Em crise com Bolsonaro, Maia e 'ex-aliado' mantêm ponte militar no Planalto
Resumo da notícia
- "Bombeiros do Planalto", ministros Luiz Eduardo Ramos e Walter Braga Netto fazem a interlocução do Executivo com o chefe da Câmara
- Generais têm atuado com mais frequência juntos e até provocado ciúmes dentro do Planalto
- Após anunciar rompimento com Bolsonaro, o governador Caiado (DEM-GO) também se aproximou da dupla de militares
- Já Bolsonaro tem aberto sua agenda para o centrão em busca de formar base aliada expressiva
Os recentes rompantes públicos do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) contra alguns políticos e o STF (Supremo Tribunal Federal) acionaram ainda mais o trabalho dos chamados "bombeiros do Palácio do Planalto" — os ministros militares general Luiz Eduardo Ramos (Secretaria de Governo) e general Walter Braga Netto (Casa Civil).
Enquanto o presidente abre sua agenda para os deputados e senadores do centrão em busca de formar uma base aliada expressiva, ainda inexistente, a ligação do Executivo com o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), tem se concentrado em conversas com Ramos e Braga Netto. Ministros têm atuado cada vez mais juntos, em dupla, e provocado até mesmo "ciúmes" dentro do Planalto.
O relacionamento de Maia com Bolsonaro nunca foi bom. O presidente da Câmara considera que apoiadores de Bolsonaro estão por trás de ataques a ele nas redes sociais de forma ordenada e que falas de Bolsonaro ao longo de sucessivas crises põem em risco a estabilidade institucional.
Sem falar diretamente com Bolsonaro no dia a dia, Maia mantém com Ramos um bom relacionamento por meio de mensagens e ligações, embora não vá mais ao Palácio do Planalto, segundo um interlocutor. Na sede do governo, a atuação de Ramos é simplificada na máxima de que "essa é a função do ministro que tem que fazer a articulação", nas palavras de um assessor.
Maia e o ministro-chefe da Casa Civil, Braga Netto, teriam tido divergências quando o militar atuava como interventor na Segurança Pública no Rio de Janeiro, em 2018, mas a relação hoje é considerada boa por interlocutores.
Maia também não conversa mais diretamente com o ministro da Economia, Paulo Guedes. Eles pararam de se falar em meio à pandemia do coronavírus. Guedes acredita que o parlamentar queira tomar para si os holofotes e inflar gastos do governo além do que considera ideal. Maia então passou a recorrer a técnicos da pasta.
Outra fonte de interlocução do presidente da Câmara com o Planalto é o ministro do Desenvolvimento Regional, Rogério Marinho. Quando era secretário especial de Previdência, Marinho foi o homem forte do governo para a aprovação da reforma previdenciária e, como deputado federal, já tinha bom trânsito dentro do Parlamento.
Marinho é figura frequente no quarto andar do Palácio do Planalto, onde ficam os gabinetes de Ramos e Braga Netto e, segundo apurou a reportagem, tem sido fundamental numa tentativa de alinhamento do Executivo com o Parlamento.
Ex-aliado?
O governador de Goiás, Ronaldo Caiado (DEM), é outro que recorreu aos ministros no Planalto enquanto esteve distante de Bolsonaro por algumas semanas após criticá-lo por defender o fim do isolamento social durante a pandemia. Embora não estivesse falando com Bolsonaro, manteve o contato com os ministros palacianos.
Caiado estava em Brasília para reuniões com Maia e o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), na segunda-feira (4), quando foi convidado por Bolsonaro a ir ao Planalto. O governador então foi ao encontro do presidente junto a Alcolumbre, que evita criticar Bolsonaro em público. Segundo um assessor, Caiado citou exemplos de conciliação entre os Poderes em Goiás a Bolsonaro na reunião.
Dificuldades em montar base aliada
No primeiro ano de mandato, o presidente Bolsonaro não conseguiu construir uma base aliada no Congresso Nacional. A situação se mantém ao longo de 2020, com somente metade da bancada do PSL se declarando a favor do presidente após racha no partido.
Ramos substituiu Carlos Alberto dos Santos Cruz na Secretaria de Governo em julho de 2019 após divergências internas do último com a família Bolsonaro e reclamações de parlamentares de que não atendia a todos como gostariam.
O atual general à frente da pasta responsável pelo relacionamento do Planalto com o Parlamento é considerado mais disposto a receber os congressistas e a ouvir as demandas. Porém, no início de sua gestão, quando Onyx Lorenzoni ainda estava na Casa Civil, não tinha tanta liberdade para negociar com chefes de gabinete de parlamentares, afirmou um senador à reportagem. A situação mudou após a transferência de Onyx para a pasta da Cidadania, relatou.
Ainda assim, não é o suficiente para que Bolsonaro construa uma base, tanto que o presidente tem de recorrer ao centrão para tentar aprovar matérias de seu interesse e segurar 30 pedidos de impeachment em análise na Presidência da Câmara, além de sete pedidos de CPIs (Comissão Parlamentar de Inquérito) contra ele.
Em troca pelo apoio, o Planalto negocia cargos nos primeiros escalões do governo. Na mira do centrão estão diretorias de bancos públicos e de estatais, secretarias de ministérios, fundações e outras estruturas estratégicas.
Militares e Guedes temem que a crise de Bolsonaro com o STF (Supremo Tribunal Federal) faça aumentar a fatura a ser paga pelo governo ao centrão.
O bloco político informal é composto por PP, PL, Republicanos, Solidariedade, PSD, entre outros partidos, e somam cerca de 220 dos 513 deputados federais. Um eventual impeachment conseguiria ser barrado na Câmara por 172 votos contrários ao processo. Para serem criadas, as CPIs precisam ter o apoio de pelo menos um terço das Casas, 171 deputados ou 27 senadores.
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