Relações entre Brasil e EUA não vão mudar após eleições americanas, dizem especialistas
Mitt Romney ou Barack Obama? Ainda que a maioria dos brasileiros, segundo uma pesquisa encomendada pela BBC, torça pela vitória do presidente americano, os resultados das eleições de 6 de novembro pouco influenciarão as relações entre os Estados Unidos e o Brasil. Nem mesmo se o candidato republicano sair vitorioso. É o que apontam os especialistas ouvidos pelo UOL.
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"A América Latina e o Brasil não são e nunca foram a principal preocupação dos Estados Unidos, apesar da proximidade e da importância econômica", explica Marcelo Zorovich, professor do curso de relações internacionais da ESPM (Escola Superior de Propaganda e Marketing). A agenda americana, segundo ele, está majoritariamente concentrada na crise econômica interna e no Oriente Médio.
E para justificar essa afirmação, ele cita a estruturação do próprio governo Obama. "Quando o democrata chegou ao poder [em 2009], a primeira providência foi se cercar de especialistas no Oriente Médio. Em contrapartida, a América Latina demorou meses para ganhar seu secretário específico no governo". Zorovich, no entanto, reconhece que os problemas das regiões são diferentes e merecem prioridades distintas.
E as prioridades do próximo governo ficaram bem evidentes nos discursos de ambos os candidatos e, principalmente, no terceiro e último debate presidencial, realizado no dia 22 de outubro, na Lynn University, em Boca Raton, no Estado da Flórida. O confronto dedicado à política externa se resumiu, basicamente, às relações dos Estados Unidos com o Iraque, Irã, Israel, Síria, Rússia e China. A América Latina foi citada por Romney uma única vez, mas de forma bem superficial. Na ocasião, ele defendeu a ampliação das relações comerciais com a região, cuja "economia é quase tão grande quanto a da China".
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Mas, a "suposta" preocupação de Romney com a região, segundo Ariel Finguerut, doutorando em ciência política na Unicamp (Universidade Estadual de Campinas), não passa de retórica e discurso. "O republicano, assim como o democrata, não tem nenhum projeto claro e detalhado dedicado à América Latina ou ao Brasil", relata. Já para Zorovich, a citação no debate foi estratégica. "Uma tentativa de atrair o eleitorado hispânico, que tem cada vez mais ganhado relevância nas eleições americanas."
Conforme dados divulgados pelo próprio governo americano, a comunidade hispânica nos EUA ultrapassou a marca dos 50 milhões em 2010, o que representa 16,3% da população. E foi essa mesma comunidade que ajudou Obama a vencer as eleições de 2008, quando ele recebeu 68% dos votos dos latinos. Neste ano, 23,7 milhões de latinos já se registraram para votar. O número é cerca de 4,2 milhões a mais do que no pleito passado.
Eleições 2012 nos EUA
$escape.getHash()uolbr_tagAlbumEmbed('tagalbum','55362', '')Relações atuais com o Brasil
Ainda assim, na prática, as relações entre o país e a América Latina têm sido "mornas", conforme avalia Finguerut. E as parcerias com o Brasil, por exemplo, não tiveram "nenhum avanço, mas também nenhum retrocesso", durante os quatro anos do governo Obama. "O grande problema é que a vitória do democrata, em 2008, esteve bastante atrelada ao desejo de mudança, não só do eleitorado, mas também do mundo. E, portanto, os resultados não corresponderam às expectativas e geraram decepção."
A expectativa brasileira, segundo o doutorando da Unicamp, estava atrelada aos avanços dos acordos bilaterais relacionados aos biocombustíveis, ao fim das sanções e do isolamento de Cuba e do incremento da própria balança comercial. "Nada disso, no entanto, avançou da maneira esperada", relata ele, que também acrescenta o fim da exigência de visto para brasileiros e o apoio por um assento na ONU (Organização das Nações Unidas) como temas de interesses políticos pendentes.
Mas, apesar de o professor da ESPM também reconhecer que Obama tenha feito pouco para alavancar a parceria entre Estados Unidos e Brasil, o especialista destaca avanços nos acordos, entre eles, o dedicado à educação. "Esse acordo já levou 9.000 brasileiros a estudarem nos Estados Unidos com bolsas de estudos e já trouxe 3.000 americanos paras as universidades do Brasil", cita ele, que acrescenta ainda os avanços comercial entre os países. "Atualmente, a cada US$ 2 que o Estados Unidos investem no Brasil, o país investe US$ 1 no território norte-americano".
E mesmo que a gestão de Obama não tenha viabilizado o fim do visto obrigatório para brasileiros, proporcionou avanços significativos. "Investiu no aumento de funcionários nos consulados e na embaixada brasileira para agilizar e facilitar o processo de emissão do documento. Isso mostra o quanto o turismo brasileiro é importante para os EUA", diz Zorovick.
Em uma recente visita aos Estados Unidos, o ministro das Relações Exteriores, Antonio Patriota, chegou a dizer que uma eventual extinção da exigência de vistos para viagens entre o Brasil e os Estados Unidos não irá acontecer no curto prazo. Segundo ele, o assunto exige uma "série de aspectos que precisam ser muito bem examinados, inclusive o desequilíbrio grande entre o número de brasileiros que visitam os Estados Unidos e o número menor de americanos que visitam o Brasil".
A maioria dos brasileiros, no entanto, preferem a reeleição do presidente americano à chegada do ex-governador de Massachusetts à Presidência dos Estados Unidos. Enquanto 65% torcem por Obama, apenas 9% dos entrevistados disseram preferir Romney, segundo uma pesquisa internacional feita à pedido da BBC. Os demais declararam não ter nenhuma preferência.
O democrata é o preferido da maioria dos brasileiros devido à política internacional mais pacifista, segundo Fabián Echegaray, diretor da Market Analysis --empresa responsável pela pesquisa no Brasil. Para Finguerut, no entanto, a preferência também está vinculada à visibilidade dos candidatos. "Obama é o presidente e Romney é apenas um governador. Portanto, muitos brasileiros desconhecem o republicano." Já o professor da ESPM cita a questão da credibilidade: "Obama passa mais credibilidade do que o republicano que tem mudado constantemente seus discursos."
O futuro
A perspectiva é que as políticas externas americanas dos últimos anos se estendam na próxima gestão, independente do resultado das eleições. "O presidente dedicou grande parte de seu governo para resolver uma crise econômica e duas grandes guerras. E vale ressaltar que crises e guerras não são resolvidas de uma hora para outra, ou seja, esses temas continuarão consumindo o próximo governo", aponta Finguerut.
Jornais Internacionais
"Em um curto prazo, nada será alterado. Os acordos tanto comerciais quanto bilaterais já estabelecidos serão mantidos pelo menos pelos próximos dois anos", afirma Alcides Costa Vaz, professor de relações internacionais da UnB (Universidade de Brasília). As mudanças, segundo ele, só serão viáveis caso o republicano adote uma política mais intervencionista ou com um viés mais unilateralista. "Mas, não há indício nenhum de que siga esse caminho."
Segundo Finguerut, professor da ESPM, os ideais republicanos e democratas, pelo menos no que diz respeito à política externa, são muitos semelhantes. "O que muda, em geral, é a retórica. Enquanto os republicanos adotam uma postura mais agressiva, os democratas são mais paternalistas. Mas os interesses são sempre os mesmos", explica ele.
A possível vitória de Obama, em contrapartida, traria mais força para as negociações relacionadas aos biocombustíveis. "Neste campo, o democrata tem demonstrado muito mais interesse do que o seu adversário", cita Finguerut. Na opinião de Zorovick, da Unicamp, Obama está mais bem preparado para lidar com os desafios da política externa americana de uma maneira geral. "As gafes constantes de Romney, entre elas a citação de que a Rússia é o maior inimigo dos Estados Unidos, evidenciam o despreparo do candidato", conclui.
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