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Estudo aponta impacto do desmatamento na Amazônia em chuva e safra de grãos

Thiago Sanna Freire Silva/ Agência Fapesp
Imagem: Thiago Sanna Freire Silva/ Agência Fapesp

Daniel Leite

Colaboração para o UOL, em Juiz de Fora (MG)

30/07/2019 04h00

A diferença de uma semana no ciclo de chuvas pode significar mais produtividade ou a perda de uma safra inteira para agricultores no sul da Amazônia.

Com essa preocupação, pesquisadores mineiros realizaram um estudo reunindo dados de quase quatro décadas para verificar a relação entre desmatamento e ciclo de chuvas, com reflexos diretos na produção de algumas das principais commodities do agronegócio brasileiro.

O estudo, que levou cinco anos, foi publicado no Journal of Geophysical Research após passar pelo crivo de especialistas de outros países, mantidos sob anonimato. A Nature Climate Change, uma das revistas científicas mais importantes do mundo na área, também divulgou a pesquisa.

A principal conclusão é que um desmatamento de 50% a 60% da área florestal faz com que as chuvas se atrasem em pelo menos uma semana.

Esse adiamento é de grande relevância para a agricultura, em especial onde há o cultivo de duas safras --como é o caso da soja e do milho.

No sul amazônico, é habitual que as chuvas comecem mais tarde por uma questão de localização geográfica. Com o corte indiscriminado da vegetação, a situação fica mais crítica.

Para considerar o início da estação chuvosa, foi medida precipitação de pelo menos 20 mm num dia e a mesma quantidade em, no máximo, uma semana.

Estudo analisou dados desde 1974

As informações utilizadas no levantamento da Universidade Federal de Viçosa (MG) compreendem o período entre 1974, mais antigo com dados precisos de precipitações, e 2012, o último com informações do Censo Agropecuário disponíveis quando teve início a pesquisa, em 2015.

Eles cruzaram duas séries históricas: a do Censo do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) sobre desmatamento e a do volume de chuvas medido nesses 38 anos.

Em torno de cada ponto de medição pluviométrica, os cientistas fizeram grandes círculos, com raios entre 20 km e 30 km, chamados de "buffers". A partir disso, calcularam o percentual de desmatamento em cada "buffer" e relacionaram com as chuvas registradas naquela estação para concluírem que o adiamento das precipitações está diretamente ligado à falta de proteção ambiental.

Amazonia - Bruno Kelly/Reuters - Bruno Kelly/Reuters
Imagem: Bruno Kelly/Reuters

Um dos motivos para a escolha do sul da Amazônia como objeto do estudo foi o fato de a região ter tido desmatamentos e ocupação desordenados, com pastagens e agricultura, em especial nas décadas de 1970 e 1980.

O corte de vegetação em até 60% da área estudada representa atraso de até sete dias para o início das chuvas, causando um efeito em cascata. "Não é só atraso de uma semana. Esse atraso se soma ao déficit que essa região já possui para o início das chuvas", explica o responsável pela pesquisa, Argemiro Teixeira Filho.

Para ser viável a dupla safra de soja e milho nessa área, é necessário garantir a colheita da primeira a tempo de a segunda amadurecer na época ideal do clima, evitando prejuízos.

"O início da estação chuvosa é que define o calendário agrícola da região. O produtor só vai plantar depois que ele tiver um cenário seguro do período chuvoso", diz o pesquisador.

Mas, com as chuvas começando com atraso --por causa do desmatamento, de acordo com a pesquisa--, a produção desses dois cultivos em um mesmo ano é diretamente afetada, reduzindo a rentabilidade da agricultura.

"Entre uma safra e outra, o produtor precisa tirar alguns dias para colher. Se ele já perde uma semana no início, depois uma semana para colher, fica inviável cultivar milho e soja na mesma estação."

Até mesmo onde há apenas um tipo de plantação, a seca mais prolongada devido ao desmatamento causa impactos na produtividade.

O responsável pela pesquisa diz que o apanhado histórico faz uma previsão pessimista para o futuro considerando a forma com que o atual governo está encarando a relação entre desenvolvimento e proteção ambiental.

"Essa crença de que manter a floresta de pé está atrasando o desenvolvimento do Brasil não é baseada em fatos científicos. Estamos mostrando o valor da floresta em pé, os benefícios que ela traz para a agricultura. O negócio é manter a floresta de pé, ou até reflorestar, porque vai ter mais benefícios na estação de chuvas e ter as duas safras com maior produtividade. Conciliar o desenvolvimento econômico com a preocupação florestal", afirma Teixeira Filho.

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