vai ser feita apenas a análise de objetos desconectados da cena do crime"
Cássio Thyone, perito criminal aposentado

Professor na área de Segurança Pública na FGV (Fundação Getúlio Vargas), Rafael Alcadipani concorda com a avaliação.

"Essa ação pode configurar fraude processual porque é adulteração de cena de crime. Com a retirada dos estojos, o trabalho da perícia fica prejudicado. A prática correta é isolar o local de um homicídio até a chegada dos peritos."

O estojo pode indicar o local e o ângulo dos tiros. A alteração da cena do crime dificulta a investigação. Espero que a Polícia Civil tenha a liberdade para apurar a veracidade dos fatos"
Rafael Alcadipani, professor da FGV

O que diz a SSP-SP. Questionada, a SSP-SP (Secretaria de Segurança Pública de São Paulo) diz que o DHPP (Departamento Estadual de Homicídios e de Proteção à Pessoa), que investiga o caso, já ouviu testemunhas e solicitou exames periciais no local, no veículo e nas armas de fogo dos policiais militares envolvidos no confronto.

"Foram requisitadas as imagens das câmeras corporais de policiais militares que estavam na ocorrência, dos comércios da região, e também as imagens de profissionais de órgãos de imprensa que estavam cobrindo o evento (...). As investigações prosseguem dentro do prazo legal e com o acompanhamento do Ministério Público Estadual."

O que se sabe sobre o caso. Segundo a Polícia Civil, dois dos suspeitos passaram filmando o veículo blindado usado por PMs à paisana, que estavam em Paraisópolis para fazer a segurança do entorno durante a agenda de Tarcísio no local.

Os agentes perceberam que os homens na moto estavam com volume na cintura, semelhante a arma de fogo, e houve troca de tiros. Um suspeito foi morto. Segundo a polícia, havia cerca de 20 criminosos no local.

Os peritos apreenderam 88 estojos deflagrados de quatro calibres diferentes e ouviram o depoimento de cinco policiais militares que participaram da ocorrência.