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Guerra da Rússia-Ucrânia

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'Açougueiro da Síria': quem é o novo comandante russo na Ucrânia

General Alexander Dvornikov recebeu uma condecoração do presidente russo Vladimir Putin por atuação na Síria em 2016 - Reprodução da internet
General Alexander Dvornikov recebeu uma condecoração do presidente russo Vladimir Putin por atuação na Síria em 2016 Imagem: Reprodução da internet

Herculano Barreto Filho

Do UOL, em São Paulo

11/04/2022 04h00

O general russo Alexander Dvornikov, nomeado neste sábado (9) como novo comandante das operações na guerra da Ucrânia, ficou conhecido como "o açougueiro da Síria" devido à reputação de brutalidade contra civis entre 2015 e 2016. As ações contaram com bombardeios em áreas residenciais na intervenção autorizada por Vladimir Putin em apoio ao regime do ditador Bashar al-Assad contra rebeldes, milícias e organizações terroristas.

Em 2016, o oficial que agora passa a ficar à frente de todas as operações militares das tropas invasoras em território ucraniano recebeu do próprio Putin a medalha de herói da Federação Russa, uma das maiores condecorações no país. Especialistas ouvidos pelo UOL analisam o que pode mudar com a presença de Dvornikov no conflito.

Com cerca de 10 mil bombardeios em ataques aéreos concentrados na cidade de Alepo, as forças russas cumpriram a missão de destruir a infraestrutura local, também atingindo áreas residenciais ocupadas por civis.

Na Ucrânia, a guerra vive um momento de agravamento de ações, especialmente na cidade de Bucha, com registro de ao menos 20 corpos em trajes civis.

"Matem todos!", gritou um homem em áudio atribuído a um comandante russo pelo serviço de inteligência alemã com suposta ordem para abater civis —os russos negam. Nesta sexta-feira (8), a Procuradora-Geral ucraniana disse que 164 cadáveres foram encontrados no subúrbio da cidade.

"Vimos a face cruel do exército de Putin. A humanidade está devastada e o mundo inteiro chora com o povo de Bucha", disse Ursula von der Leyen, presidente da Comissão Europeia, em homenagem aos mortos em uma vala comum.

'População no meio do fogo cruzado'

Especialistas entendem que a presença do general Alexander Dvornikov à frente das tropas russas poderá intensificar o conflito, e traçam um paralelo com a sua atuação na Síria.

"É a escola clássica militar russa, com uso do poder de fogo desmedido para quebrar a resistência do inimigo. Na prática, vão intensificar os ataques às infraestruturas de transporte para bloquear possíveis rotas de reforço de homens e equipamento. Mas a população vai ser pega no meio do fogo cruzado. Infelizmente", avalia o professor Sandro Teixeira Moita, Doutor em Ciências Militares.

Ele projeta ainda o emprego de ações em áreas residenciais. "Na visão russa, um dos princípios é quebrar a moral do oponente com baixas, destruição e fuga em massa, sobrecarregando o governo ucraniano", prevê. Contudo, Teixeira vê exagero no apelido dado ao oficial.

Ele é um comandante russo típico, muito duro e com a mão pesada. Mas não acho apropriado o apelido de 'açougueiro'. Ele acabou respondendo por ações da própria Síria, que usou bombas de barril, com explosivos com metal para ferir com gravidade ou matar"
Sandro Teixeira Moita, Doutor em Ciências Militares

"[Dvornikov] é um general experimentado em combate em todas as principais operações russas nos últimos 20 anos. Na Síria, criou uma máquina pequena, mas extremamente eficaz e brutal. Os ucranianos têm motivos para ficar preocupados", complementa.

'Na Síria, não havia preocupação em evitar mortes'

O geógrafo e cientista político Tito Barcellos Pereira, que participa de grupos de estudos sobre geopolítica e forças armadas no mundo, acredita que ele era chamado de "açougueiro da Síria" devido aos ataques em áreas civis.

"Na Síria, as tropas russas tinham mais liberdade de engajamento e menos restrições para uso de armamento. Os russos usavam armamentos inteligentes, como mísseis e bombas guiadas com manobras que atingiam o alvo. Mas também usavam as chamadas 'bombas burras', que são mais convencionais. E, como voavam alto, a destruição atingia o quartel inimigo, mas também toda a infraestrutura civil ao redor", analisa.

Segundo ele, esses ataques eram mais comuns na Síria. "Não havia muita preocupação em evitar a morte de civis. Se o alvo estava ali, era destruído. E o resto era tratado como 'efeito colateral'", observa.

Interlocução entre Putin e as tropas

Tito Barcellos Pereira destaca o fato de a Rússia ter nomeado um comandante da operação na Ucrânia —segundo ele, cargo inédito nas tropas russas, até então compostas por unidades independentes.

"O que mais chama a atenção é a criação de um cargo que não existia. Provavelmente, para que os russos possam resolver problemas de comando com um general à frente de todas as operações militares em território ucraniano, envolvendo Marinha, Exército, Forças Aeroespaciais, Guarda Nacional, Forças Aerotransportadas e Defesa Aérea", enumera.

Agora, a Rússia passa a contar com uma figura intermediária entre os comandantes no campo de batalha e o governo do presidente Vladimir Putin"
Tito Barcellos, geógrafo e cientista político

Segundo ele, a independência de ação das diferentes tropas até então causava problemas estratégicos.

"Sem um responsável pela operação, há muitos generais no comando. A impressão é de que havia dois distritos militares conduzindo guerras paralelas sem a coordenação de suas ações e com falta de comunicação entre os oficiais. Com isso, as tropas sofreram com problemas de logística, porque o fluxo de informações fica muito lento", critica.