'Mãe, quero morrer': menina perde cabelo em meio a trauma da guerra em Gaza

O relato de uma menina palestina de 8 anos, que pede para morrer em meio à guerra em Gaza, exemplifica como uma geração inteira foi traumatizada pelo conflito, segundo organizações humanitárias internacionais.

'Mamãe, quero morrer'

Médicos do campo de refugiados de Khan Younis - onde ela e a mãe, Om-Mohammed, estão abrigadas - a diagnosticaram com um tipo de "choque nervoso" após um episódio traumático. Ela viu a casa de seu vizinho em Rafah ser atingida por um ataque aéreo israelense em agosto. A desestruturação de sua rotina desde o início do conflito também é um agravante.

Desde então, outras crianças começaram a zombar de sua falta de cabelo e ela deixou de brincar ao ar livre. À CNN, a pequena Sama Tubail contou, em lágrimas, como é sua vida após perder quase todo o seu cabelo.

Estou triste. Não há mais um fio de cabelo para eu pentear com a minha escova. Seguro o espelho porque quero pentear meu cabelo, eu quero tanto pentear meu cabelo de novo. Eu lembro como eu costumava escovar meu cabelo, como eu fazia tranças, como eu penteava. Eu penteava muito meu cabelo. Quando eu penteio o cabelo da minha boneca, me lembra como era pentear meu próprio cabelo.

Me chamam de 'menina careca' ou 'paciente com câncer'. Me perguntam por que eu uso este lenço, então eu parei de brincar lá fora e agora só brinco com as minhas irmãs. Eu pergunto pra minha mãe se eu vou ficar assim careca pro resto da minha vida? Não quero. Quero morrer e ter meu cabelo crescendo de novo no paraíso, se Deus permitir.
Sama Tubail

Sama não está sozinha, cerca de metade das crianças palestinas já expressou a vontade de morrer. A conclusão é de um relatório do fim de 2024 da organização de direitos infantis War Child Alliance e do Centro Treinamento Comunitário para Gestão de Crises em Gaza. Eles realizaram uma pesquisa com mais de 500 cuidadores de crianças vulneráveis; eles revelaram que 96% delas sentem que a morte é iminente e 49% já disseram querer morrer após os ataques.

Sama Tubail em foto anterior ao início da guerra, em outubro de 2023
Sama Tubail em foto anterior ao início da guerra, em outubro de 2023 Imagem: Acervo Pessoal/Família Tubail

Gaza tem o maior número de crianças amputadas per capita do mundo. Cerca de 25 mil foram feridas desde o início da guerra e 17 mil foram separadas dos pais ou ficaram órfãs. Mais de um milhão se tornaram refugiadas, segundo dados do Unicef (Fundo das Nações Unidas para a Infância) apresentados em janeiro pelo representante da França na ONU, Nicolas de Rivière, ao Conselho de Segurança.

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Condições de sobrevivência não estão garantidas após escapar de bombardeio. Aziza Alshabrawy, refugiada em um campo da cidade de Gaza no estádio Yarmouk, afirmou à rede Al Jazeera hoje que as crianças no local passam fome, frio e estão constantemente com medo. "Temos tentado chamar a atenção do mundo inteiro para nos ajudar, trazer o nosso sofrimento ao fim", implorou.

Criança palestina recebe cuidados no European Hospital, em Rafah, na Faixa de Gaza, depois de ter a perna amputada após um bombardeio
Criança palestina recebe cuidados no European Hospital, em Rafah, na Faixa de Gaza, depois de ter a perna amputada após um bombardeio Imagem: ARAFAT BARBAKH - 28.dez.2023/REUTERS

Até outubro de 2024, mais de 14 mil crianças já haviam morrido em Gaza após um ano de guerra, segundo o Unicef. O Ministério da Saúde de Gaza estima que 200 crianças sejam vítimas fatais dos bombardeios de Israel nos últimos três dias, desde que o cessar-fogo chegou ao fim.

335 mil crianças menores de cinco anos estão em alto risco de desnutrição. Doenças transmissíveis por água contaminada, como diarreia, além de hepatite A e poliomielite crescem em Gaza. O poliovírus tipo 2 (cVDPV2) foi detectado em Gaza pela primeira vez após 25 anos em julho.

Impacto emocional é subestimado

O menino Anas Abu Eish, de 7 anos, estava brincando com uma bola quando encontrou "papai e mamãe jogados na rua". "Um drone veio e explodiu sobre eles", relembrou ainda à CNN. Ele e sua irmã, Doa, de 8 anos, vivem com a avó Om-Alabed em um campo de al-Mawasi, também em Khan Younis.

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Manal Jouda, de 6 anos, lembra da noite em que seus pais morreram e ela ficou soterrada na sua casa após um ataque.

Havia areia na minha boca, eu gritava, eles cavaram com uma pá, nosso vizinho dizia 'essa é a Manal, essa é a Manal'. Eu estava acordada, meus olhos estavam abertos sob os escombros, minha boca estava aberta e a areia entrava nela.
Manal Jouda

1,2 milhão de crianças em Gaza precisam de atendimento psicológico, apontou o Unicef em um relatório em junho. Em janeiro, o subsecretário-geral da ONU para assuntos humanitários, Tom Fletcher, declarou ao Conselho de Segurança que "uma geração foi traumatizada". "Crianças foram mortas, passaram fome e morreram de frio. Algumas morreram antes mesmo de dar seu primeiro suspiro, perecendo junto com suas mães durante o parto", apontou.

11 comentários

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Robert Graf

E o senhor da guerra, Natanhyau, diz estar combatendo apenas o Hamas. Com o apoio entusiasmado de Trump, que quer criar um Ressort de luxo sobre os cadáveres, não cessará o morticínio  enquanto restar palestino vivo na Faixa de Gaza e Cisjordânia. 

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Alexandre Multini

Como os países ricos árabes sunitas deixam isso acontecer? Eles deveriam pressionar os EUA para que acabasse essa guerra! Israel vai matar todos de Gaza e tomar o território, isso é claro. 

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Mario Gandra Perelman

NÃO CONSEGUI ACABAR DE LER O ARTIGO.LÁGRIMAS DESCEM PELO MEU ROSTO.É DIFÍCIL  ACREDITAR QUE UM MONSTRO NETANIYAU POSSA CONTINUAR A VIVER E A MASSACRAR  CRIANÇAS.DEUS, ACABE COM ESTE SOFRIMENTO DESTA S POBRE CRIATURAS

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