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Edward O. Wilson, pioneiro da biologia evolutiva, morre aos 92

Edward O. Wilson, naturalista de Harvard frequentemente citado como herdeiro de Darwin, morreu aos 92. - Reprodução/Unicamp
Edward O. Wilson, naturalista de Harvard frequentemente citado como herdeiro de Darwin, morreu aos 92. Imagem: Reprodução/Unicamp

Colaboração para o UOL, em Brasília

27/12/2021 10h32

Ganhador de dois prêmios Pulitzer por trabalhos pioneiros sobre biodiversidade, insetos e natureza humana, o biólogo Edward O. Wilson morreu ontem em Burlington, nos Estados Unidos, aos 92 anos. A causa da morte, anunciada na manhã desta segunda-feira, não foi revelada.

"Ele era um implacável sintetizador de ideias. Seu corajoso enfoque científico e sua voz poética transformaram nossa maneira de compreender nós mesmos e nosso planeta", escreveu Paula Ehrlich, presidente da E.O. Wilson Biodiversity Foundation em comunicado. Leia a íntegra, em inglês.

Além do trabalho em evolução e entomologia (estudo dos insetos), em seus últimos anos de vida, Wilson liderou uma campanha para unir as comunidades científica e religiosa, no que ele dizia acreditar ser a melhor chance de preservar o planeta Terra. Foi Wilson quem popularizou, nos anos 80, o conceito de "biofilia", uma tendência inata, de raízes biológicas, para nos conectarmos à vida ou ao mundo natural.

O biólogo vislumbrava um futuro miscigenado para a humanidade. "Vai ser um processo irreversível, como misturar café com leite", comparava ele. As cores dos líquidos usados na metáfora, a propósito, não são acidentais.

"Vamos homogeneizar os países em termos raciais. Isso não significa que a diversidade genética vai desaparecer. Pelo contrário: teremos uma imensa variedade, mas as diferenças entre os países vão se tornar cada vez menores. A diversidade que vemos nas ruas de Nova York ou do Rio de Janeiro hoje será a regra em muitos outros lugares. É um cenário que me atrai muito —até porque não temos como lutar contra ele."

Decano dos naturalistas e entomólogos dos Estados Unidos e professor emérito da Universidade Harvard, Wilson era um dos maiores especialistas do mundo nas sociedades formadas pelas formigas.

O estudo dos insetos sociais o inspirou a usar a teoria da evolução como chave para entender o comportamento de outro bicho social por excelência —o homem— em clássicos como "Sociobiology" (sociobiologia), de 1975, e "On Human Nature" ("Da Natureza Humana"), de 1979, obras que o colocaram em apuros com a esquerda.

Ele e seus colegas eram acusados de apresentar fenômenos desagradáveis (a guerra e a xenofobia, por exemplo, também presentes entre as formigas) como meras consequências da luta pela propagação de genes característica da seleção natural. Para os oponentes do grupo de Wilson, classificar tais fenômenos como parte de um processo "natural" era equivalente a afirmar que não se devia lutar contra eles.

Cavalheirismo sulista

Nascido no estado do Alabama, Wilson era considerado um dos últimos exemplares sobreviventes do chamado "cavalheiro do Sul", representante da cultura de gentileza e cortesia tradicionalmente cultivada nessa região dos EUA. Mas não era esse ponto que ele ressaltava quando questionado sobre a influência do "velho Sul" em sua vida.

"Sabe, crescendo no Sul como eu cresci, minha educação foi muito fraca", dizia o professor. "Só fui aprender ciência realmente quando entrei na universidade. Ao mesmo tempo, porém, eu tinha uma vantagem enorme, que era a de estar em contato com um ambiente natural fantástico. E foi esse contato que me transformou num naturalista antes mesmo que eu aprendesse ciência, o contato despertou meu interesse em insetos e outros animais."

Esse caso juvenil de amor com a biodiversidade é o tema do livro "Letters to a Young Scientist" ("Cartas a um Jovem Cientista"). "Acho que o mesmo tipo de inspiração que tive está ao alcance de muitos jovens do Brasil, que também estão cercados por ambientes incríveis e, espero, também podem vir a se tornar cientistas", afirmava Wilson.

Tal despertar de vocações não adiantará muito se a perda de biodiversidade continuar no ritmo atual, um tema abordado de modo apaixonado em vários dos livros do pesquisador, como "O Futuro da Vida" (Campus) e "A Criação" (Companhia das Letras).