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Ministros do STF: produção sobre 'antifas' começou no dia da saída de Moro

Alex Tajra, Felipe Amorim e Constança Rezende

Do UOL, em São Paulo e em Brasília

20/08/2020 21h21Atualizada em 20/08/2020 23h56

O monitoramento do Ministério da Justiça sobre supostos grupos antifascistas, incluindo policiais e professores, teve início em um pedido de informações requisitado no dia 24 de abril, data em que o ex-ministro Sergio Moro anunciou sua saída do governo de Jair Bolsonaro.

A informação foi revelada pelos ministros do STF (Supremo Tribunal Federal) Edson Fachin e Gilmar Mendes durante julgamento no que analisou se a produção deste tipo de documento é legítima.

Por 9 votos a 1, os ministros decidiram hoje barrar a produção de relatórios sobre servidores identificados com o antifascismo ou com qualquer outra preferência política. O UOL revelou em julho a existência de uma ação sigilosa do governo sobre um grupo de 579 servidores federais e estaduais de segurança identificados como integrantes do "movimento antifascismo" e três professores.

Nesta quarta, em declaração anterior à conclusão de seu voto, Fachin afirmou ser "importante anotar" que o monitoramento teve início no dia 24 de abril em um "pedido de buscas", sem dar detalhes do caso. A data coincide com a saída de Moro do governo, alegando tentativas de interferência do presidente Bolsonaro na Polícia Federal.

"Parece-me importante anotar que o relatório inicia com um pedido de busca no dia 24 de abril deste ano, me parece ser muito ao acaso esta data. Sabe-se, bastando folhear os periódicos do dia 24 de abril deste ano, e portanto não era ainda o ministro da Justiça o doutor André Mendonça", disse Fachin durante a sessão de hoje.

No dia 22 de abril, portanto dois dias antes do início da produção do dossiê, Bolsonaro participou de uma reunião ministerial, que veio a público na esteira da investigação do STF sobre a suposta interferência do presidente na PF, externando descontentamento com os órgãos de inteligência do governo. Ele afirmou ainda que tinha um "sistema particular" de inteligência, sem entrar em detalhes.

"Sistemas de informações: o meu funciona. O meu particular funciona. O que tem oficialmente desinforma. E voltando ao tema: prefiro não ter informação do que ser desinformado por sistema de informações que eu tenho", disse Bolsonaro na reunião.

Segundo afirmou o ministro Gilmar Mendes no julgamento, houve no dia 24 um pedido para obter informações sobre supostos grupos antifascistas de policiais no Rio de Janeiro. O estado é ponto sensível nas investigações que apuram a suposta ingerência de Bolsonaro na PF.

"Foi elaborado um documento intitulado 'pedido de busca' na data 24 de abril de 2020 no qual solicita-se informação do movimento antifascista e de agentes de segurança pública no Rio de Janeiro e em outros estados", disse Mendes.

Segundo o ministro, o pedido de informações tinha como alvo dados sobre nível de adesão ao movimento, suas principais lideranças, vinculações políticas e pautas reivindicatórias.

Os ministros não informaram de qual órgão partiu os pedidos de informação sobre os antifascistas. Os documentos foram enviados ao STF pelo Ministério da Justiça

Em outros momentos da sessão, os ministros afirmaram que os pedidos de monitoramento são anteriores à gestão de André Mendonça, que assumiu o cargo no dia 29 de abril. Em seu voto, a ministra Cármen Lúcia, relatora da ação movida pela Rede Sustentabilidade, ressaltou que Mendonça afirmou no processo ter tido conhecimento do dossiê por meio da imprensa.

Em nota, o ex-ministro Sergio Moro afirmou que "desconhece qualquer relatório de inteligência sobre movimentos antifascistas produzido durante a sua gestão".

"O relatório divulgado na imprensa seria de junho de 2020 e teria sido requisitado após a sua saída do Ministério. Causa estranheza a suposta requisição de um relatório, justamente no dia 24 de abril, dia em que Sergio Moro deixou o governo. O trabalho do ex-ministro sempre foi pautado pela legalidade, ética e respeito à Constituição Federal", diz.

Em nota após o julgamento, o ministro André Mendonça afirmou que a decisão do STF reconhece a importância da atividade de inteligência e que os ministros reconheceram que ele atuou com "isenção" no episódio.

"Agradeço as manifestações proferidas por vários ministros da Suprema Corte, reconhecendo a minha integridade, transparência e isenção em relação ao episódio", disse Mendonça.