Eleito, Doria perde na capital e em 252 cidades de São Paulo
Wanderley Preite Sobrinho
Do UOL, em São Paulo
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Arte/UOL
Doria e França disputaram voto a voto no segundo turno da eleição para governador de São Paulo
Vitorioso com 10,9 milhões de votos (51,75%), o novo governador de São Paulo, João Doria (PSDB), não seria eleito se dependesse da capital paulista. O tucano ficou atrás na cidade em que foi prefeito, entre 2017 e 2018, e em outros 252 municípios. Márcio França (PSB), escolhido por 10,2 milhões de eleitores (48,25%), cresceu na reta final da campanha e ganhou na capital com 58,1% (3,3 milhões) contra 41,9% dos votos válidos de Doria (2,4 milhões). Apesar de ver sua eleição ameaçada na última semana da campanha, o candidato vencedor emplacou sua candidatura em 392 cidades, uma vantagem de 139 municípios em relação ao rival.
A vitória de Dória por uma diferença de 741.610 votos foi mais apertada do que as pesquisas de intenção de voto indicaram durante quase todo o segundo turno. O tucano só se viu ameaçado na última semana de campanha, quando o Instituto Datafolha apurou pequena vantagem numérica do socialista a um dia da eleição: ele apareceu com 51% das intenções de voto, contra 49% de Doria.
A tendência acabou não se confirmando, e o ex-prefeito de São Paulo venceu. Na capital, no entanto, seu desempenho decepcionou. Na cidade que administrou por pouco mais de um ano, o tucano recebeu 945.783 votos a menos que o atual governador. Em relação à campanha de 2016 para prefeito, Doria perdeu 637.878 votos, já que naquela eleição ele foi escolhido por 3.085.187 eleitores.
Viradas
Ao todo, o estado de São Paulo registrou 158 viradas de placar no segundo turno. A vantagem foi ampla em favor de França: o socialista venceu em 143 cidades que tinham dado vitória para Doria no dia 7 de outubro. Já o tucano levou a melhor em 15 cidades onde França havia vencido no primeiro turno.
Luiz Marinho (PT) ganhou em nove cidades na primeira fase da eleição -- e França herdou todas na segunda. Já as 24 prefeituras em que Paulo Skaf (MDB) levou, o placar ficou divido: França e Doria ganharam em 12 cidades cada.
Questionado sobre a melhora de seu desempenho na reta final, França atribuiu o resultado aos últimos debates da campanha. "Acho que a partir do último debate [quinta passada, na TV Globo] houve uma mudança, em função da minha visão e o desempenho inseguro do meu concorrente, na minha avaliação. O desempenho dele não foi compatível com o dos outros debates."
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Fundador do Instituto Ágora em Defesa do Eleitor e da Democracia, o cientista político Gilberto de Palma acredita que a derrapada de Doria na última semana se deve ao fracasso da estratégia "Bolsodoria" na capital, quando a campanha tucana tentou associar o ex-prefeito ao então candidato favorito à Presidência, Jair Bolsonaro (PSL).
"A expectativa do Dória era, sem constrangimento, mostrar identidade sem reservas a Bolsonaro, mas esse esforço para se associar aconteceu em um momento tal da campanha em que o candidato do PSL perdeu muitos votos na capital", diz o analista, que estudou o comportamento do eleitorado na eleição presidencial na cidade de São Paulo.
A razão, acredita, foi a "bem-sucedida" campanha do candidato a presidente derrotado Fernando Haddad (PT) na última semana de eleição. "O PT cometeu muitos erros de marketing durante a campanha, mas foi muito eficiente no final. Ele foi agressivo, fazendo apelos aos sentimentos humanos, com cenas fortes, associando Bolsonaro a torturas, por exemplo."
Ao mesmo tempo, Bolsonaro não declarou apoio explícito a Doria, que chegou a viajar para o Rio a fim de visitar o então presidenciável, mas não foi recebido. Em São Paulo, o coordenador da campanha do capitão da reserva, o senador eleito Major Olímpio (PSL), também declarou apoio a França.
"O major é um desafeto declarado do PSDB e declarou voto no adversário", lembra o especialista. A falta de apoio dos principais caciques do PSDB e a briga com o padrinho Geraldo Alckmin também ameaçaram sua eleição. "Nós sabemos que o Dória tem uma identidade muito maior com o MBL (Movimento Brasil Livre), por exemplo, do que propriamente com o tucanato tradicional, contra quem empreendeu disputas internas."
Candidato derrotado à Presidência e padrinho político de Doria, Alckmin chegou a bater boca com o correligionário após o resultado do primeiro turno. O motivo foi o pouco apoio recebido do ex-prefeito durante a campanha e sua aproximação cada vez mais explicita de Bolsonaro.
Nos últimos dias do segundo turno, Doria também precisou lidar com a revelação de que uma agência de publicidade disparou mensagens de WhatsApp com conteúdo de sua campanha e com ataques a Skaf no primeiro turno.
Apesar do susto, Doria venceu a campanha. Além de suceder o padrinho político, o empresário também se cacifa para a disputa presidencial, daqui a quatro anos.
Na avaliação do comando bolsonarista, Doria será um aliado de largada do novo governo federal, mas tenderá a se afastar após dois anos para estabelecer-se como alternativa ao Planalto. Não é à toa que o presidente eleito evitou chancelar a carona que Doria pegou na onda conservadora liderada por ele.
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