Topo

Em debate com poucas propostas, Lula foca no passado e Bolsonaro, em ataque

Do UOL, em São Paulo, no Rio e em Brasília*

28/10/2022 23h53Atualizada em 29/10/2022 02h27

No último debate antes do segundo turno das eleições, os candidatos à Presidência da República Jair Bolsonaro (PL) e Luiz Inácio Lula da Silva (PT) acusaram um ao outro de mentiroso, subiram o tom das provocações e apresentaram poucas propostas para o futuro do país. O confronto aconteceu na noite desta sexta-feira (28), foi apresentado pelo jornalista William Bonner e transmitido pela TV Globo.

Foi o mais tenso dos debates desta eleição. Os dois presidenciáveis discutiram sem a intervenção de jornalistas. Lula destacou os feitos de seus governos (2003-2010) e Bolsonaro focou nos ataques ao adversário e a aliados do petista.

Pesquisa Datafolha divulgada na quinta-feira (27) mostrou Lula com 49% das intenções de voto e Bolsonaro com 44%. Outros 5% disseram que devem votar em branco ou nulo e 2% dos entrevistados não sabem em quem votar ou não responderam. O levantamento tem margem de erro de dois pontos percentuais.

O segundo turno está marcado para 30 de outubro.

O que você precisa saber sobre o debate:

  • Sem intervenção de jornalistas, foi um debate com poucas propostas, em que Lula falou principalmente sobre seus governos e Bolsonaro atacou o concorrente;
  • Bolsonaro tentou colocar a pecha de mentiroso em Lula; petista sugeriu reiteradamente que o adversário é inepto para o cargo;
  • Lula não caiu em pegadinhas estratégicas de Bolsonaro como no debate anterior, olhou diretamente para a câmera e manteve distância do concorrente;
  • O petista se perdeu ao provocar Bolsonaro sobre a pauta de costumes e o presidente deixou passar a oportunidade de falar para fora de sua bolha ao insistir em temas como armas e anticomunismo;
  • Bolsonaro se dirigiu diretamente a eleitores de Minas Gerais e do Nordeste, onde espera ampliar sua votação;
  • Após o confronto, em entrevista à jornalista Renata Lo Prete, o presidente disse, sem contestar, que vai respeitar o resultado das urnas. "Não há a menor dúvida. Quem tiver mais voto leva. É isso que é democracia."

O que os candidatos disseram:

Parece que o meu adversário está descompensado. Porque ele é um samba de uma nota só."
Lula

Lula, você dizer que foi absolvido? Só se foi pelo Bonner, se ele vai repetir aqui que você foi absolvido."
Bolsonaro

Como jornalista, eu não digo coisas da minha cabeça. Eu disse isso baseado em decisões fundamentadas do Supremo Tribunal Federal."
William Bonner

No meu governo, o PIB crescia em média 4%; no dele, cresce 1%. Ou seja, é uma vergonha. É simplesmente uma vergonha."
Lula

Muito obrigado, meu Deus. E se essa for a sua vontade, estarei pronto para cumprir com mais um mandato de deputado federal. Presidente da República. Deixar bem claro."
Bolsonaro

Leia mais frases de Lula
Leia mais frases de Bolsonaro

Como foi o debate:

Mentiroso x inepto. No primeiro bloco, Bolsonaro citou propaganda eleitoral de Lula que faz referência a um suposto plano de Paulo Guedes, revelado pela Folha de S.Paulo, em que o ministro da Economia previa apresentar, após as eleições, a sugestão de reajustar salário mínimo e aposentadoria sem correção pela inflação. Bolsonaro chamou o concorrente de mentiroso.

Como resposta, Lula disse que não assistia aos programas eleitorais pela TV pois estava nas ruas, em campanha. E tentou imprimir a imagem do presidente como inepto.

"Ele tem que explicar por que ele não aumentou o mínimo, ele tem que explicar por que não aumentou a merenda escolar, ele tem que explicar por que ele isolou o Brasil do mundo", disse Lula.

"Você continua afirmando que vou acabar com o 13º, com a hora extra e também com as férias? Responda à pergunta", pressionou o presidente.

Estratégias de debate. Diferentemente do debate do UOL, em parceria com a Band, Lula tentou driblar estratégias adotadas por Bolsonaro. Ao longo dos blocos, conseguiu administrar o tempo e sempre dar a palavra final. No primeiro confronto com o presidente após o primeiro turno, o petista se perdeu e Bolsonaro falou por quase seis minutos sem interrupções.

Lula também evitou ficar próximo a Bolsonaro. No debate anterior, Bolsonaro, que é maior que o petista, chegou a tocar no concorrente —o que deixou Lula desestabilizado.

Na Globo, foi acordado que contato físico seguia proibido —mas, mais baixo, Lula preferiu manter distância do adversário.

"Fica aqui, rapaz", disse Bolsonaro ao final do primeiro bloco, em um movimento parecido ao debate anterior.

"Eu não quero ficar perto de você", respondeu o petista, de longe, com o dedo em riste.

Trocando a pauta. Marcas de Bolsonaro, as pautas de costumes foram puxadas por Lula desta vez. Em um bloco com tema específico sobre "respeito à Constituição", o petista relembrou um discurso do presidente que citava "pílulas do aborto", em 1992.

"Falou isso ou não?", questionou Lula.

"Você é abortista. Pegou matéria de 30 anos atrás, nem lembro mais do que se tratava 30 anos atrás. Pega discurso da Câmara, já que é discurso, pega a fita e mostra. Lula, assuma que você é abortista, Lula, que não tem qualquer respeito com a vida humana", respondeu Bolsonaro.

Reportagem do UOL mostrou que o presidente conseguiu forçar seu adversário a debater pautas de costume na campanha do segundo turno e deixou de lado a economia.

No debate, entretanto, Lula se perdeu ao puxar o assunto e depois mudou o tema.

Direito de resposta até para Bonner. Antes de encerrar o primeiro bloco, Bonner pediu para fazer um esclarecimento por ter sido citado por Bolsonaro.

"Lula, você dizer que foi absolvido? Só se foi pelo Bonner. Se ele vai repetir aqui que você foi absolvido, acho que o Bonner vai ser indicado para um possível e hipotético governo teu para ser ministro do Supremo Tribunal Federal", disse o presidente.

Em resposta, Bonner confirmou que na sabatina de Lula ao Jornal Nacional informou que o petista não devia nada à Justiça. "Mas, como jornalista, eu não digo coisas da minha cabeça. Eu disse isso baseado em decisões fundamentadas do Supremo Tribunal Federal", disse.

Auxiliares do presidente que acompanharam o debate da TV Globo reagiram com indignação ao fato de Bonner ter respondido às falas de Bolsonaro. Alguns deles reclamaram que o apresentador não deveria "ter direito de resposta".

No ano passado, o STF considerou que o então juiz Sergio Moro (União Brasil) foi parcial e os processos de Lula foram anulados. Moro foi ministro da Justiça do governo Bolsonaro, pediu demissão e acusou Bolsonaro de interferir na Polícia Federal. Agora, os dois reataram e Moro estava na Globo como um dos conselheiros do presidente.

Mais direitos. Ainda no primeiro bloco, o ex-presidente recebeu um direito de resposta e usou o tempo para criticar seu adversário. "Imaginei que a gente poderia debater os temas de interesse nacional", disse Lula.

No segundo bloco, o petista pediu nove direitos de resposta e recebeu apenas um. Já Bolsonaro pediu um e não conseguiu.

Em uma das respostas, Lula evitou citar o nome de Bolsonaro, enquanto o chamava de mentiroso, para não deixar aberta a possibilidade de o adversário ter direito de rebater.

Eu vou dizer que aqui só tem um mentiroso chamado... Não vou dizer o nome para ele não ter direito de resposta."
Lula

Provocação. Enquanto falavam sobre combate à pobreza, Lula apontou para a área de convidados de Bolsonaro dentro do estúdio e disse, em tom de ironia: "Estão falando para você repetir, repete".

No último debate, as instruções do vereador carioca Carlos Bolsonaro (PL-RJ), segundo filho do presidente, no estúdio, chamaram a atenção dos presentes e ajudaram Bolsonaro. As dicas eram principalmente voltadas à postura do pai no palco. Desta vez, Carlos não foi ao debate.

Pós-debate. Após o debate da Rede Globo, em entrevista à Lo Prete, Bolsonaro disse que irá aceitar a vitória de quem "tiver mais votos". Desde a eleição de 2018, da qual saiu vitorioso no segundo turno, o presidente tem lançado suspeitas infundadas o sistema eleitoral brasileiro e a confiabilidade do voto eletrônico.

Não há a menor dúvida. Quem tiver mais voto leva. É isso que é democracia."
Jair Bolsonaro

Depois, o presidente falou com outros jornalistas —e se mostrou muito irritado. Reclamou quando um repórter da Folha de S.Paulo informou que toda a imprensa carioca sabe que o organizador da visita de Lula ao Complexo do Alemão é um comunicador conhecido e sem envolvimento com o tráfico —como o presidente sugere. Disse para uma assessora que ele próprio é presidente e não candidato. E, a um repórter português, respondeu que não entendeu a pergunta porque não fala "portunhol".

Lula não falou com a imprensa após o debate. Ele enviou o candidato a vice, Geraldo Alckmin (PSB), que acabou fazendo um pronunciamento.

*Participaram desta cobertura:

Em São Paulo: Ana Paula Bimbati, Gilvan Marques, Isabella Cavalcante, Rafael Neves e Wanderley Preite Sobrinho
No Rio: Carla Araújo, Felipe Pereira, Lola Ferreira e Lucas Borges Teixeira
Em Brasília: Camila Turtelli, Gabriela Vinhal e Hanrrikson Andrade