Paga com pastel ou maços de dólares, extorsão é rotina no Equador
No Equador, a extorsão é para todos: do grande empresário ao pequeno ambulante. Ninguém escapa da ameaça de violência e nem de ter de pagar para não morrer.
O que aconteceu
Agustín Pacheco vende pastel na saída de um terminal de ônibus na periferia de Guayaquil. Quando ele se mudou para o bairro, o local servia como lixão. Acostumado a ter somente o essencial para vestir e comer durante seus 57 anos de existência, o ambulante jamais pensou possuir renda ou patrimônio de sobra.
No ano passado, a vida o surpreendeu... e para o mal: foi extorquido. O papo foi direto: "Plata o plomo" [dinheiro ou chumbo].
Ele deveria pagar aos criminosos US$ 5. Ou, na sua visão, metade do faturamento de um dia bom.
Dono de lábia aguçada, ele deu a volta nos criminosos. Justificou que vende cada pastel a US$ 0,50. Os doces custam ainda menos. Acrescentou que não há empregos no Equador, principalmente para um cadeirante, e que um ambulante tem muita concorrência.
Até os cachorros entraram no meio. Disse que os três são temperamentais e, às vezes, rosnam e mostram os dentes para os clientes, que desistem da compra. Mas não há como ficar sem Cholo, Ruffo e Tachito. O trio é proteção contra moleques que passam correndo e levam os produtos sem pagar.
Ele ainda se declarou afeiçoado aos cachorros. "São as companhias mais amorosas que eu poderia ter", justificou, na conversa para não entregar o valor exigido.
O combinado foi pagar a extorsão em pastel mesmo. De tempos em tempos, os criminosos passam pelo local e saem da barraca mastigando. O ambulante diz crer que só teve sucesso na negociação porque eram "ladrões de galinha".
Mortes para 'dar exemplo'
Agustín diz que todos os ambulantes de Durán passam pela mesma situação. O município historicamente era uma cidade-dormitório para a mão de obra de Guayaquil. Agora é conhecido por tráfico, extorsão e assassinatos.
Chuchuro e seus quatro filhos faziam transporte alternativo numa espécie de tuk-tuk com cabine dupla, que é característica da região. Até seis passageiros se amontoam por veículo, que tem motor de moto e potência insuficiente para tanto peso, tornando-se uma gambiarra motorizada e produtora de congestionamento.
Numa noite do ano passado, a família serviu de exemplo por não pagar a "taxa". Os traficantes mataram Chuchuro, os filhos e ainda sobrou para dois passageiros que nada tinham a ver com a história. Apareceram duas motos e uma caminhonete vermelha. Os bandidos sacaram as armas, abriram fogo contra o tuk-tuk e fugiram.
Cobrança vai do tostão ao milhão
Empresário no Equador não gosta de dizer o nome nem de pagar extorsão. A um exportador de bananas pediram US$ 30 mil (ou R$ 74 mil). Ele tentou negociar. Os criminosos aceitaram conversar, mas fizeram uma demonstração de força.
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Quero receberColocaram placas na entrada da fazenda avisando que o funcionário que entrasse para trabalhar seria morto. Os empregados e os bandidos moram na mesma cidade de La Puntilla, onde também fica a propriedade. Ninguém ousou desobedecer à ordem.
As negociações levaram seis semanas, tempo de a plantação não receber os cuidados necessários e estragar inteira.
Após o prejuízo, ficou acertado o pagamento de US$ 15 mil em dinheiro vivo. O empresário pagou, mas não teve nem um mês de sossego.
Um novo pedido de US$ 15 mil foi feito. Não houve margem para negociação e se repetiu a proibição da entrada na fazenda.
Novos maços de notas de cem dólares foram enviados para os criminosos. Um novo aviso foi dado: de agora em diante, a mesma quantia deveria ser entregue a cada três meses.
A 'diplomacia da extorsão'
A revolta diante da extorsão é a mesma para pobres e ricos. Mas o crime age diferente a depender da classe social. Agustín teve a visita dos próprios bandidos. Eles são seus vizinhos, sabem onde o ambulante mora e conhecem suas fragilidades. Os criminosos deixaram claro na conversa que um cadeirante não conseguiria fugir deles.
Já o empresário milionário não vê a cara dos homens que pedem dinheiro. Motos chegam à administração da fazenda e repassam o recado ao capataz. Avisam que retornarão depois para receber a resposta.
As propostas e contrapropostas são apresentadas por terceiros. É como se cada parte enviasse seus "embaixadores" para a mesa de discussão.
Como acontece na diplomacia, o lado mais forte costuma impor sua vontade. O máximo que se pode conseguir são algumas concessões. O empresário conseguiu negociar para pagar metade da pedida inicial.
Estrada tem 'pedágio'
Sem combustível, um motorista para em um posto na cidade de Quevedo. Logo é informado de que precisa pagar uma taxa para "garantir a segurança da clientela". Na sequência, a ameaça se torna menos velada.
Os criminosos avisam que os quatro carros no posto já pagaram e vão seguir em paz. Na mesma hora, a carteira do motorista se abre. As economias da quadrilha ficam US$ 5 maiores. O motorista quis não dizer seu nome. Quevedo está a 175 km de distância, mas ela ainda sente medo.
A extorsão está incluída até no preço do frete. Um caminhoneiro conta que o patrão dá dinheiro para a gasolina, a comida e a "caixinha" dos criminosos.
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