Aos gritos, deputado ataca decreto de isolamento e ameaça agentes em Maceió
O deputado estadual em Alagoas Antônio Albuquerque (PTB) desceu hoje de seu apartamento na praia de Ponta Verde, em Maceió, para dar gritos contra o que chamou de "ditadura ridícula". As críticas são referentes ao novo decreto de isolamento social, assinado por governo do estado e Prefeitura de Maceió, que vedou o acesso à orla desde a quarta-feira (6) para conter o avanço do novo coronavírus.
Albuquerque fez ameaças a policiais e agentes de segurança municipais que estavam na porta de sua casa. "Isso é uma ditadura ridícula, uma coisa horrível! Eu estou cansado de ser perseguido nesse estado de covardes. O doutor Moura que venha", gritou o deputado, entre vaias, aplausos e palavras positivas e negativas de moradores do entorno.
O doutor Moura citado pelo deputado seria Antônio Moura, superintendente Municipal de Transporte e Trânsito. Agentes do órgão público faziam rondas na região quando foram surpreendidos pelos gritos.
"Na minha porta [carro de segurança] não fica. Tem de ser doido! Na minha não fica! Se ligar essa sirene de novo, eu desmancho ela e [incompreensível]", afirma o deputado, já na parte interna do seu prédio de alto padrão na capital alagoana.
Antônio Albuquerque já havia feito discursos contra o isolamento social decretado pelo governo do estado na Assembleia Legislativa.
No dia 27 de abril ele anunciou que estava com covid-19 por meio de uma postagem com a foto de seu exame publicada em redes sociais. Dias antes, ignorando o distanciamento proposto por especialistas, ele e outros parlamentares passaram a ir às sessões da Assembleia Legislativa no prédio-sede. Além dele, pelo menos outros três deputados também já contraíram o novo coronavírus.
Ainda aos gritos hoje, o deputado criticou o isolamento social, sugerindo que o uso de máscaras seria algo mais prejudicial do que andar sem elas. "Isso é uma pouca vergonha. Estão querendo dizer que um homem respirando a própria saliva está melhor do que respirando ar puro? Isso é ridículo. Isso é uma covardia, e a população aceitando calada, acovardada", diz em outro vídeo também gravado por um vizinho.
O que diz o deputado
Após a publicação da reportagem, o deputado procurou o UOL para dar sua versão dos fatos.
Albuquerque disse que resolveu descer do seu apartamento porque, às 6h30, agentes estavam ameaçando guinchar carros estacionados em frente ao local, como determina o decreto.
"Comecei a ouvir barulhos ensurdecedores de sirenes, e quando fui a varanda vi várias pessoas e um cidadão sendo abordado, e o agente alterado. Desci naturalmente, e os agentes vieram aos gritos, perguntando se tinha algum carro parado", disse.
Segundo Albuquerque, um exame feito no dia 6 atesta que ele não tem mais o novo coronavírus, e que, por isso, não há qualquer risco de ter passado a covid-19 a agentes. "Mantive uma distância de ao menos três metros de cada um."
O deputado afirmou ainda que não defende aglomerações, mas defende um isolamento mais brando que o atual.
"Não precisa ser esse horizontal. Esse isolamento é cômodo para quem tem uma casa confortável, como eu. Mas e nas periferias? Eu levantei a minha voz apenas para ser ouvido pelas pessoas. Não houve nenhuma vaia. Os meus vizinhos, que muitos nem conheci, aplaudiram e apoiaram. Tenho 25 anos de deputado, nunca recebi tantas mensagens de apoio. Sou contra os exageros que existem nesses decretos. Estão quebrando o país", declarou.
Em nota, a Prefeitura de Maceió informou que entregou uma representação ao MP (Ministério Público Estadual) "solicitando a apuração de eventual cometimento de crime e/ou descumprimento de normas sanitárias".
Disse ainda que os agentes de trânsito e guardas municipais que "estiveram frente a frente com o deputado, testado positivamente para a covid-19 no final do último mês de abril, já estão isolados e farão o teste para saber se foram infectados".
"Por fim, os gestores municipais lamentam que em uma cidade onde é crescente a curva de óbitos e doentes contaminados por esse vírus, um dito representante do povo se coloque contra medidas que visam salvar e proteger vidas", finaliza a nota.
Albuquerque tem histórico de problemas judiciais. Ele é réu em várias ações estaduais e federais que o acusam de ser um dos líderes de um esquema de corrupção na Assembleia Legislativa de Alagoas descoberto pela operação Taturana, da Polícia Federal, deflagrada em 2007. Em julho de 2019, ele foi condenado em primeiro instância pela 18ª Vara Cível da Capital por improbidade administrativa.
Decreto endureceu isolamento
Alagoas foi o estado brasileiro que, na quinzena final de abril, registrou a maior alta no número de casos de covid-19 do país: 1.159% de alta em apenas 15 dias. Segundo o boletim divulgado ontem, o estado já tem 1.867 casos e 98 mortes pela covid-19.
Por conta desse aumento, desde a quarta-feira está em vigor um decreto endurecendo as regras de isolamento social especialmente na capital. Entre as medidas estão o uso obrigatório de máscara e a proibição da circulação e permanência de pessoas em locais públicos como praças e parques. Além disso, foi determinado o fechamento de todo o calçadão da orla. As medidas valem pelo menos até o dia 20 de maio.
No estado, hospitais já estão deixando de receber pacientes por conta da lotação de leitos, como foi o caso da Santa Casa de Maceió. Outras unidades registram aumento exponencial em internações, e a previsão é de esgotamento de leitos de UTI (Unidade de Terapia Intensiva) na segunda quinzena de maio.
Alagoas já havia registrado outro acontecimento com ameaça, mas por conta do fechamento de lojas e restaurantes. No dia 18, em áudio enviado em um grupo de lojistas de um shopping, um empresário sugeriu uma união dos empresários para "dar um tiro" no governador Renan Filho (MDB) para pôr fim à quarentena. O empresário prestou depoimento e disse que gravou o áudio "de cabeça quente" e negou interesse em praticar o assassinato proposto.
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