Meteorologistas ligam queimada e desmatamento a aumento de nuvens de poeira
Nos últimos dias, cidades do interior paulista, como Franca e Ribeirão Preto, se depararam com grandes nuvens de poeira. Ao menos, cinco pessoas morreram, outras ficaram feridas e até aulas foram suspensas. O fenômeno, que acontece durante longos períodos de estiagem, tem ocorrido em maior extensão, potência e frequência no Brasil, segundo meteorologistas.
Os especialistas dizem que a causa é a ação humana, com a intensificação de queimadas e os desmatamentos. "A culpa não é de São Pedro, a culpa é do homem mesmo", diz Michael Pantela, meteorologista do CGE (Centro de Gerenciamento de Emergências Climáticas).
As nuvens de poeiras são formadas a partir poeira ou fuligem depositadas sobre o solo. Elas podem vir do manejo equivocado do solo, de queimadas ou de ações urbanas, como construção civil e atividades industriais.
Quando há chuva, segundo Franco Nadal Villela, meteorologista do Instituto Nacional de Meteorologia (INMET), essa quantidade de poeira acaba sendo lixiviada [lavada] e levada para outros lugares, onde ela não é levantada pelo vento.
Essa nuvem de poeira é resultado de uma estiagem muito grande, já que o inverno [de 2021] foi ainda mais seco do que o normal. Na região de Franca, por exemplo, nessa estação, só choveu 10 mm durante os últimos três meses. Sem chuva, o acúmulo dessa poeira é muito maior."
Franco Nadal Vallela, meteorologista do INMET
O contraste climático é outro fator. Na primavera, a mudança de temperatura potencializa a força das tempestades, que produzem ventos mais fortes e extensos, gerando as nuvens de poeira.
"Quando se formam essas tempestades, elas sugam o ar quente e devolvem o ar mais resfriado, que foi encontrado em altitudes mais altas. Quando esse ar desce, ele vai rente ao solo, devido à sua densidade, encontrando um lugar onde ele levanta toda essa poeira acumulada", explica o meteorologista do INMET.
Pantela afirma que "todos os lugares que foram desmatados e que estejam passando por um período muito seco, quando houver vento, há grandes chances da formação das nuvens de poeira".
O que estamos observando tem uma correlação muito forte entre as áreas que tiveram a formação das nuvens com as áreas que tiveram um período maior de estiagem. Então poderia dizer que o oeste e o norte paulista são as regiões do estado mais propícias para que aconteça esse fenômeno."
Franco Nadal Vallela, meteorologista do INMET
Mais comuns no deserto, não é consenso entre os meteorologistas que o aumento da potência das nuvens de poeira indiquem um processo desertificação, apesar de indicarem "uma mudança do normal, uma quebra estrutural do nosso clima", diz o meteorologista do INMET.
Crise hídrica
Também podem ser sintoma de uma crise hídrica maior do que a de 2014 em São Paulo.
"Isso acende uma luz de alerta. Não é a única explicação, mas pode ser um indicativo de a gente entrar em um regime hídrico num patamar mais baixo do que a gente tinha a 30 ou 40 anos atrás", diz Franco Nadal Vallela, meteorologista do INMET.
Segundo dados da Sabesp, o Sistema Cantareira está com o nível de água em queda desde o dia 19 de março, quando atingiu o marco de 52,2%. Isso preocupa porque os meses entre outubro e março são os mais chuvosos na metrópole —enquanto de março até setembro o clima fica mais seco— segundo o Climatempo.
Em março de 2013, pré-crise hídrica no estado, o Cantareira estava com 59,8%. No inverno do mesmo ano, a redução no volume de água armazenada no sistema foi de 17%. Neste ano, o nível chegou a 25%.
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